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Estiagem e frio frustram expectativa de nova safra agrícola recorde

Conab já prevê que a colheita de 2021 será 1,2% menor que a anterior; o IBGE ainda estima aumento de 0,8% na safra, mas fez revisões para baixo pelo quarto mês seguido

Por Vinicius Neder
Atualização:

RIO - A estiagem e, mais recentemente, as ondas de frio estão jogando por terra a perspectiva de mais um recorde na safra de grãos, mostram dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dois órgãos fazem estimativas diferentes para a produção nacional, mas os dados apontam para o mesmo caminho. 

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A Conab já prevê que a safra de 2021 ficará 1,2% abaixo da anterior, com 253,98 milhões de toneladas. O IBGE ainda estima ligeiro aumento, de 0,8%, mas fez revisões para baixo pelo quarto mês seguido - e a perspectiva é de continuar rebaixando as previsões.

Segundo a Conab, apesar de ter havido aumento de área plantada em cerca de 4%, a redução na produção se deve, principalmente, à queda das produtividades estimadas nas culturas de segunda safra, “justificada pelos danos causados pela seca prolongada nas principais regiões produtoras, bem como às baixas temperaturas com eventos de geadas ocorridas nos Estados da região centro-sul do País”.

A produção de milho é a mais afetada. Conforme a Conab, a produção total deve atingir 86,65 milhões de toneladas, queda de 15,5% em comparação com 2020. A primeira safra, de verão, está projetada em 24,9 milhões de toneladas, 11% abaixo da safra anterior. A segunda safra, tradicionalmente chamada de “safrinha”, deve ser de 60,32 milhões de toneladas, 19,6% abaixo de 2020. Os dados do IBGE são diferentes, mas estão no mesmo sentido.

A safra de milho deve ser a mais afetada, com queda de 15,5% em relação a 2020. Foto: Rafaeç Arbex/Estadão - 20/3/2019

“Em vários Estados não tivemos chuvas, foi pior do que o esperado”, afirmou Carlos Antônio Barradas, analista de Agropecuária do IBGE. “Para piorar, tivemos as baixas temperaturas (mais recentemente). Em muitas regiões do Paraná e de Mato Grosso do Sul, geou. Isso complica, porque pegou boa parte das lavouras de segunda safra, mas só vamos ter a noção quando terminar a colheita de todo o milho”, completou o pesquisador.

Segundo Barradas, as estimativas do órgão para a segunda safra de milho poderão piorar porque os efeitos negativos das geadas ainda não foram totalmente captados pelo Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA) de julho. Além disso, há a possibilidade de novas ondas de frio chegarem, enquanto a continuidade da estiagem poderá atrapalhar a produção de trigo.

“A estimativa de trigo está bastante elevada. Alguns Estados ainda não informaram os problemas nem com a seca e, principalmente, com as geadas. As estimativas devem cair mais”, afirmou o pesquisador do IBGE.

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Barradas explicou que a segunda safra de milho já enfrentava dificuldades associadas ao atraso no plantio. Isso porque a temporada de chuvas do verão passado, tradicionalmente iniciada em outubro, demorou a chegar. Com isso, o plantio da safra 2020/2021 de soja foi adiado, provocando adiamentos no milho de segunda safra - no Brasil, a segunda safra de milho é plantada nas mesma áreas usadas para a soja, assim que termina a colheita.

Segundo Barradas, a segunda safra de milho precisa ser plantada até meados de abril, para aproveitar ainda a umidade dos solos. O atraso no plantio, portanto, dificultou esse processo de aproveitamento. Com a seca mais forte do que o esperado, parte do milho plantado está se perdendo. As geadas provocadas pelas ondas de frio no Centro-Sul agravaram o quadro, mas apenas nas edições de agosto e setembro do LSPA, quando a colheita do milho de segunda safra estará praticamente encerrada, os números das perdas ficarão mais claros.

A produção agrícola nacional só não será mais frustrada por causa da safra recorde de soja. Com a colheita praticamente encerrada, o IBGE espera uma produção de 133,4 milhões de toneladas, alta de 9,8% ante 2020, consolidando o Brasil como maior produtor mundial. Como já demonstrado nas estimativas de meses anteriores, o recorde na produção de soja será impulsionado pelos produtores do Rio Grande do Sul, que, em 2020, enfrentaram uma forte seca localizada.

Se houver queda na produção total de 2021, será a primeira redução desde 2018, conforme os dados do IBGE. Naquele ano, a safra de grãos somou 227,5 milhões, 4,7% abaixo de 2017. Apesar da queda, era a segunda maior safra da série histórica do IBGE até então. De 2019 em diante, os recordes foram sendo renovados, pulverizando os números de 2017 e 2018. 

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PIB agrícola deve ficar estável

Para o diretor da consultoria MB Agro, José Carlos Hausknecht, o quadro desenhado pelos números da Conab e do IBGE confirma a expectativa de estabilidade no Produto Interno Bruto (PIB) da agropecuária no fechamento deste ano. No primeiro trimestre, o PIB da agropecuária avançou 5,7% ante os três últimos meses de 2020, em desempenho impulsionado pela soja. No início do ano, as expectativas apontavam para um avanço de 2% a 3% no PIB da agropecuária, alta que foi minada pelos efeitos do clima sobre a produção.

“Já vínhamos com a seca, e o quadro foi agravado com as geadas”, disse Hausknecht, referindo-se às recentes ondas de frio no centro-sul.

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Apesar dos problemas climáticos e da frustração com a produção em 2021, o quadro ainda é favorável para o agronegócio, disse o diretor da MB. Com as cotações das commodities (matérias-primas negociadas internacionalmente) elevadas e o dólar alto, os produtores agrícolas nacionais ainda têm um impacto positivo em sua renda. Isso sinaliza para renovação de investimentos para a próxima safra e manutenção do ritmo de crescimento econômico nas regiões do País impactadas positivamente pela agropecuária.

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