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A ilusão do corte no orçamento

Por Ribamar Oliveira
Atualização:

O anunciado corte de R$ 21,6 bilhões que o governo vai fazer nas despesas do Orçamento da União pode passar a ideia para a sociedade de que teremos, este ano, uma forte contenção dos gastos públicos. Nada mais errado. Mesmo com a expressiva queda das receitas em 2009, estimada pelo próprio governo em R$ 48,3 bilhões, as despesas da União serão maiores do que em 2008 - que já foi um ano de excepcional gasto. Cortou-se apenas a projeção de aumento dos gastos para este ano. As despesas vão aumentar, este ano, em proporção do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Ministério do Planejamento. No ano passado, o gasto efetivo da União foi de R$ 518,7 bilhões, o que correspondeu a 17,95% do PIB. Para este ano, o governo projeta despesas totais de R$ 578,8 bilhões (já considerado o corte de R$ 21,6 bilhões), o equivalente a 18,72% do PIB projetado para este ano - 0,77% do PIB a mais. É importante repetir: o gasto do governo federal em 2009 será R$ 60,1 bilhões maior (R$ 578,8 bilhões menos R$ 518,7 bilhões), em termos nominais, do que aquele registrado em 2008. Como a receita cairá muito este ano, o governo federal decidiu reduzir o seu superávit primário (economia feita para pagar parte dos juros das dívidas públicas) em 0,5% do PIB e, com isso, fechar suas contas. O superávit passará de 2,15% do PIB para 1,65% do PIB. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) permite que o governo desconte os gastos com o Projeto Piloto de Investimento (PPI) de sua meta fiscal. O limite para o desconto é de R$ 15,6 bilhões, o que equivale a 0,5% do PIB. A LDO permite também que o governo desconte os restos a pagar do PPI de anos anteriores, mas o governo preferiu não lançar mão deste recurso, ainda. Os restos a pagar referentes apenas a 2008 somam R$ 9,1 bilhões, o equivalente a 0,3% do PIB. A redução do superávit não foi feita para garantir uma elevação dos investimentos deste ano, como imaginam alguns, dentro de uma política fiscal anticíclica. Mas para cobrir o aumento de despesas de custeio, principalmente com o pagamento de salários dos servidores e com os benefícios previdenciários e assistenciais. Os investimentos do governo federal vão subir pouco este ano, se é que subirão. No ano passado, os investimentos ficaram em torno de 1% do PIB e, este ano, se a máquina administrativa conseguir ser mais eficiente do que foi até agora, eles poderão subir para 1,1% do PIB ou 1,2% do PIB, na melhor das hipóteses. Ou seja, do aumento de gasto de 0,77% do PIB projetado para este ano, somente 0,2% do PIB poderá ser atribuído aos investimentos. O restante (0,57% do PIB) corresponderá às despesas de custeio. A reprogramação do Orçamento de 2009, divulgada na semana passada pelo Ministério do Planejamento, manteve a despesa decorrente dos generosos reajustes salariais, concedidos no ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos servidores. Se a receita prevista para este ano se deteriorar mais ainda, o governo anuncia que poderá adiar a parcela do reajuste programada para 2009. Na reprogramação divulgada, a despesa com pessoal ficou em R$ 153,8 bilhões contra R$ 132,4 bilhões no ano passado - um aumento de 16,2% ou de R$ 21,4 bilhões. As despesas com pessoal passarão de 4,48% do PIB para 4,98% do PIB, atingindo o maior porcentual do governo Lula. Por causa principalmente do aumento de 12% concedido ao salário mínimo em abril último, as despesas previdenciárias subirão de R$ 199,6 bilhões no ano passado para R$ 221 bilhões este ano - uma elevação nominal de R$ 21,4 bilhões. O aumento das despesas da Previdência só não será maior este ano porque o governo reduziu a sua própria previsão para o fluxo de concessão de benefícios em R$ 7 bilhões, o que está sendo questionado na área técnica. As despesas com o abono salarial, com o seguro desemprego, com a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e com a renda mensal vitalícia - que sofrem o impacto direto do aumento do salário mínimo - subirão de R$ 36,4 bilhões em 2008 para R$ 42,9 bilhões este ano, o que representa uma elevação de 17,8% ou R$ 6,5 bilhões. Do aumento de R$ 60,1 bilhões nas despesas do governo federal este ano, R$ 49,3 bilhões serão com a assistência social e a Previdência e com os salários dos servidores. O Orçamento da União de 2009 não é, propriamente, um modelo de orçamento anticíclico, pois as despesas de custeio são as que mais crescem. A situação fiscal poderá piorar, pois a previsão de receita do governo para 2009 foi elaborada com base num crescimento da economia de 2%, o que é considerado pelo mercado como muito pouco provável. O BC terá de se virar A projeção feita pelo Comitê de Política Monetária (Copom) para a inflação este ano leva em consideração um superávit primário do setor público de 3,8% do PIB, segundo informa a ata de sua última reunião, divulgada na semana passada. Depois que o governo decidiu reduzir a sua meta de superávit em 0,5% do PIB, o Banco Central terá de rodar novamente os seus modelos para definir a trajetória da taxa de juro. Com menor superávit, ou seja, com maior expansão dos gastos federais, será difícil para o Copom manter uma redução agressiva da taxa de juro.

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