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Opinião|Harvard leva trabalhadores para a classe média com alta remuneração

Na universidade, terceirizados ganham o mesmo e têm os mesmos benefícios de funcionários diretos da universidade; alguém mais seguirá seu exemplo?

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Atualização:

Martha Bonilha ascendeu à classe média trabalhando como cozinheira na Harvard Business School. Foto de Kayana Szymczak/The New York Times  

Eduardo Porter / The New York Times

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Martha Bonilla não é a típica trabalhadora de classe média. E não é só porque ela nasceu em um lugar afastado de El Salvador e atravessou o México escondida entre uma pilha de bananas na traseira de um caminhão para chegar ilegalmente aos Estados Unidos aos 20 anos.

Como milhões de americanos sem diploma universitário, a mãe de três filhos, com 44 anos, trabalha nos degraus inferiores do setor de serviços, em uma cozinha administrada pela empresa de serviços alimentícios Restaurant Associates, em Cambridge, Massachusetts. Preparação de alimentos e serviço integram o grupo ocupacional mais mal pago da economia; mesmo em Boston, normalmente rende menos de US$ 27 mil por um emprego em tempo integral e durante todo o ano.

No entanto, Bonilla está sentada à mesa de sua cozinha, no sólido bairro de classe média de West Roxbury, Massachusetts. Ela e o marido, Felipe Villatoro, ambos residentes legais, compraram a casa há 12 anos por US$ 350 mil. É a segunda; ela aluga a primeira para os membros de sua extensa família. As férias na Flórida, o plano de aposentadoria, os US$ 1.700 por mês que pagam pelas mensalidades e taxas da faculdade da filha - tudo isso fala do sonho da América.

"Vir para os Estados Unidos foi a melhor decisão que já tomei", disse Bonilla.

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Qual é o segredo? O trabalho de Bonilla na Restaurant Associates é fazer o café da manhã e o almoço para executivos que buscam cursos de extensão na Harvard Business School. Na universidade, os trabalhadores de serviços na folha de pagamento de um contratado externo ganham o mesmo pagamento e benefícios que receberiam como funcionários diretos da universidade - incluindo seguro de saúde e benefícios de pensão, férias pagas e assistência de creche.

Política remove incentivos econômicos para a terceirização

Essa política de paridade foi formalmente adotada em toda a universidade há 16 anos por Lawrence H. Summers, então presidente da Harvard. De um só golpe, acabou com a prática de terceirizar restaurante, segurança e outros serviços, simplesmente para economizar nos custos trabalhistas. "O efeito dessa política é remover alguns dos incentivos econômicos para terceirizar tais posições", disse Michael Kramer, diretor de organização da unidade local de Cambridge da Unite Here, o sindicato que atende trabalhadores de serviços de alimentação.

Para Bonilla, o resultado é um salário por hora de mais de US$ 25. Adicionando o dinheiro de um trabalho de meio período cozinhando em um dormitório estudantil, na maioria das semanas ela ganha mais de US$ 1.500. Isso supera o pagamento semanal típico de um trabalhador com um mestrado. Somando o salário de Villatoro, também cozinheiro da faculdade de administração, a família ganha quase US$ 120 mil por ano.

Como os salários dos trabalhadores americanos sem educação universitária definham abaixo de onde estavam há 40 anos, o experimento de Harvard levou alguns economistas e sindicalistas a pensar em arranjos similares para beneficiar de forma mais ampla os trabalhadores com baixos salários, que formam a parte do mercado de trabalho que é maior e tem mais rápido crescimento.

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Na verdade, as políticas de emprego de Harvard afetam uma população limitada. Somente 275 trabalhadores de refeitórios, 404 guardas de segurança e 370 trabalhadores de manutenção são empregados por subcontratantes, e outros 1.105 trabalham para a universidade. É uma questão em aberto saber se organizações maiores, ou aquelas sem dotações multibilionárias, podem seguir o exemplo.

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"Esta é uma importante inovação no setor privado - um modelo muito bom para uma organização voltada para o social", disse Summers, cujo mandato ficou entre seu serviço como secretário do Tesouro no governo Clinton e seu tempo dirigindo o Conselho Econômico Nacional sob o presidente Barack Obama Mas ele reconheceu que o experimento traz um conflito de escolha.

Medidas desse tipo podem elevar preços

Mesmo se o objetivo for louvável - elevar os trabalhadores da base do mercado de trabalho para a classe média, estimulando a economia e pressionando contra a crescente desigualdade salarial do país - Summers observou que políticas como essas "tornam mais caro fazer as coisas que você faz". Estabelecer um piso de pagamento muito elevado pode forçar as empresas a contratar menos pessoas, piorando muitas delas.

Atualmente, cerca de 45 milhões de americanos trabalham em empregos de serviços de baixo custo - como cuidadores pessoais, cozinheiros, zeladores, representantes de vendas - que normalmente ganham menos de US$ 30 mil por ano. Até 2026, o governo projeta, o número será de 50 milhões. A terceirização é uma das principais dinâmicas que mantêm baixos seus salários e o experimento de Harvard é um estudo de caso útil de como as instituições podem usar sua influência para forçar um recurso.

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Pesquisas recentes feitas por economistas de quatro importantes universidades e pela Administração do Seguro Social concluíram que a divisão em partes do trabalho menos qualificado para empreiteiros de baixos salários - a Goldman Sachs terceirizando seus serviços de zeladoria, por exemplo, ou a Apple terceirizando a montagem de seus iPhones para a Foxconn - poderia representar cerca de um terço do aumento da desigualdade salarial nos Estados Unidos desde 1980.

Há um corpo substancial de pesquisas sugerindo que aumentos modestos no salário mínimo terão apenas um pequeno efeito sobre o emprego. Mas quase não há pesquisas sobre o que aconteceria se o salário de um cozinheiro fosse fixado em US$ 24, cerca do dobro da taxa do mercado. A maioria dos economistas provavelmente concordaria que o número de cozinheiros cairia.

Pesquisa de David Neumark, economista trabalhista da Universidade da Califórnia, em Irvine, aponta que, nas partes da economia mais suscetíveis à automação, a imposição de um "salário suficiente para viver" pode apenas acelerar o ritmo no qual os robôs assumem todo o trabalho. Ainda assim, outros economistas sugerem que a inovação de Harvard merece uma chance. /Tradução de Claudia Bozzo

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