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A inflação e a estratégia para 2010

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Por Rolf Kuntz
Atualização:

O governo dará um passo importante para a campanha eleitoral de 2010 ainda este mês, quando o Conselho Monetário Nacional (CMN) definir a meta de inflação para aquele ano. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aprendeu a importância política dos preços estáveis. Sua reeleição, em 2006, é explicável em grande parte pelo sucesso da política antiinflacionária. Com a inflação contida, o poder de compra dos salários cresceu e os trabalhadores puderam elevar seu padrão de consumo. Numa situação menos favorável, os programas sociais teriam sido muito menos eficazes: o dinheiro transferido aos pobres pouco teria servido para aliviar suas dificuldades. O presidente poderá ajudar seu candidato mais facilmente se essas condições forem repetidas. Neste momento, as pressões inflacionárias criam riscos para o cenário político de 2010. Se não houvesse outros, este seria um motivo suficiente para agir desde já. O CMN escolheu para 2009 o mesmo objetivo fixado para este ano, uma inflação de 4,5%. Dificilmente elegerá para 2010 um alvo menos ambicioso. Seria uma tolice transmitir aos mercados a idéia de uma política mais frouxa, mais conformista diante das pressões inflacionárias. Isso afetaria não só as expectativas do mercado financeiro, mas também as de empresários e trabalhadores. Mas a escolha de um alvo para 2010 é apenas uma pequena parte da tarefa. O primeiro desafio é enfrentar as pressões imediatas. Os indicadores continuam piorando, a cada semana, e até as projeções do mercado financeiro começam a parecer otimistas. Os números divulgados ontem pela Fundação Getúlio Vargas confirmam a intensificação das pressões. O último IGP-10, pesquisado entre 11 de maio e 10 de junho, subiu 1,88% nesse período e 12,14% em 12 meses. O Índice de Preços por Atacado (IPA), seu componente de maior peso, aumentou 2,22% nas quatro semanas e 15,36% em 12 meses. Para os preços ao consumidor, as variações verificadas foram, respectivamente, 0,87% e 5,59%. O repasse do atacado para o varejo continua aumentando. A inflação dos alimentos ainda é a mais grave, mas a onda de remarcações tende a espalhar-se. Isto é visível em todas as pesquisas. O IPCA, calculado pelo IBGE e usado como referência para a política de metas, confirma essa tendência. Em maio, houve aumento em 71,3% de seus itens. O presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, chamou a atenção para esse dado, nesta semana, ao justificar a política de juros. Nesta altura, o ponto central visado este ano pelo BC, 4,5%, parece irremediavelmente perdido. As últimas estimativas do mercado financeiro apontam para uma inflação de 5,8% acumulada no fim do ano. Mas até essa projeção pode ser superada pelos fatos, se as pressões dos preços por atacado continuarem chegando ao varejo como nos últimos meses. Por enquanto, os canais de repasse permanecem abertos. Há sinais esparsos de retraimento do consumidor, principalmente em conseqüência da elevação dos preços dos alimentos, mas, de modo geral, o comércio varejista continua vigoroso, como indica o IBGE. Parte da inflação de 2009 está sendo fabricada em 2008. O mercado financeiro projeta para este ano uma elevação de 10% do IGP-M. Esse número servirá, no próximo ano, como base para o reajuste de vários contratos. A evolução dos IGPs , diferenciados apenas pelo período de cada pesquisa, justifica o temor de um resultado pior que aquele. O IGP-10 subiu 6,05% até junho e 12,14% em 12 meses e não há sinal de arrefecimento. A boa produção de grãos e oleaginosas, no Brasil, apenas servirá, na melhor hipótese, para impedir um agravamento do quadro neste e no próximo ano. Inundações em grandes áreas produtoras nos Estados Unidos fortalecem a expectativa de novas pressões de alta. A maioria dos bancos centrais tende a promover um maior aperto monetário para enfrentar a inflação em alta. O brasileiro já escolheu esse caminho. O principal desafio, agora, é limitar a difusão dos aumentos, isto é, o contágio inflacionário. Não há como fazê-lo sem restringir a demanda. Se o presidente Lula aceitar esse dado, mandará o Ministério da Fazenda promover seriamente, pela primeira vez, uma séria contenção de gastos. Se o fizer, poderá garantir um bom resultado para 2009 e, por tabela, para 2010, sem comprometer o crescimento econômico mais do que o estritamente necessário. *Rolf Kuntz é jornalista

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