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Por José Paulo Kupfer
Atualização:

Não há como escapar da constatação de que a imensa e espantosa crise que envolve a Petrobras terá repercussões de enorme amplitude no conjunto da economia brasileira. A estatal, que está no centro de uma densa cadeia de produção responsável por algo como 10% do PIB, contribui, sozinha, com mais 10% de todo o investimento em capital fixo realizado no País. É fácil imaginar o impacto fortemente negativo da possível redução das inversões previstas para os próximos anos.

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Os investimentos anuais da Petrobras em capital fixo, da ordem de R$ 80 bilhões, correspondem a pouco mais de 1,5% do PIB. Numa conta simples, para cada corte de 10% nos investimentos da empresa, a produção econômica total sofreria uma redução de 0,15 ponto porcentual. Quando, porém, se levam em conta os efeitos multiplicadores dos investimentos da empresa no conjunto da economia, a contração tende a ser maior.

Cálculos da LCA Consultores indicam que cada real investido pela Petrobras resulta em um acréscimo de pouco mais de R$ 3 no PIB. Assim, um corte de 10% nos investimentos da estatal resultaria numa redução de perto de 0,5 ponto porcentual no produto econômico total. Considerando as projeções de momento, que apontam variação do PIB em torno de 1%, tudo o mais permanecendo constante, a crise da Petrobras comeria metade do pouco que se espera de crescimento econômico em 2015.

Esses exercícios até podem ser úteis para dar um pouco a dimensão dos potenciais prejuízos causados pela enredamento da maior empresa brasileira numa monumental malha de corrupção. Mas são insuficientes para delimitar o tamanho dos problemas que podem causar à economia no futuro próximo. Reportagem do GLOBO publicada nesta quarta-feira, relatando operações atípicas com a Petrobras, detectadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), nos últimos quatro anos, dá uma ideia da tenebrosa malha de relações suspeitas envolvendo a empresa e seus fornecedores. Mais de quatro mil pessoas, relacionadas com 4.300 empresas, movimentaram, de 2011 a 2014, quantia superior a R$ 23 bilhões.

As perdas diretas da Petrobras estão sendo estimadas entre R$ 5 bilhões e R$ 21 bilhões. Se forem todas registradas na contabilidade deste ano, os detentores de ações ordinárias não receberão dividendos. Os pagamentos referentes ao terceiro trimestre, em razão do adiamento da publicação do balanço, estão suspensos. Uma situação desastrosa, que já alterou a recomendação de compra dos papeis da empresa para "neutra" e indica custos mais elevados para captar recursos no mercado.

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Não é possível dimensionar com precisão o total das perdas e as dificuldades com a disseminação de inevitáveis suspeitas de contaminação não só de outras estatais, com destaque para as empresas do grupo Eletrobras, como também das prestadoras privadas de serviços ao conjunto dos entes públicos, atingindo principalmente as grandes empreiteiras brasileiras. Mas já é dado como certo, no próprio governo, que os desdobramentos da Operação Lava-Jato devem complicar o programa de concessões de infraestrutura. Aumentaram também as dificuldades para reequilibrar as contas públicas e os riscos de perda do grau de investimento para os títulos brasileiros.

A grande crise, porém, poderia se tornar também uma grande oportunidade para fortalecer as instituições. Ficou mais do que evidente que o altíssimo custo dessas tenebrosas transações no setor público reduz a nada o preço de deflagrar e levar às últimas consequências uma ampla e generalizada "operação mãos limpas".

(Publicado no O GLOBO, em 21/11/2014)

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