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A economia ''pato manco''

Por Paul Krugman (The New York Times)
Atualização:

Todos estão falando sobre um novo New Deal, por motivos óbvios. Em 2008, assim como em 1932, uma longa era de predomínio político republicano foi encerrada diante de uma crise econômica e financeira que, aos olhos dos eleitores, ao mesmo tempo desacreditava a ideologia de livre mercado do Partido Republicano e solapava suas alegações de competência. E para aqueles que se situam no lado progressista do espectro político a época atual é de esperança. Há, no entanto, um outro paralelo entre 2008 e 1932, uma semelhança muito mais perturbadora - o surgimento de um vácuo de poder no ápice da crise. O interregno de 1932-1933 - o longo período entre a eleição e a transição do poder de fato - foi desastroso para a economia americana, ao menos em parte porque a administração que saía não tinha credibilidade, a administração que chegava não tinha autoridade e o abismo ideológico entre ambas era profundo demais para permitir que fossem adotadas medidas coordenadas. E o mesmo está acontecendo agora. É verdade que o interregno será mais curto desta vez: Franklin Delano Roosevelt só assumiu a presidência em março; Barack Obama vai para a Casa Branca no dia 20 de janeiro. Mas hoje em dia as crises evoluem mais rápido. Quanta coisa pode dar errado nos dois meses até que Obama preste seu juramento e assuma o cargo? A resposta, infelizmente, é: muita coisa. Pense no quanto o cenário econômico piorou desde a falência do Lehman Brothers, que aconteceu há apenas dois meses. E o ritmo da deterioração parece estar se acelerando. Obviamente, estamos metidos na pior crise do mercado de ações desde a Grande Depressão: o índice S&P 500 caiu agora para menos de 50% do seu valor máximo. Outros indicadores são ainda mais perturbadores: o desemprego parece estar aumentando, a produção manufatureira está em queda, a taxa de juros sobre os títulos privados - a qual reflete o temor de inadimplência dos investidores - está aumentando muito, o que quase certamente levará a uma redução considerável nos gastos empresariais. As perspectivas econômicas são hoje muito mais sombrias do que eram há apenas uma ou duas semanas atrás. Ainda assim, as medidas econômicas, em vez de responder à ameaça, parecem ter saído de férias. Em especial, o pânico dá sinais de ter retornado aos mercados de crédito, mas não parece haver um novo plano de resgate no horizonte. Ao contrário, o secretário do Tesouro, Henry Paulson, anunciou que nem sequer voltará ao Congresso para buscar a outra metade dos US$ 700 bilhões já aprovados para a realização de resgates financeiros. E o socorro financeiro para a combalida indústria automobilística está sendo atrasado por um impasse político. O quanto deveríamos nos preocupar com aquilo que parecem ser dois meses de medidas econômicas à deriva? No mínimo, os próximos dois meses vão infligir graves sofrimentos sobre centenas de milhares de americanos, os quais perderão seus empregos, seus lares, ou ambos. O mais preocupante, no entanto, é a possibilidade de que parte do estrago feito agora seja irreversível. Estou preocupado, em especial, com as duas letras D: Deflação e Detroit. Quanto à deflação: a "década perdida" japonesa durante os anos 90 ensinou aos economistas que é muito difícil fazer a economia avançar quando as expectativas de inflação se tornam baixas demais (não importa se as pessoas literalmente acreditam que os preços vão cair ou não). No momento observamos uma clara pressão deflacionária sobre a economia americana, e cada mês que se passa sem sinais de recuperação aumenta as chances de nos vermos encalhados durante anos numa armadilha ao estilo japonês. Quanto a Detroit: Há agora o risco real de que, na ausência de uma rápida ajuda federal, as "Três Grandes" montadoras e as suas redes de fornecedores sejam forçadas à liquidação - ou seja, obrigadas a fechar, demitir todos os seus funcionários e vender seus bens. E, se isto acontecer, será muito difícil trazê-las de volta. Quem sabe deixar que as empresas montadoras pereçam seja a decisão certa, mesmo que um colapso da indústria automobilística seja um fortíssimo golpe contra uma economia já cambaleante. Mas trata-se de uma decisão que deveria ser tomada com cuidado, com ampla consideração quanto aos seus custos e benefícios - e não uma decisão tomada automaticamente por causa de um impasse político entre democratas - que querem que Paulson use parte daqueles US$ 700 bilhões - e a administração no período do pato manco - que tenta em vez disso obrigar o Congresso a desviar os fundos a partir de um programa de eficiência energética. Será que as medidas econômicas estão completamente paralisadas de agora até 20 de janeiro? Não, não completamente. Algumas medidas úteis estão sendo tomadas. As agências de empréstimo Fannie Mae e Freddie Mac, por exemplo, adotaram a feliz decisão de paralisar temporariamente as execuções hipotecárias, enquanto o Congresso aprovou uma extensão muito necessária aos benefícios do seguro-desemprego agora que a Casa Branca abandonou a oposição à mesma. Mas não há nada acontecendo no front das medidas econômicas que seja remotamente proporcional à escala da crise econômica. E é assustador pensar no quanto mais pode dar errado até que Obama assuma a presidência. * Paul Krugman é articulista

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