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A incrível carga fiscal das telecomunicações

Por Ethevaldo Siqueira e esiqueira@telequest.com.br
Atualização:

Se o leitor tem alguma esperança ou ilusão nas perspectivas da reforma tributária, em discussão no Congresso, sugiro que reflita sobre os fatos que relato a seguir. O Fisco brasileiro retira anualmente quase R$ 40 bilhões de nossos bolsos, sob o título de ICMS, PIS, Cofins e outros tributos incidentes apenas sobre serviços de telecomunicações. Sim, apenas sobre telecomunicações. Além desses tributos pagos por todos nós, usuários, as empresas operadoras recolhem anualmente cerca de R$ 3,6 bilhões para três fundos setoriais, assim distribuídos: R$ 800 milhões para o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), R$ 300 milhões para o Fundo de Tecnologia de Telecomunicações (Funttel) e R$ 2,5 bilhões para o Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), embora só 20% desse total se destinem ao orçamento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Em resumo: do total de R$ 3,5 bilhões arrecadados nesses fundos, o governo federal só aplica efetivamente R$ 600 milhões no setor, via Anatel. Os R$ 3 bilhões restantes são puramente confiscados. É provável que a grande maioria dos brasileiros minimamente escolarizados reconheça a importância das telecomunicações no processo de modernização da economia do País, bem como no aumento da produtividade, na elevação da qualidade de vida, na geração de negócios, na circulação de notícias e na inclusão digital. Com uma visão bem diferente do papel das telecomunicações, os governos oneram seus serviços com a mesma carga fiscal aplicada a bebidas alcoólicas, perfumes, carros importados ou iates de luxo. Verifique em sua conta telefônica, leitor: nela, os tributos equivalem a mais de 40% do valor dos serviços. Em resumo, o Brasil é o país campeão mundial na tributação das telecomunicações, com o dobro do porcentual do segundo colocado. Para o Estado brasileiro, as telecomunicações não passam de uma fonte de arrecadação sem limites, que, depois de sua privatização, em 1998, recolheram mais de R$ 250 bilhões de impostos e taxas. Além desses recursos, as empresas operadoras recolheram ao Tesouro Nacional o total de R$ 15 bilhões em nome de três fundos setoriais, desde 2001. O Fust acumula hoje o montante de R$ 6 bilhões desde a sua criação, sem ter tido uma única aplicação na universalização dos serviços. O Funttel não investe nem um terço de seu total em pesquisa tecnológica. A cada ano, o Tesouro embolsa 80% do Fistel - ou quatro orçamentos anuais da Anatel. DESINFORMADOS Fiquei desencantado depois de conversa informal com uma dúzia de deputados e senadores, ao perceber que a maioria deles não tinha a menor idéia do problema tributário das telecomunicações. Pior: muitos deles ignoram até que pagam elevados impostos em suas contas telefônicas. Que esperar, então, de um Congresso tão desinformado? Mais grave é a inconsciência do cidadão brasileiro, que, quase sempre, ignora seus direitos, como contribuinte, porque não percebe, de forma clara, o quanto paga de impostos, seja na conta telefônica ou no preço da gasolina, do transporte, do leite ou do remédio. Seria hora de publicar, com destaque, nas notas fiscais de todos os produtos ou nas contas de serviços a parcela de impostos ali embutidos? MALÍCIA O problema começa com o método malicioso e desonesto chamado de cálculo "por dentro" - de aplicação das alíquotas no cálculo de impostos, criado exatamente para esconder o tributo. O golpe é o seguinte, leitor. Tomemos o exemplo de uma conta telefônica imaginária em que o valor dos serviços tenha sido de R$ 75 e o único tributo a ser cobrado seja o ICMS, com a alíquota de 25%. Num critério honesto, matemático, "por fora", o consumidor pagaria os R$ 75 acrescidos de R$ 18,75 (25% de R$ 75), perfazendo o total de R$ 93,75. Mas o Fisco calcula diferente, caro leitor. No critério "por dentro", o valor do tributo será de 25% sobre o total da conta, incluindo o próprio imposto. Veja o golpe: o valor total da conta vai para R$ 100 e o valor do ICMS será, então, de 25% sobre R$ 100, ou seja, R$ 25. Pelo critério "por dentro" pagaremos, assim, R$ 6,25 a mais. E, em lugar de 25% sobre o valor dos serviços, estaremos pagando 33,3% (R$ 25 sobre serviços de R$ 75). Tudo indica que a nova reforma tributária manterá esse método de cálculo que contraria a própria matemática. A VACA LEITEIRA Nos 10 anos que decorreram após da privatização das telecomunicações, a base instalada de telefones no Brasil saltou de 24,5 milhões para mais de 180 milhões, entre fixos e móveis. Com esse crescimento explosivo, o volume arrecadado de ICMS sobre as telecomunicações cresceu, no mínimo, 600% em relação a 1998. O mais justo seria baixar as alíquotas do ICMS - sem nenhum prejuízo para Estados e municípios -, estimulando a inclusão digital, tão decantada por todos os governos. Mas as coisas não vão ficar assim. Vão piorar muito, se for aprovado o substitutivo da reforma fiscal do deputado Sandro Mabel (PR-GO). Aí, então, um ministro vai gritar: "As tarifas telefônicas estão muito elevadas."

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