China detecta coronavírus em frango nacional, mas setor descarta embargo

Traços da doença foram encontrados em embalagem de produto associado ao frigorífico Aurora; Ministério da Agricultura diz que fiscalização é rígida, mas não infalível, enquanto fonte do setor afirma que risco de barreira à carne brasileira é real, porém baixo

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Por Redação
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SÃO PAULO e BRASÍLIA - A informação de que uma autoridade do município chinês de Shenzhen encontrou traços de coronavírus em uma embalagem de frango de origem brasileira, divulgada na quinta-feira, 13, acendeu a luz amarela para o mercado brasileiro de carnes, que tem a China como principal cliente. A embalagem em questão teria saído de uma das unidades do frigorífico catarinense Aurora. A notícia, que ainda não foi confirmada pelo entidade alfandegária do País, a Gaac, causou apreensão no agronegócio brasileiro. Fontes do setor descartaram um embargo no curto prazo, mas disseram que a possibilidade de uma barreira não é nula.

A apreensão tem razão de ser. Um dos dez principais itens da pauta exportadora, a venda externa de carne de frango somou, de janeiro a julho de 2020, um total de 2,47 milhões de toneladas, com alta de 0,5% em relação ao mesmo período do ano passado. Em volume financeiro, por causa da alta do dólar, o avanço foi de 11%, na mesma comparação, para mais de US$ 4,1 bilhões, de acordo com dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

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Vírus foi encontrado em pequena amostra retirada de um lote importado do Brasil. Foto: Tasso Marcelo/Estadão

O caso em relação ao setor se refletiu, por exemplo, na forte queda da ação da empresa de alimentos BRF. Os papéis da companhia despencaram quase 8% nesta quinta, fechando o dia cotados a R$ 20,93. 

O presidente do conselho da BRF, Pedro Parente, afirmou, em São Paulo, que uma notícia de contaminação traz “problemas” a todo o setor. “Tivemos um resultado sólido da BRF (no balanço do segundo trimestre, divulgado ontem), mas mesmo assim as ações da companhia caíram bastante”, disse Parente. “Não foi com a nossa companhia, mas isso não importa.” 

Cuidados para evitar contaminação

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Diante da possibilidade de prejuízos às exportações, o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Agricultura, Orlando Leite Ribeiro, afirmou que os frigoríficos brasileiros seguem rígidos protocolos para evitar contaminação dos produtos durante a pandemia do coronavírus, mas que não existe “risco zero”. “É preciso sublinhar que não existem estudos científicos que sustentem o contágio por alimentos”, disse Ribeiro.

Segundo o Ministério da Agricultura, o governo brasileiro já entrou em contato para esclarecer a situação. Uma fonte do setor garantiu que a contaminação foi externa - ou seja, na embalagem - e não no produto em si. Isso reduziria os riscos de alguma sanção à carne brasileira. 

A China está acompanhando de perto traços da doença em itens alimentícios. Uma reportagem da Reuters afirmou também nesta quinta-feira que sete frigoríficos argentinos tiveram exportações suspensas por causa da covid-19. A suspensão relacionada à Argentina se refere à carne bovina, e não de frango. A China foi o destino de 75% da carne vendida ao exterior pela Argentina no ano passado.

Fontes do setor disseram que a chance de um embargo chinês ao frango brasileiro existe, embora o risco de isso ocorrer não pareça, no momento, relevante. “Certamente eles não pretendem partir para o embargo. Eles precisariam de mais evidências e fatos para chegar a esse ponto, mas há risco”, disse um especialista da área ao Estadão/Broadcast. Diante da necessidade de importar alimentos para abastecer seu mercado interno gigante, a China também tem interesse em esclarecer rapidamente a situação.

Parente, da BRF, ressaltou ontem ser “evidente” que a China vai precisar continuar comprando carnes do Brasil. “Ela não tem muitos países para suprir a redução doméstica da proteína suína”, disse, referindo-se à perda de cerca de 40% do plantel chinês de porcos por causa da peste suína africana. “A realidade tem de se impor, e a realidade é que a China precisa de nós, da proteína brasileira.”

A Aurora, que não é listada em Bolsa, é a terceira maior empresa do Brasil em processamento e exportação de carne de frango e suína. Procurada, a companhia divulgou nota em que afirma não ter sido notificada oficialmente pelas autoridades chinesas de que a amostra testada é de uma de suas unidades. A empresa afirmou que “todas as medidas estabelecidas pelas autoridades públicas, relativas ao combate à pandemia, estão sendo integralmente seguidas” em suas fábricas.

Outros casos na China

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Também na quinta-feira, amostras de outro pacote de camarões congelados do Equador vendidos na cidade de Xi'An, no noroeste da China, testaram positivo para o vírus, disseram autoridades locais.

As descobertas vieram um dia depois que traços do coronavírus que causa a covid-19 terem sido descobertas em embalagens de camarões congelados também do Equador em uma cidade na província de Anhui, ao leste do país. A China tem aumentado as análises em portos devido a preocupações com importações de alimentos. 

Autoridades de saúde de Shenzhen disseram que rastrearam e testaram todos que possam ter tido contato com os alimentos potencialmente contaminados e que todos resultados foram negativos.

Além dos testes em contêineres de carnes e frutos do mar que chegam aos principais portos nos últimos meses, a China suspendeu algumas importações de carnes de diversas origens, incluindo o Brasil, desde meados de junho.

O chefe de microbiologia do laboratório do Centro Nacional de Avaliação de Segurança Alimentar da China, Li Fengqin, disse a jornalistas em junho que a possibilidade de alimentos congelados causarem novas infecções não poderia ser descartada. / ÉRIKA MOTODA, LORENNA RODRIGUES e TÂNIA RABELLO, COM REUTERS