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A escolha é a infraestrutura

A saída desta crise vai exigir um novo modelo de país, com investimentos públicos e privados inteligentes

Por Adriano Pires
Atualização:

A crise da pandemia – e o pior, com muitos lutos – se alonga mundo afora e agora cada vez mais sentiremos os seus efeitos na economia. Esta crise tem como uma de suas principais particularidades o fato de que o detonador não foi econômico, mas a saúde pública. A crise de 2008 teve como causa o chamado subprime que desorganizou o mercado financeiro americano, levando a uma quebradeira de bancos e obrigando o governo a colocar dinheiro para salvar entidades financeiras. A saída da atual crise também vai exigir como resposta o aumento de gastos e, posteriormente, de investimentos públicos, mas a principal resposta será dada pela ciência, com a descoberta de um tratamento e/ou de uma vacina.

Como enxergo as saídas? A primeira e mais desejada seria pela ciência. O mundo vai poder esperar? Creio que não. A segunda é que as pessoas, apesar do risco, tendem a tomar a decisão de voltar a uma nova normalidade de sua vida. Essa decisão é determinada por dois tipos de fatores: econômicos e sociais. Os primeiros, ligados ao emprego, à renda e à sobrevivência das empresas. Protegendo as empresas, protegemos os empregos. Quanto aos sociais, as pessoas cada vez mais precisam do retorno da sociabilidade. Ninguém aguenta o isolamento por prazo indefinido. A reabertura da economia com o estabelecimento de protocolos tem tido sucesso em diversos países e no Rio Grande do Sul, no caso do Brasil. A economia reagiu positivamente e o preço do barril de petróleo já ultrapassou os US$ 30,00.

País precisa investir R$ 8,7 trilhões em energia, saneamento, telecom e logística. Foto: José Luiz da Conceição/Estadão

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Enquanto em diversos países existem planos e união em torno do combate ao vírus e da reabertura da economia, aqui temos boas ideias, péssima execução e informação de baixa qualidade. A consequência se traduz na ausência de planos consistentes para o combate à pandemia, para a reabertura da economia e para a retomada do crescimento econômico. Com isso, corremos o risco de caminhar para uma catástrofe social e econômica. A social, com um crescimento exponencial da pobreza, do desemprego e dos empregos informais. A econômica, que hoje aparece numa clássica crise de queda da demanda, contaminará a oferta, fechando empresas de diferentes tamanhos. É preciso reagir.

No Brasil, o agronegócio e a mineração voltados para exportação estão entre os setores mais protegidos. Isso é explicado por nossas vantagens competitivas, pela desvalorização do real e a necessidade crescente de alimentos e matérias-primas em escala mundial. A China, nosso principal comprador, antecipou o crescimento.

A globalização tende a sofrer uma espécie de lockdown e não sei o que virá no lugar. Mas temo um nacionalismo-populismo exagerado e a volta de políticas de reserva de mercado e movimentos contra privatizações. O fato é que precisaremos de uma maior participação de investimentos públicos e privados nos programas de expansão da infraestrutura, em particular em países com grande déficit social.

Nos últimos anos o Brasil tem destinado uma pequena parcela do seu PIB para investimentos de infraestrutura. Isso levou à redução do nosso nível de estoque de infraestrutura (somatório de todos os ativos de infraestrutura sobre o PIB) ao patamar de 36%. Esse patamar de estoque, que pode se refletir em aumentos de produtividade e competitividade do País, é menos que a metade do observado em países desenvolvidos como EUA e Alemanha.

O Projeto Infra2038, associação em prol do desenvolvimento da infraestrutura brasileira, destaca que, para o Brasil chegar ao nível de 77% de estoque de infraestrutura, será necessário um investimento de R$ 8,7 trilhões em energia, saneamento, telecom e logística. Se tivessem ocorrido investimentos de R$ 70 bilhões em 2019, o número de novos empregos poderia ter chegado a 1,6 milhão. Com R$ 200 bilhões de investimento, a geração de empregos poderia ter sido da ordem de 4,7 milhões.

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Para atingirmos esses números gigantescos, só com um novo modelo de país, de financiamento e novos marcos regulatórios que permitam investimentos públicos e privados inteligentes. Essa deveria ser a escolha. Sem dogmas e preconceitos. Como nos diz Pablo Neruda, “você é livre para fazer as suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências”. 

*DIRETOR DO CENTRO BRASILEIRO DE INFRAESTRUTURA (CBIE)

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