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A escadinha

A cada dia que passa, torna-se mais evidente o vazio que o País viveu durante anos, antes de Joaquim Levy ser convidado para o Ministério. Com Levy, depois de muito tempo, voltamos a ter no cargo alguém com estatura, atitude e postura de ministro da Fazenda. Os primeiros passos do novo ministro, porém, foram dados em campo minado. Primeiro, não se sabia ao certo o tamanho das “pedaladas” deixadas pela gestão anterior. Segundo, ele precisava conquistar a confiança da presidente da República para o ajuste que era necessário empreender. E terceiro, ele era visto como uma espécie de “quinta coluna” pela militância mais aguerrida do Partido dos Trabalhadores (PT), o que, obviamente, não ajuda nos passos que precisam ser dados. Seis meses depois da posse, as circunstâncias agora são um pouco diferentes. Levy conhece perfeitamente o terreno que está pisando, tem o apoio claro da presidente Dilma e vimos que, na prática, em que pese a oposição dos grupos mais radicais do PT ao ajuste, o que conta na hora H são os votos no Congresso, de modo que é possível ao ministro continuar a avançar apesar da resistência feroz que recebe de alguns grupos. “Los perros ladran, Sancho, señal que cabalgamos”, disse Dom Quixote a Sancho Pança. Joaquim Levy é o nosso Dom Quixote enfrentando aqueles que se opõem ao ajuste. Ao mesmo tempo, salta aos olhos para qualquer observador atento e cuidadoso da realidade fiscal que a meta de superávit fiscal de 2% do PIB definida de 2016 em diante é insuficiente para conter a expansão da dívida pública. Joaquim Levy assumiu e, depois de se comprometer com a meta de 1,2% do PIB de superávit primário para o ano em curso, disse que nos anos posteriores o superávit seria de “no mínimo 2% do PIB”, o que foi rapidamente substituído nas semanas seguintes por “meta de 2% do PIB”. Entretanto, há dois problemas com o número. O primeiro é que cada vez mais gente julga que o Brasil terá pela frente dificuldades muito sérias para crescer a taxas como as observadas na segunda metade da década passada, de modo que, quanto menor o dinamismo da economia, maior terá de ser o esforço compensatório da receita que não teremos. O ajuste fiscal que pode ser suficiente para uma economia que cresce sustentadamente 4% ao ano não evitará uma alta da relação dívida/PIB se o PIB crescer só 2,5% ou 3%. O segundo problema é que são cada vez mais próximas as chances de o Banco Central norte-americano colocar em prática uma estratégia de altas graduais das taxas de juros, que levarão a política monetária dos EUA a normalizar-se plenamente na altura de 2018, pressionando as taxas de juros externas e, consequentemente, as taxas do resto do mundo, exigindo uma contrapartida fiscal para que a maior despesa de juros não gere simplesmente um déficit público maior. Por isso, junto com a expectativa de alguma recuperação - mesmo que parcial - do crescimento para a segunda metade do atual mandato, o que facilitaria um pouco a equação fiscal, as autoridades deveriam anunciar uma “escadinha”. Por meio dela, a meta de superávit primário, depois da melhora de 2015 e do compromisso de 2% do PIB para o ano que vem, seria ampliada para 2,25% do PIB no ano de 2017 e para 2,50% do PIB em 2018. Não faz sentido que um governo que terá sido capaz de promover um shift fiscal importante no ano em curso, com o PIB caindo mais de 1%, não seja capaz de promover uma melhora de 0,25% do PIB por ano numa etapa em que ele espera que a economia esteja crescendo a pelo menos 3%. A perpetuação de uma meta fiscal insuficiente em anos de maior crescimento seria um péssimo sinal emitido para quem financia uma entidade - governo - cuja relação entre o endividamento e o PIB começa a crescer de forma preocupante. Ao mesmo tempo, uma meta de 2,5% para 2018 seria uma boa notícia para pavimentar o terreno para chegar lá em melhores condições, contribuindo para o resgate da credibilidade danificada no desastre fiscal de 2013/2014.

Por Fabio Giambiagi
Atualização:

*Fabio Giambiagi é economista.

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