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Legal, cobrança de ‘luva’ é controversa

Valor pedido por proprietários para a autorização de uso de pontos comerciais pode variar consideravelmente em uma mesma região

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Brás. Antiga loja da Rua do Gasômetro tem aluguel de R$ 50 mil, mas preço exigido pelo uso do local atinge os R$ 400 mil Foto: Estadão

FELIPE NEVES

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Quem quiser alugar uma loja de 130 metros quadrados localizado na Rua do Gasômetro, no Brás, terá que arcar com custos bem mais altos do que os R$ 50 mil mensais necessários para a locação do bem. Para ter o direito de utilizar o ponto, o proprietário do local exige do inquilino nada menos do que oito vezes o valor do aluguel. São R$400 mil pelas chamadas "luvas", a polêmica cobrança realizada em áreas de grande atividade comercial, onde a disputa por locações costuma ser acirrada.

Em outro ponto da capital, na Rua do Seminário, no Centro, alugar um salão de 500 m² só será possível depois do pagamento dos mesmos R$400 mil, a despeito dos R$25 mil cobrados mensalmente pela locação. Apesar de elevados, os valores das "luvas" não estão descritos nos anúncios. Para conhecê-los, o interessado deve consultar a imobiliária responsável pela divulgação dos imóveis.

Cercada de discrição e com altas quantias, a cobrança está envolvida em discussões jurídicas há anos. A legislação vigente até 1991, conhecida como Lei de Luvas, proibia a prática, por exemplo. Revogada, a norma deu lugar à chamada Lei do Inquilinato, que abrandou a penalização sobre o proprietário.

A partir de então, somente a renovação de contratos com mais de cinco anos de duração não poderiam incluir taxas adicionais. Para acordos iniciais, a exigência estaria livre: o dono da loja poderia, em tese, exigir qualquer valor a mais antes de fechar o primeiro contrato.

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Há, no entanto, quem discorde da interpretação. "Não compactuo com a cobrança de 'luvas'. A disputa pelo ponto deveria ser estritamente comercial. O jurista puro teria de coibir essa situação, justamente porque não há qualquer previsão legal sobre ela. Eu reprimiria", argumenta o especialista em direito empresarial Ricardo Trotta, do Ricardo Trotta Advocacia.

Mesmo guiados pela demanda nos locais com maior fluxo de pessoas, os critérios para estipular as luvas são arbitrários. Donos de pontos próximos podem adotar métodos distintos ao exigir a taxa. A pouco mais de dois quilômetros do salão da Rua do Gasômetro, outro salão comercial com área quase oito vezes maior não possui cobrança adicional. Imóveis localizados em travessas da Oscar Freire, tradicional rua de comércio de grife na cidade, também podem abrir mão do valor, enquanto contratos na mesma região podem chegar aos milhões.

"Quem manda é o mercado. Em ruas onde nunca se cobrou 'luvas', hoje pode haver pontos valiosos. Em outras, ocorre exatamente o inverso - e valores muito altos não são extraordinários, mesmo em bairros menos luxuosos. Há 'luvas' em lugares chiques, mas também é possível em ruas degradadas, mas com muito consumo, como as do Brás, do Bom Retiro, da Lapa, e da 25 de Março. O que vale mesmo é o trânsito do consumidor por ali", analisa o diretor de legislação do inquilinato do Secovi-SP, Jacques Bushatsky.

Quando o imóvel tem acesso direto à via pública, o asseguramento de que o locatário pagou as "luvas" ao proprietário costuma ser feito por meio de um contrato de venda de ponto comercial. Em centros de compra, é feito o chamado CDU (Contrato de Direito de Uso). Os mecanismos servem de apêndice ao contrato de aluguel.

"Os shoppings fazem isso em 99% dos casos. E você corre o risco de rescisão caso não pague as 'luvas'", diz o professor de direito empresarial do Mackenzie, Mário Cerveira Filho.

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Além do fluxo de clientes e do comércio, a cobrança de "luvas" em shoppings costuma ter como parâmetro a importância das lojas que se interessam pelo ponto. Em regra, quanto menor a rede, maior é a quantia adicional cobrada pela administração. "Se o shopping não tem interesse em você, a cobrança é alta. Grandes redes entram com custos muito menores, pois trazem público para as satélites", diz o diretor de relações institucionais da Associação dos Lojistas de Shoppings (Alshop), Luis Augusto Ildefonso.

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As condições do mercado podem influenciar o valor das "luvas". Na maior parte dos casos, as áreas à disposição para aluguel nos shoppings são as destinadas às lojas satélites e ao cinema. Então, a grande vacância nos empreendimentos e o baixo fluxo de consumidores podem dar mais condições de negociação para as pequenas empresas. Mas, como explica Ildefonso, a disputa no mercado está longe de ser amena. "É claro que tudo depende do fluxo do shopping. Mas a isenção de ponto quase não existe. É coisa rara no Brasil."

Segundo o Ibope Inteligência, a taxa de ocupação dos centros de compra recém-inaugurados variou de 50% em dezembro de 2013 para 57% em junho de 2014. E 39% deles ainda operam com quase metade da Área Bruta Locável (ABL) vazia.

“O que o lojista tem de fazer é exigir um contrato de cinco anos ininterruptos ou que, somados os prazos, resultem nesse período. Se o tempo é inferior, o locador pode despejar o inquilino ou cobrar ‘luvas’ novamente. Não há como recorrer. Tem gente ainda hoje que paga ‘luvas’ de cinco em cinco anos e não sabe que possui o direito de negar isso”, diz Cerveira Filho. - PRESTE A ATENÇÃO Contrato Inicial De acordo com a Lei 8245/91, conhecida como “Lei Do Inquilinato”, a cobrança de luvas é legal, mas somente ao firmar o primeiro contrato de locação Prazo O período mínimo para que o contrato de locação seja renovado sem cobranças adicionais é de cinco anos. Caso contrário, o dono pode voltar a cobrar luvas Renovação A Ação Renovatória é o mecanismo usado no prolongamento do aluguel e deve ser proposta entre um ano e seis meses antes de vencer o prazo de vigência do contrato. Fora desse período, o proprietário pode negar o pedido Em dia A Ação Renovatória também exige que todas as obrigações contratuais estejam exatamente cumpridas no momento do pedido. Aluguel, condomínio, fundo de promoção, seguro e tributos precisam estar pagos Atividade Comercial Para ser válida, a ação também exige que a finalidade do negócio instalado no imóvel seja exercida no mesmo ramo pelo prazo mínimo de três anos Documentação As “luvas” pagas pelo locatário geralmente são oficializadas por um contrato de venda ou pelo Contrato de Direito de Uso (CDU), que é anexado ao contrato de aluguel. Este último geralmente é utilizado nas locações de lojas localizadas dentro de shoppings e outros centros comerciais.

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