As teorias e o bolo

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

O economista Cláudio Salm, do Instituto de Economia da UFRJ, publicou um artigo, nesta segunda-feira, no jornal "O Globo", com uma porção de dados interessantes. Ele usou esses dados para concluir que a distribuição de renda em curso no governo Lula se deveu mais ao crescimento da economia do que aos programas de transferência de renda e inclusão social - numa variante da velha "teoria do bolo", segundo a qual é preciso fazer o bolo crescer para depois distribuí-lo.

PUBLICIDADE

Achei a conclusão do artigo interessante, mas menos interessante do que alguns dados utilizados para sustentar os argumentos. Salm observou, com razão, que a distribuição de renda verificada entre 2003 e 2009 foi menor do que poderia ter sido. Isso se deveu, escreve ele, de um lado à regressividade do sistema tributário e ao consequente peso socialmente invertido da carga tributária. E, de outro, à concentração das transferências de renda em benefícios previdenciários, cujos déficits são cobertos por tributos cobrados de todos, inclusive dos mais pobres.

Para Salm, comparados com as despesas previdenciários, os gastos com programas assistenciais não contributivos - a idosos pobres ou pequenos agricultores - e o Bolsa Família, decididamente redistributivos, são mais do que modestos. Também aqui o economista tem razão, mas o raciocínio de que se vale para minimizar o efetivo impacto redistributivo desses programas tem origem numa contorção mental.

O economista não nega o valor do programa no alívio das condições dos que vivem na extrema pobreza, mas credita a melhoria ocorrida na distribuição de renda às oportunidades de trabalho e aos mais e melhores empregos proporcionados pelo crescimento da economia. Como se o acréscimo de renda produzido pelo Bolsa Família não contribuísse para o maior vigor do mercado e, na sua esteira, para a ampliação e as melhorias no mercado de trabalho mencionadas.

* * *

Publicidade

Há informações curiosas entre os dados organizados por Cláudio Salm. E que chamam a atenção pela discrepância. Eles têm a ver com a absurda concentração de renda que, mesmo com as melhorias observadas, continua um caso de grave patologia, longe de uma situação aceitável. Daí o espanto que sempre nos toma ao observarmos um pouco mais no detalhe a pirâmide brasileira da renda.

Quando falamos nos 10% mais ricos, na população brasileira, a sensação que passa é a de que estamos nos referindo a uns nababos que nadam em ouro. Pois a renda média desses "privilegiados", a preços de hoje, como anota o economista, mal passa de R$ 2.500 mensais. Mais surpreendente ainda é a renda média dos potentados que ocupam a faixa do 1% mais abonado entre os brasileiros: não chega a R$ 7 mil por mês.

Como estamos no mundo das médias, numa curva de dados de renda, com acentuado desvio padrão, dá para inferir que o cidadão que menos ganha entre os brasileiros mais ricos é... pobre.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.