5G: Ministro do TCU pede mais tempo para análise de edital; leilão pode atrasar mais

Maioria do plenário obriga ministro que pediu vista do processo a trazer processo para julgamento da corte de contas na próxima semana; edital já havia sido aprovado pela Anatel em fevereiro

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Por Anne Warth
6 min de leitura

BRASÍLIA - O ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União (TCU), pediu vista (mais tempo para análise) no julgamento do edital do leilão do 5G. O governo contava com a aprovação do edital com a manutenção dos compromissos de investimentos propostos às empresas de telecomunicação que vão disputar as frequências, como a criação de uma rede privativa de comunicações, exclusiva parfa órgãos públicos, e um programa de conectividade na Amazônia. A tendência era incluir ainda como contrapartida a conectividade de todas as escolas públicas até 2024.

Cedraz pediu dois meses para apresentar seu voto, mas, depois, aceitou reduzir o tempo para um mês. Mesmo assim, os ministros o pressionaram e impuseram a ele trazer o tema novamente a julgamento na semana que vem.O relator, Raimundo Carreiro, recomendou a aprovação do edital e recebeu dois votos favoráveis, os de Wallton Alencar e Augusto Nardes. Em seguida, Cedraz pediu vista do processo, algo que, tradicionalmente, interromperia o julgamento - o que não ocorreu.

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 Mesmo com o pedido de vista, a presidente do TCU, ministra Ana Arraes, manteve a sessão aberta, e permitiu que outros quatro ministros - Bruno Dantas, Vital do Rêgo, Jorge Oliveira e Marcos Bemquerer - antecipassem seus posicionamentos. Ao final, foram sete votos a favor do edital e um pedido de vista, já que Ana Arraes não vota, a não ser em caso de empate.

De toda forma, esse período extra pode atrasar ainda mais o leilão do 5G no Brasil. O edital já havia sido aprovado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em 25 de fevereiro. Somente depois da aprovação no TCU e de prováveis ajustes pela Anatel dos pedidos feitos pelo órgão será possível marcar o leilão.

Em fevereiro, a Anatel apostava que seria possível marcar o leilão para agosto, mas, diante do atraso no julgamento da corte de contas, a disputa pode ficar para 2022. "Repudio qualquer imputação de que o TCU esteja atrasando o edital do 5G”, disse Cedraz. Ao justificar sua decisão, ele afirmou que o Ministério das Comunicações e a Anatel enviaram dados “incompletos” sobre a licitação e demoraram meses para sanar as dúvidas da área técnica da corte de contas.

O governo planejava fazer o leilão ainda no primeiro semestre, para evitar que o Brasil ficasse atrasado relativamente a outros países do mundo no 5G. A maioria dos países oferece um sinal mais veloz que o 4G, mas alguns deles a partir de sobras de outras faixas que não a frequência de 3,5 GHz. 

Dados da GSMA, entidade que representa operadoras móveis em todo o mundo, apontam que já há 5G em operação nos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, África do Sul, além de vários países na Europa. O primeiro foi a Coreia do Sul, e a maioria já realizou leilões nos últimos dois anos. Os países mais atrasados são Portugal e os da América Latina e África.

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Para Juarez Quadros, ex-ministro das Comunicações e ex-presidente da Anatel, o Brasil já está ficando para trás. “Estamos atrasados. A Anatel iniciou o processo em 2018. Decorrem três anos de trabalhos. Espero que o leilão ocorra ainda em 2021”, disse. Segundo ele, até maio deste ano, 159 operadoras em 66 países já haviam lançado o 5G móvel. Na modalidade fixa, o 5G já era ofertado por 62 empresas em 35 países, disse Quadros.

Edital original previa que o5G chegaria às capitais brasileiras em julho do ano que vem. Foto: Gonzalo Fuentes/Reuters - 22/4/2021

A tecnologia 5G é a quinta geração das redes de comunicação móveis. Ela promete velocidades até 20 vezes superiores ao do 4G, com maior consumo de vídeos, jogos e ambientes em realidade virtual. Será a maior licitação de espectro da história do País.

De acordo com o edital original, as empresas deveriam começar a ofertar 5G nas capitais e no Distrito Federal até julho de 2022. Para municípios com mais de 500 mil habitantes, o prazo limite era julho de 2025; para aqueles com população acima de 200 mil, julho de 2026; e para os com mais de 100 mil, julho de 2027. Esses prazos terão que ser adiados, mas as teles poderão, também, antecipar o cronograma, se conseguirem limpar a faixa de 3,5 GHz antes do prazo de 300 dias após a assinatura dos contratos.

A área técnica do TCU considerou que a rede privativa (rede exclusiva de comunicações do governo) e o Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS), projeto que visa construir infovias (conjunto de linhas digitais por onde trafegam os dados) no Norte do País, representam um drible no teto de gastos, a regra que proíbe que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. Ao colocar esses investimentos como obrigação das empresas, o governo economizaria recursos e não pressionaria o teto.Por isso, os técnicos recomendaram retirá-los, mas a tendência é que os ministros não sigam esse entendimento. 

O leilão do 5G será a maior licitação de telecomunicações da história do País. O valor presente líquido de todas as faixas que serão leiloadas - 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHZ) - foi estimado em R$ 45,8 bilhões, e o valor dos compromissos, em R$ 37 bilhões. Dessa forma, a outorga mínima seria de R$ 8,7 bilhões, sendo R$ 1,4 bilhão para as teles que comprarem as faixas de cobertura nacional da faixa de 3,5 GHZ, a principal para o 5G.

Compromissos

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Como forma de reduzir o valor da outorga (taxa paga ao governo pelo uso das faixas), o governo decidiu impor obrigações de investimento. Cada compromisso será abatido do bônus que as empresas teriam que pagar ao Tesouro. O Ministério das Comunicações, porém, incluiu no edital dois compromissos que nada tem a ver com o 5G. Para a rede privativa, o limite de investimentos vinculados ao edital será de R$ 1 bilhão, e para o programa de conectividade na Amazônia, de R$ 1,5 bilhão.

Para os técnicos do TCU, a rede privativa e o projeto de conexão do Norte eram ilegais e representavam uma tentativa de excluir despesas públicas do Orçamento para desviar do teto de gastos. Na avaliação deles, os dois projetos configuravam atividade-meio da administração pública e deveriam ser contratados por licitação, execução direta da Telebras ou por meio de parceria público-privada (PPP) - alternativas que o governo queria evitar.

A manutenção desses investimentos no edital era tratada como prioridade pelo governo, que formou uma força-tarefa para convencer os ministros do TCU a acatá-los. A todo custo, o governo queria evitar ter que fazer uma licitação para viabilizar ambos os projetos ou ter que direcionar recursos do Orçamento para realizá-los. Pelo edital aprovado pelo TCU, ambos terão que ser realizados pela teles, por meio da Entidade Administradora da Faixa de 3,5 GHz (EAF), que será formada logo após o leilão.

“O TCU não pode aceitar esse rolo compressor”, afirmou Cedraz. Ele não citou nomes, mas deixou implícito que se referia a Faria, que tem pressa em realizar a disputa até o fim deste ano e reclamou publicamente do TCU em ocasiões anteriores.

Relator do edital no TCU, o ministro Raimundo Carreiro considerou a rede privativa e os investimentos na Amazônia como projetos excepcionais, relevantes e de caráter coletivo. Ele destacou que o TCU vai acompanhar a execução dos projetos e que poderá punir os responsáveis caso haja problemas ou desvios.

Escolas conectadas

Também presente no voto de Carreiro, um projeto proposto pela Comissão de Educação da Câmara, para incluir a conectividade de todas as escolas públicas de Educação Básica até 2024, deve ser incluído entre as obrigações que as teles deverão cumprir no edital. Para o relator, o compromisso de universalizar o acesso à internet banda larga na educação é relevante já estava previsto em leis anteriores.

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Esse projeto será a contrapartida para quem adquirir a faixa de 26 GHz, a única que não tinha compromissos no edital original, cuja outorga custaria R$ 6 bilhões. Essa faixa tem maior capacidade, mas menor alcance, e será voltada para usos específicos da indústria.

Demais compromissos

Também devem incluídos como compromissos para outras faixas. Na faixa principal do 5G, além dos investimentos na Amazônia e da rede privativa, as teles deverão limpar a faixa a faixa de 3,5 GHz para poder transmitir o sinal sem interferências. Para isso, terão que pagar pela migração dos canais satelitais, que usam a frequência para transmissão de sinal de TV parabólica, para outra banda satelital – conhecida como banda kU – em até 300 dias após a assinatura dos contratos.

Para não deixar famílias carentes e que dependem das parabólicas sem TV, as teles deverão distribuir kits àquelas atendidas por programas sociais do governo. Ao todo, esse projeto deve custar R$ 3 bilhões. As operadoras também terão de cobrir todos os municípios com 5G.

Para a faixa de 700 MHz, remanescente do leilão 4G, as vencedoras deverão implantar 4G em localidades de municípios ainda desconectados e rodovias. Por determinação do Ministério das Comunicações, a prioridade é a instalação de cobertura móvel em seis rodovias federais. Terão preferência as BR 163, 364, 242, 135, 101 e 116. Atualmente, os trechos sem sinal nessas rodovias somam 48 mil quilômetros. Na faixa de 2,3 GHz, será preciso instalar 4G em localidades e municípios ainda sem sinal.al nessas rodovias somam 48 mil quilômetros.

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