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Analises do cenário econômico

Nem tudo o que cai sobe

No Brasil, o investimento é mais sensível na queda do que na alta do ciclo econômico

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Por Zeina Latif
Atualização:

É natural que o ciclo de investimento em um país seja mais volátil do que o ciclo do PIB, afinal as decisões de investimento são as mais impactadas pelo quadro econômico em comparação ao consumo das famílias e os gastos do governo, que têm comportamento mais estável.

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O que tem de curioso no passado recente do Brasil é que o investimento cai mais na fase baixa do ciclo econômico do que sobe na fase de alta, fazendo com que o crescimento acumulado do investimento fique abaixo do crescimento do PIB. Esse retrato distingue o País dos países vizinhos que têm ciclo econômico e regime de política econômica similares ao do Brasil, ainda que com ambiente macroeconômico mais estável, como Chile, Peru e Colômbia.

Fazendo um balanço desde 2000, o que se observa é que na fase descendente do ciclo econômico, com desaceleração do crescimento ou contração do PIB, a variação anual do investimento ficou 5,3% abaixo da variação anual do PIB, enquanto na que fase ascendente, a variação do investimento ficou 4,5% acima da variação do PIB (utilizando dados trimestrais). Em outras palavras, o investimento é mais sensível na queda do que na alta do ciclo econômico.

Construção civil é um setor que exemplifica o movimento ( Foto: Reuters)

Comparando esses número com o dos "vizinhos arrumados", as cifras são em média 4,8% e 7,7%, respectivamente. Portanto, o ciclo de investimento não é mais acidentado ou volátil no Brasil na comparação com os vizinhos, mas é menos virtuoso, principalmente pela sua baixa capacidade de reação na fase de alta do ciclo econômico.

O que se discute não é o fato de a taxa de investimento ser baixa como proporção do PIB no Brasil, ainda que este seja um corolário do quadro descrito acima, mas sim o seu ímpeto mais modesto nos momentos de crescimento econômico. Isso mesmo com o avanço do investimento público, com aumento médio de 17% ao ano entre 2006-10, um período de alta do ciclo econômico.

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As taxas de juros muito mais elevadas no Brasil podem ser um fator limitante do investimento. Afinal, juros elevados significam que projetos de investimento com retorno mais modesto são descartados. É importante, no entanto, ir além dessa explicação, pois a taxa de juros elevada não é algo que se altera com voluntarismo. Cortar juros a qualquer custo não é uma opção de fato disponível de política econômica.

Para além desse ponto, três ponderações. Primeiro, mesmo com a expressiva ampliação do crédito subsidiado do BNDES (11% do PIB em abril de 2016 ante 5,9% em dezembro de 2006) e do crédito imobiliário, também subsidiado, direta ou indiretamente (9,7% do PIB em abril/16 ante 1,7% em dez/06). É verdade que o resultado pode ser reflexo de um desenho equivocado das políticas públicas. De qualquer forma, vale o registro que reduzir taxa de juros não resolve o problema do investimento.

Segundo, abrindo o comportamento do investimento (formação bruta de capital) entre consumo aparente de máquinas e equipamentos e produção de insumos da construção civil, o que se nota é que é a construção civil que produz este padrão de contrair mais na fase baixa do ciclo e subir menos na alta, o que não ocorre no consumo de máquinas e equipamentos. Esse resultado reforça que a taxa de juros é fator limitador do investimento, mas não explica sozinha a fraqueza do ciclo de investimento. Se a taxa de juros elevada tivesse papel tão central, o padrão comportamento desses dois grupos seria mais uniforme.

Terceiro, o México, assim como o Brasil, também enfrenta essa assimetria de reação do investimento a fases descendente e ascendente do ciclo econômico, apesar de ter taxas de juros muito inferiores (a taxa básica de juros está em 3,75% e a taxa real ex-ante está em 0,5%; no Brasil, 14,25% e 7,6%, respectivamente) e ambiente macroeconômico mais estável.

Assim, outros fatores concorrem para explicar a fraqueza do ciclo de investimento. E o candidato natural é o ambiente institucional do país.

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No Brasil, a insegurança jurídica e regulatória estão na raiz da fraqueza do investimento, principalmente em infraestrutura. O México, por sua vez, sofre as consequências de um Judiciário fraco, com baixa aderência ao estado de direto e ao cumprimento (enforcement) de leis e regulações, além dos problemas com segurança. Esse quadro implica elevada informalidade no país e mercado de crédito muito restrito, reforçando o quadro de menor vigor do investimento.

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A posição do Brasil nos rankings globais de competitividade diz muito sobre a fragilidade do país. No Doing Business, por exemplo, o Brasil está na posição 116 enquanto os "vizinhos arrumados" estão ao redor de 50.

Outro elemento que pode fazer diferença é o fato de a economia brasileira ser muito fechada, o que significa menor incentivo ao investimento e à inovação. Levando em conta não apenas a corrente de comércio, que tende a ser pequena em países com mercado interno robusto, mas também as políticas comerciais, o Brasil é considerada uma das economias mais fechadas no mundo.

Mesmo assumindo o sucesso do governo na agenda de estabilização da economia, a retomada do investimento não virá tão cedo. Há elevada ociosidade de fatores na economia (nível de utilização da capacidade instalada está em 74% ante 77% no auge da crise global de 2008/09) e há excesso de oferta no mercado imobiliário. Além disso, a capacidade de investimento do setor público, que representa algo como 18% da formação bruta total, estará comprometida por muito tempo.

Que esta dura realidade seja incentivo para avançarmos na agenda microeconômica, que daria maior capacidade de investimento ao setor privado. A saída via aumento da oferta de crédito subsidiado, demanda usual do setor produtivo, seria equivocada. Precisamos mudar o disco.

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