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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|A fraqueza desse PIB

Não surpreendeu, mas também não deixou de decepcionar

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Atualização:

Se não chegou a surpreender, esse Produto Interno Bruto (PIB) também não deixou de decepcionar.

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Um avanço de 1,1% em 2019 (sobre 2018) e de 0,5% no quarto trimestre (sobre o terceiro) foi o que a maioria dos analistas já vinha cantando.

As previsões iniciais de um crescimento de pelo menos 2,8% em 2019 se frustraram em consequência de três fatores: a crise da Argentina; os desdobramentos da guerra comercial entre Estados Unidos e China, que estreitaram o mercado de exportações e derrubaram os preços das commodities, das quais o Brasil é grande fornecedor global; e a tragédia de Brumadinho, que achatou a produção da indústria extrativa. Só esses três fatores devem ter comido cerca de 1% do PIB em 2019.

Mas isso é como trombada de carro em barranco provocada por um cachorro que atravessava a estrada. As verdadeiras causas são outras: é desatenção e imperícia do condutor do veículo e, talvez, freios sem manutenção. Dá para conferir, também, que o Brasil só consegue bons resultados no seu sistema produtivo quando tudo vai bem no resto do mundo e quando não sobrevêm desastres naturais.

Há anos, a economia brasileira vem patinando em consequência de sua reduzida poupança e baixíssimo investimento. Quem come as sementes não semeia e também não colhe. Para crescer pouco mais de 3% ao ano, o investimento (Formação Bruta de Capital Fixo) teria de ser da ordem de 22% do PIB. No ano passado, ficou nos 15,4% e, em 2018, em 15,2% do PIB, como está no gráfico ao pé desta Coluna. Ninguém esperava a piora do ritmo do investimento no quarto trimestre de 2019 de 3,9% para 2,2%.

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A poupança nacional também é a precariedade já conhecida. Não passou de 12,2% do PIB, abaixo dos 12,4% registrados no ano anterior. E não se diga que baixo nível de poupança é sina de país pobre, que vive da mão para a boca, como tanto se ouve por aí. O padrão asiático de países ainda pobres é poupança de 30% a 35% do PIB. A China vai muito além, poupa em torno de 50% da renda. Ou seja, o chinês, de quem tanto se diz que é mal remunerado, consegue poupar metade do seu salário. E ainda tem de sustentar seus idosos, porque o país não tem sistema previdenciário público. No ano passado, o Brasil apresentou poupança de apenas 12,2%.

O Brasil é um país economicamente desarrumado. Enfrenta custos altos demais de produção; uma infraestrutura sucatada ou não existente; um sistema tributário caótico; por falta de acordos comerciais, não conta com acesso a mercados; tem péssima distribuição de renda, grande parte dela apropriada por corporações que só pensam no seu interesse... E a lista é enorme.

Essa ficha é a razão da insistência na necessidade de reformas e na modernização das relações de trabalho.

Isso posto, convém perguntar sobre o que esperar para este 2020, que também começa capenga em relação ao que dele se esperava. O avanço de 1,1% no PIB em 2019 sugere que a força de arrasto (carry-over) para este ano é de alguma coisa entre 0,6% e 0,8%. Portanto, há um certo embalo com que se pode contar. Outras condições técnicas também ajudam: inflação e juros baixos, melhor controle das finanças públicas, abundância de crédito, agronegócio e setor do petróleo no auge de sua forma e mais torque no consumo das famílias.

Mas as incertezas continuam elevadas. Há esse surto de coronavírus, de consequências imprevisíveis, que estancou a segunda locomotiva do mundo. E tem a política interna, que às vezes empaca e outras, descarrila, sempre a pôr em risco o sistema de tomada de decisões. Os últimos levantamentos feitos no mercado pelo Boletim Focus, do Banco Central, projetam avanço do PIB em 2020 de 2,17%, mas o estrago produzido pelo coronavírus na economia mundial já levou grande número de instituições a corrigir suas estimativas mais otimistas para alguma coisa abaixo de 2%. Dentro de quatro ou cinco semanas será possível ter uma ideia melhor do que esperar.

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PIB 2020 Foto: Fabio Motta/Estadão, Brazilian Sugar Kane Association NYT e Tasso Marcelo/AE
Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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