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O blog do Caderno de Oportunidades

Mediação e conciliação na solução de controvérsias

Com 100 milhões de processos pendentes a Justiça estimula práticas que são mais ágeis

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Por Cris Olivette
Atualização:

Claudine Bichara, presidente da Câmara do Comércio França Brasil Foto: Estadão

Especialistas em mediação dizem que cada vez mais empreendedores recorrem à Lei de Mediação como instrumento para solucionar conflitos comerciais. A presidente da Câmara de Comércio França Brasil (CCFB), Claudine Bichara afirma que as maiores beneficiárias da mediação, pelo baixo custo do processo e pelo curto tempo que leva para se chegar a um acordo, são as pequenas e médias empresas. "Muitas vezes, a empresa está passando por algum tipo de conflito e o dono tem medo de encarar as altas custas de um processo judicial, ou mesmo de ter de aguardar muitos anos pela resolução. A mediação elimina esses dois entraves."

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Claudine conta que esta prática envolve técnicas para construir a solução do litígio pelas partes. "A solução é montada pelas partes e por isso é mais duradoura. Muitas vezes, a pequena empresa está em conflito com uma maior e teme o peso da grande em um processo judicial de longa duração, que envolve gastos com advogado. Neste aspecto, a mediação é mais equitativa em relação a pequena empresa", diz.

Segundo ela, pelo fato de a solução ser boa para as duas partes, os envolvidos deixam o conflito para trás e olham o futuro. "Não há porque acabar com a relação comercial. É possível realizar novos negócios."

Claudine conta que o Centro de Mediação da CCFB foi criado seguindo o modelo do Centro de Mediação e Arbitragem de Paris, mas a entidade pretende fazer parcerias com centros de outros países. "Queremos inovar ao máximo e trazer práticas de outros centros para oferecermos cursos complementares. Existem várias técnicas para serem ensinadas. Nosso objetivo é criar um ambiente propício para o exercício da mediação com qualidade, suprindo as necessidades do mercado."

Ela conta que na França, a média de sucesso na resolução de conflitos é de 70%, sendo que a solução ocorre em três ou quatro sessões.

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A diretora técnica da Omniasafe Consultoria, Luciana Santana conta que sua empresa faz consultoria de seguros e análise de riscos. "Fazemos a gestão de seguros, mas ocorrem situações nas quais atuamos como mediadores, porque vamos conhecendo mais profundamente o problema e vemos que as pessoas envolvidas só não querem ter prejuízo, desejam apenas reparar o dano. Então, é possível conduzir o caso para um acerto entre as partes."

Ela conta que já mediou situações bem graves que se fossem para a esfera judicial resultariam em indenizações muito altas. "Conseguimos chegar a um consenso que ficou bastante confortável para as partes."

Luciana fez cursos específicos para saber analisar as situações, empregar argumentos certos e avaliar as partes sem ser tendenciosa. "O mediador tem de agir pela solução e demonstrar neutralidade no processo. É preciso incentivar as partes a deixar a emoção de lado no momento da negociação. Neutralizando a emoção as coisas fluem melhor", afirma.

Arbitragem. Advogado e presidente do Centro de Mediação da CCFB, Carlos Roberto Siqueira Castro aponta as diferenças entre mediação e arbitragem. "A arbitragem é um processo que está sujeito a contestação. O árbitro é um juiz privado que colhe provas, depoimentos, pede perícia e julga. Tudo se desenrola em uma câmara de arbitragem privada, porém, não difere de um processo judicial."

Carlos Roberto Siqueira Castro, presidente da Câmara de Mediação da CCFB Foto: Estadão

Outra característica da arbitragem é que uma parte é adversária da outra e a decisão do árbitro se impõe às partes. "É um processo de perde e ganha. Não é tão demorado quanto um processo judicial, a média é de um a dois anos. Mas o custo é alto para a pequena empresa."

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Siqueira Castro afirma que, por outro lado, a mediação é completamente diferente, pois as partes não são tratadas como adversárias e o mediador não julga nem profere sentença. "Ele é um colaborador que busca restabelecer a comunicação entre os envolvidos."

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Segundo ele, a mediação emprega técnicas universais e científicas para que as partes sejam induzidas a formular um acordo. "O foco da mediação é o interesse das partes. Ela não busca estabelecer culpas, responsabilidades e indenizações. Todos ganham. A finalidade é satisfazer da melhor maneira o interesse dos implicados."

O advogado afirma que a lei de mediação determina que a ação não ultrapasse 60 dias. "É um processo rápido e tem preço módico, por isso, atrai cada vez mais o interesse das pequenas empresas, que podem solucionar pendências com clientes, fornecedores, consumidores e funcionários", explica.

Ele diz que a alternativa mais aconselhável para recorrer à mediação é que uma das partes, ou ambas, procure uma câmara privada de mediação, conte a controvérsia e indique o outro envolvido e o seu endereço. "A câmara encaminhará um comunicado convidando a outra parte para uma reunião. Caso ela tenha interesse, é designado um mediador. Isso ocorre no máximo em dez dias. Em média, em 75% dos casos é possível se chegar a um acordo."

Siqueira Castro conta que o Brasil tem um quadro preocupante, com 100 milhões de processos pendentes. "O Conselho Nacional de Justiça está estimulando a mediação. A tendência é de que os advogados, ao elaborar os contratos, incluam a cláusula da mediação para estimular as partes a procurar uma câmara privada caso ocorra alguma divergência."

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'Se todos estiverem dispostos a colaborar, a solução é rápida'

Úrsula Freitas, advogada da Bardot Nogueira de Castro e Advogados e também da Find Resolution Gestão Estratégica de Conflitos

A entrada em vigor da Lei de Mediação muda alguma coisa nos procedimentos que já vinham sendo adotados? A entrada em vigor da lei, no início deste ano, está ajudando a fomentar a cultura da mediação. Muita gente ficou conhecendo a existência dessa prática por meio da lei. Mas nada muda em relação ao que já vinha sendo praticado pelas câmaras de mediação.Há diferença entre mediação e conciliação? São procedimentos distintos. O conciliador pode dar sugestões para que o acordo de conciliação seja selado. O mediador não. Ele estimula as partes a construírem uma solução apropriada. Além disso, é obrigatório que o conciliador seja bacharel em direito. Já o mediador pode ter formação em qualquer área.Para quais casos é mais apropriado indicar a conciliação ou a mediação? Normalmente, a conciliação é indicada para relações que não têm continuidade no tempo, como a relação de consumo. Já a mediação é mais recomendada para relações que têm continuidade no tempo, como relação familiar, entre empresas, ou entre sócios, quando a relação precisa ser preservada.

Úrsula Freitas, advogada da Bardot Nogueira de Castro Advogados 

O custo é acessível? Os valores cobrados na mediação e na conciliação são semelhantes e acessíveis aos pequenos. Já na arbitragem, outro tipo de ação extrajudicial, o custo é mais elevado e normalmente é feita por um técnico naquela matéria. O árbitro vai efetivamente decidir o desfecho da ação. Ele vai julgar e dar uma sentença arbitral.Desde quando é mediadora? Atuo como mediadora desde 2009, em várias câmaras privadas e também no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Tenho uma experiência grande e percebo que de um ano para cá, houve crescimento perceptível na demanda.Que tipo de demanda costuma ser mais frequente? A mais recorrente entre as pequenas empresas são as divergências entre sócios, como a retirada da participação societária de um sócio e a definição de como será essa saída, e de quanto irá receber. Quanto a mediação pode ajudar nos negócios de uma pequena empresa? Pode ajudar muito. Além de ser mais célere, em relação a um processo judicial, ela é muito mais barata. Um conflito que levaria anos no judiciário leva no máximo dois meses na mediação. Depende muito do tempo que as pessoas têm para marcar as reuniões. Se todos estiverem dispostos a colaborar, ela é bem rápida.

Sebrae recomenda às MPEs alternativas extrajudiciais

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O consultor do Sebrae-SP, Silvio Vucinic, afirma que o objetivo tanto da mediação quanto da conciliação é fazer com que as partes se entendam. "O ideal é que as divergências sejam resolvidas sem que seja necessário entrar na justiça. Os conciliadores e mediadores utilizam várias técnicas para ajudar as partes. Eles desempenham o papel de facilitadores e escutam mais do que falam."

Vucinic diz que muitas vezes o problema levado à câmara de mediação ou conciliação não é exatamente o que está causando o desentendimento. "Pode haver algo a mais por trás, o que exige perspicácia do profissional para desenrolar a questão."

O consultor diz que além de câmaras privadas que oferecem o serviço com fins lucrativos, os interessados têm a possibilidade de recorrer às associações sem fins lucrativos que prestam esse serviço à sociedade.

 

Silvio Vucinic, consultor do Sebrae-SP Foto: Estadão

"Outra forma de acessar um conciliador é pelo poder judiciário. O Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, que mantém parceria com a Associação Comercial de São Paulo. O serviço de conciliação pode ser solicitado no Posto Avançado de Conciliação Extraprocessual (Pace) da Associação Comercial, instalado na Rua Galvão Bueno, número 83, no bairro Liberdade."

Segundo ele, essa câmara de conciliação opera com conciliadores voluntários que recebem treinamento e passam a atender as demandas. "O interessado tem de procurar o Tribunal de Justiça, apresentar a demanda e indicar qual é a outra parte, que será convidada para uma audiência de conciliação. Esse serviço é gratuito."

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Vucinic diz que quando já existe um processo em andamento, a primeira coisa que o juiz faz é designar uma audiência de conciliação processual na tentativa de fechar um acordo e colocar fim no processo. "Mas nesse tipo de conciliação a taxa de acordos é de apenas 25%, contra 70% nas extrajudiciais."

Ele conta que o Sebrae recomenda frequentemente que pequenos empresários procurem um acordo por meio de conciliação ou mediação. "Os empreendedores têm procurado câmaras de comércio que oferecem o serviço gratuito e até mesmo faculdades de direito que costumam ter um núcleo de prática jurídica, onde ocorrem audiências de conciliação. É uma prática cada vez mais utilizada." Segundo ele, a demanda mais frequente é de descumprimento de contrato.

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