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Pesquisa aplicada no dia a dia (FGV-EESP)

Opinião|Contagem Regressiva

Uma relação republicana com o Congresso é bem vinda mas se não aprovar nada é um tratado de boas intenções

Atualização:

*Marcelo Kfoury Muinhos

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Agora que estamos na contagem regressiva para o fim do ano e principalmente para a posse do novo presidente, é o momento ideal para traçarmos  cenários para o próximo ano.

Os economistas em 2018 erraram principalmente nas projeções de PIB, esperando uma recuperação mais forte da economia que de fato não ocorreu. Em dezembro de 2017, o Focus projetava um crescimento de 2,64% e vamos crescer ligeiramente menos do que 1,5% pela segunda vez seguida. Na dissertação de mestrado profissional defendida no Insper, no ano passado, por Carlos Castanheda Waack, orientado por mim, uma das conclusões foi que a expectativa de crescimento do PIB em anos normais é normalmente a expectativa consensual de crescimento do PIB potencial. Provavelmente o mercado acredita que o potencial de crescimento do Brasil seja de 2,5%, pois é exatamente esse mesmo número que é esperado para 2019. Uma indagação justa então é se o consenso não está excessivamente otimista sobre o PIB potencial. Essa variável latente, que não pode ser calculada diretamente,  provavelmente apresenta um crescimento mais para 1,5% do que 2,5%.

É factível ocorrer um crescimento similar ao previsto novamente pelo Focus para o PIB de 2019, de 2,5%, baseado na melhora da confiança propiciada pela eleição, que induza em novos investimentos e um novo ciclo de crédito. Porém, para acelerar o potencial para esse nível, tornando-o sustentável, há necessidade de reformas estruturais que aumentem a produtividade da economia, via desregulamentação, privatização e maior abertura da economia, além de se resolver o gargalo fiscal.

A grande fragilidade do Brasil no momento está nas contas públicas. Parte do problema vem sendo atenuado pelo aumento da arrecadação  devido a recuperação cíclica da economia, sendo que a coleta de impostos do governo federal se elevou em cerca de 1,5 ponto percentual do PIB recentemente (saindo de um mínimo de 16,7% do PIB em outubro  de 2017 e evoluindo para 18,2% em outubro desse ano). Porém, o maior obstáculo está no déficit da previdência, que terminará o ano com um buraco 3% do PIB só junto ao setor privado. Essa conta sozinha terá um déficit duas vezes maior do que o total do governo federal, portanto, apesar do resto do governo  apresentar superávit, as contas públicas  continuam no vermelho. Se não houver aprovação de uma reforma mais compreensiva, os gastos dos outros setores irão colapsar no médio prazo, transformando o setor público exclusivamente em um agente de transferência de renda para os aposentados do país.

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Em relação a política monetária, as chances dos juros permanecerem no patamar mínimo, de 6,5%, por muito mais tempo aumentaram significativamente. Tantos os economistas como o mercado estão tirando as altas de juros das projeções para o próximo ano, não só porque os choques de preços administrados e do cambio estão se dissipando com as expectativas firmemente ancoradas nas metas de inflação, como ainda há bastante folga no lado do produto, com o desemprego e a utilização da capacidade na indústria bem abaixo das médias históricas.

Um risco que não está sob controle do próximo governo é a situação internacional. O crescimento sincronizado observado na economia mundial apresenta claros sinais de desaceleração, e há questões idiossincráticas em alguns países europeus (Reino Unido, França e Itália) e uma tensão crescente nas relações comerciais entre a China e os Estados Unidos. O câmbio dólar-real, que se depreciou do patamar de 3,70 para a casa dos 3,90, guarda muito mais relação com os desdobramentos externos do que domésticos.

A parte do risco que está sob controle da nova administração é a montagem ministerial e a relação com o novo congresso. A sensação de improviso e amadorismo do núcleo duro do futuro governo Bolsonaro perdura e projeta fortes emoções à frente. Uma nova forma de relação com o Congresso, que envolva uma convivência mais "republicana" com o parlamento, será um avanço institucional importante, porém ainda está para ser testada e se não for suficiente para  aprovar os projetos que destravem o crescimento da economia, não passará de um tratado de boas normas e intenções.

*Professor e Coordenador do Centro Macro-Brasil da FGV-EESP

Opinião por mosaicodeeconomia
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