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A palavra maldita

Foto do author Celso Ming
Por Celso Ming e celso.ming@grupoestado.com.br
Atualização:

Os mercados tiveram uma convulsão segunda-feira quando ouviram a palavra maldita: estagflação. E foi logo o ex-presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), o ainda prestigiado Alan Greenspan, o primeiro a pronunciá-la nas atuais circunstâncias. Estagflação foi um termo cunhado nos anos 70 para definir a ocorrência simultânea de estagnação econômica e inflação. Foi quando, à frente do Fed, o economista Paul Volcker colocou em marcha o maior arrocho dos juros da história recente da economia americana. Os Fed Funds (juros básicos) chegaram a ultrapassar os 20% ao ano (hoje, estão nos 4,25%). É a lembrança traumática desses tempos que parece ter levado o mercado a temer pelo pior. A ocorrência de estagflação é um problema sério para qualquer banco central, que tem à sua disposição apenas uma arma: a execução da política monetária (política de juros). Estagnação se combate com redução dos juros para que o consumo e a atividade econômica se recuperem. E inflação se combate com aumento dos juros. Como não é possível abrir a boca e mantê-la fechada ao mesmo tempo, o banco central de uma economia em estagflação tem de escolher o alvo prioritário a atacar e isso significa deixar o outro para depois. Tirar a economia da estagnação significaria deixar solta a inflação; atacar a inflação implica aprofundar a estagnação. Para complicar as coisas, há uma séria crise em curso no mercado financeiro dos Estados Unidos, a das hipotecas de alto risco (subprime). Se é para dar prioridade à dissolução da crise, o Fed precisa continuar a derrubada dos juros. Mas isso não só deixaria a inflação à solta. Contribuiria para aprofundar a desvalorização do dólar nos mercados de câmbio, o que também se pretende reverter. A primeira resposta do mercado financeiro à advertência de Greenspan foi reativa. Foi bater nas ações. Por trás dessa resposta está o pressuposto de que, uma vez confirmada a estagflação, o Fed optará por puxar os juros para cima para combater a inflação e, quando isso acontece, as aplicações financeiras correm para os títulos do Tesouro para aproveitar os juros mais generosos. Mas talvez o Fed faça o contrário, especialmente se a crise piorar e exigir o bombeiro de volta. Se isso se confirmar, a manada partirá em direção ao mercado de risco (ações, commodities, moedas, ouro, etc.) porque a inflação se encarregará de derreter o rendimento proporcionado pelos títulos de renda fixa. Em todo o caso, não há clareza no diagnóstico. A tal estagflação pode não se confirmar. O próprio Greenspan admitiu que "é extraordinariamente difícil definir se o risco de recessão na economia americana está acima ou abaixo de 50%". E, se acontecer, a recessão talvez não seja tão destrutiva como, num primeiro momento, pareceu aos mais apavorados. De mais a mais, os Estados Unidos já não são a única locomotiva do mundo. O bom desempenho econômico dos emergentes pode compensar, pelo menos em parte, a má fase americana. A conferir. Entenda A teoria econômica clássica ignora o conceito de estagflação. Para ela, o desemprego criado pela estagnação derruba o consumo e os preços. Para o economista canadense John Galbraith a contradição é só aparente. A estagflação só ocorre quando prevalecem os oligopólios. A falta de concorrência deixa as grandes empresas à vontade para cobrar os preços que bem entendem, mesmo quando o consumo cai. O problema é que, estejamos ou não à mercê dos oligopólios, nos últimos dez anos a economia global teve a inflação mais baixa da história recente.

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