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Marcas podem esbarrar em limites em briga contra 'fake news' e discurso de ódio na internet

O boicote de cerca de 700 marcas ao Facebook ao longo do mês de julho nos EUA - movimento que foi estendido por gigantes multinacionais também a outros países, entre eles o Brasil - pode ser apenas a ponta do iceberg no que se refere à pressão dos anunciantes em relação à responsabilidade das empresas de tecnologia no que se refere aos conteúdos veiculados em suas plataformas. Essa é uma notícia que pode afetar não só o Facebook, mas também gigantes como o Google, de acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão.

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Por Fernando Scheller
Atualização:

Reportagem do 'NYT': boicote contra discurso de ódio no Facebook ( Foto: Reprodução)

Ainda assim, evitar totalmente que uma marca se veja associada a conteúdos inadequados deve ser um trabalho de longo prazo. Apesar disso, a disposição de harmonizar essa relação nunca foi tão clara. "Eu acho que estamos em um momento de inflexão no que se refere aos conteúdos aos quais as marcas querem se associar", diz Márcio Jorge, sócio e diretor de inteligência da Zahg, empresa especializada em publicidade digital. "Acabou aquela posição de ir empurrando com a barriga."

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Para Jorge, é importante lembrar que este não é o primeiro conflito das marcas com o Facebook - é apenas o maior deles. Na edição de 2015 do Cannes Lions - Festival Internacional de Criatividade, o então chefe global de marketing da Unilever, Keith Weed, subiu ao palco para denunciar que quase 30% dos cliques contabilizados pelo Facebook em propagandas na rede social eram, na verdade, ações de robôs, ou bots, como se diz no jargão de tecnologia. O Facebook admitiu, na época, os erros, mas não houve um movimento significativo contra a plataforma por causa disso.

Se antes a briga dos anunciantes se referia principalmente à questão financeira - pagamento por cliques falsos -, o debate atual, referente à associação de propagandas com conteúdos indesejáveis, começou a ganhar a tração a partir de 2016, quando notícias falsas tiveram um peso considerável no resultado das eleições americanas. No início de 2017, o YouTube, do Google, foi alvo de críticas por associar anúncios a vídeos impróprios, incluindo de grupos terroristas. Após algum conflito e mudanças na plataforma de vídeos, a situação acabou pacificada.

As ofensivas e recuos mostram que, apesar dos conflitos, as plataformas online são muito relevantes para o anunciante. Mesmo assim, o sócio da Zahg acredita que agências e anunciantes vão monitorar mais de perto onde seus anúncios são veiculados. Até porque existem hoje grupos dedicados a "puxar a orelha" de marcas que se relacionam a conteúdos falsos ou duvidosos - o mais famoso é o Sleeping Giants, que recentemente chegou ao Brasil.

Isso fez as marcas ampliarem a vigilância sobre a publicidade digital. A varejista Magazine Luiza, por exemplo, diz estar atenta ao destino de seus anúncios na web. É um trabalho que inclui não apenas a empresa em si, mas também parceiros que trabalham em conjunto com a marca. É comum, no setor de eletrodomésticos, que fabricantes e varejo façam promoções conjuntas.

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Ao Estado, a empresa disse que criou uma lista de sites proibidos por promoverem temas que julga estarem em desacordo com seus princípios. Além disso, a companhia fez parcerias com ferramentas que ajudam a monitorar onde a marca Magalu aparece. Por fim, também criou restrições jurídicas para evitar que parceiros veiculem marcas que vão contra diretrizes da empresa. Diversas grandes marcas, como Natura e Volkswagen, trabalham com restrições semelhantes.

Dilema

Na visão de Marco Túlio Kehdi, da agência de marketing digital Raccoon, quase 100% dos negócios hoje estão preocupados em banir sites pouco confiáveis. No entanto, a disposição esbarras em duas dificuldades principais. A primeira é que os sites de fake news se proliferarem às centenas na internet - justamente para fugir de escrutínio. E a segunda é o fato de o marketing da internet ser baseado tanto em anúncios comprados diretamente quanto no chamado "retargeting".

O especialista diz acreditar que cerca de 90% da veiculação de publicidade em sites duvidosos está ligado ao retargeting. Ou seja: um anunciante compra um banner em um determinado site, para atingir usuários de perfil específico. A partir do momento em que aquele potencial cliente é reconhecido, o anúncio passa a segui-lo aonde quer que ele vá em sua navegação. E, segundo Kehdi, o consumidor pode eventualmente ir parar em um site de fake news ou ligado a pensamentos extremistas.

Em algum momento, portanto, as marcas podem se ver diante de um dilema extremo: será que vale a pena abrir mão de uma venda por não concordar com as crenças de um (potencial) cliente?

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'Agulha no palheiro'

Na semana passada, o Facebook se pronunciou em um artigo de Nick Clegg, vice-presidente de assuntos globais e comunicações, na revista AdAge. O executivo afirmou que eliminar completamente discursos de ódio na plataforma é como "encontrar uma agulha em um palheiro". Ele defendeu práticas do Facebook, como a contratação de 35 mil profissionais dedicados à segurança dos serviços. Disse também que a empresa investe bilhões na área, incluindo o desenvolvimento de ferramentas de inteligência artificial.

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