PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Jornalista e comentarista de economia

Opinião|A inflação estatística e os preços do supermercado

Sobra a sensação para o consumidor de que as despesas da feira e do supermercado aumentaram muito mais do que dizem os números oficiais

Foto do author Celso Ming
Atualização:

Os números oficiais da inflação e do desemprego refletem a situação real ou, por conta desta crise, vêm sofrendo alguma distorção? A pergunta não é tão descabida porque se espalha a percepção de que o buraco é mais embaixo do que dizem as frias estatísticas.

PUBLICIDADE

Em outras oportunidades esta Coluna já mencionou que a pandemia mudou muito as coisas. A cesta de consumo do brasileiro, especialmente a das classes médias, mudou porque houve o distanciamento social, houve o home office, as encomendas por delivery, mais despesas com computador, internet e energia elétrica dentro de casa. Em compensação, viagens, despesas com condução ou combustíveis caíram substancialmente, compras de roupas e despesas com serviços pessoais foram adiadas e tal.

Foi um tempo em que a estrutura de consumo para fins estatísticos praticamente não mudou. Os técnicos dos institutos de pesquisa trabalharam com a mesma cesta média de consumo. As despesas com serviços pessoais e de saúde continuaram pesando 13,1% no orçamento, segundo os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de junho, embora na prática tenham mudado. Para que possa mudar a cesta de consumo, os institutos têm de fazer complicados e prolongados levantamentos que, depois de certo tempo, ajudam a avaliar quais itens estão sendo mais ou menos consumidos. É preciso admitir a existência de certas distorções que, no curto prazo, não conseguem ser medidas.

Saindo do quadro puramente estatístico, aumentou a percepção do consumidor de que o impacto sobre o orçamento ficou mais forte do que o espelhado pelos números oficiais. Foi influenciado pela alta do dólar, reajustes dos combustíveis, correção dos aluguéis pelo IGP-M e pelo aumento dos preços dos alimentos, que se seguiu à alta das commodities. Nessa hora, o consumidor não tem condições de fazer uma contabilidade mais precisa sobre o que perdeu e o que ganhou no custo de vida. Sobrou a sensação de que as despesas da feira e do supermercado aumentaram muito mais do que dizem os números.

Neste ano, a partir de maio, com o efeito vacina e outras novidades, as coisas se inverteram. Os combustíveis subiram ainda mais, a bandeira vermelha da conta de luz aumentou a pressão, o setor de serviços, que andava encolhido, passou a reajustar seus preços e os alimentos agora enfrentam os efeitos da seca.

Publicidade

Na área do emprego, a questão parece mais de entendimento das mudanças. O brasileiro médio ainda não percebeu que estamos diante de uma revolução das relações de trabalho. Muitos analistas continuam achando que o único emprego que presta é o da indústria, desconsiderando que quase 75% da economia está no setor de serviços. Além disso, as novas tecnologias e os aplicativos estão lançando cada vez mais força de trabalho nas ocupações autônomas, que muita gente insiste em dizer que não passam de trabalho informal, disfarçado ou não.

Especialistas estimamuma inflação média de 10% para as proteínas em 2021, bem acima dos 5,9% que o Banco Central projeta para a inflação oficial do País (IPCA).Foto: Wilton Junior/ Estadão- RJ - 02/06/2021 Foto:

São, é verdade, atividades que ignoram tanto a proteção ao trabalho quanto a contribuição previdenciária mínima. Mas se o mercado está se encaminhando para nova estrutura de ocupação, então é preciso recalibrar não só a estrutura de direitos e de defesa desses profissionais, mas, também, medir e qualificar melhor as mudanças em curso.

CONFIRA

» Maior consumo de energia Relatório da Agência Internacional de Energia (AIE) publicado nesta quinta-feira mostrou que, depois de cair 1%, em consequência da pandemia, o consumo global de energia elétrica deve crescer quase 5% neste ano e outros 4% em 2022.

» Energia limpa não dá conta O aumento da produção de energia elétrica por meio de fontes limpas, como a solar e a eólica, não consegue acompanhar o aumento da demanda. Deve aumentar 8% neste ano e 6% em 2022.

Publicidade

 » A força dos derivados Em consequência desse descompasso, a eletricidade gerada por derivados de petróleo deve cobrir 45% do aumento do consumo de energia em 2021 e 40% do consumo de 2022. A maior parte do aumento do consumo de energia elétrica no mundo acontece na China. A Índia, que é o terceiro maior consumidor mundial, acabará abocanhando 9% do aumento do consumo global. Por conta disso, a previsão é de que as emissões de dióxido de carbono (CO2) do setor elétrico cresçam 3,5% em 2021 e 2,5% em 2022.

*CELSO MING É COMENTARISTA DE ECONOMIA. 

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.