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A primeira bola de couro vegetal

Fabricante de Magda (SP) faz parceria com comunidade seringueiras para lançar o produto em 2010

Por Chico Siqueira e de O Estado de S. Paulo
Atualização:

Após sete anos de pesquisas e testes de qualidade, a Ecológica Laminado Vegetal do Brasil, de Magda (SP), tornou-se a primeira empresa do País a produzir, em escala industrial, o chamado tecido ou couro vegetal. Obtido do látex da seringueira, o couro vegetal substitui satisfatoriamente o couro animal e os tecidos sintéticos obtidos a partir de subprodutos de petróleo.

 

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Outra vantagem do couro vegetal é que sua produção contribui para preservar as matas de seringais da Região Norte, fixando, assim, o homem no campo. Estofados de carros e sofás, calçados, roupas e até bolas de futebol, todos fabricadas com couro animal e tecidos sintéticos de PVC (Policloreto) e PU (Poliuretano), altamente poluentes, já estão sendo fabricados com o tecido vegetal, inteiramente natural e reciclável.

 

Já está previsto até o lançamento, para o início de 2010, da primeira bola ecológica do mundo, que será costurada por comunidades de seringueiros de Rondônia, Acre e Amazônia, a partir do couro vegetal produzido pela Ecológica, em Magda. O látex a ser usado na confecção da câmara de ar e do couro vegetal das bolas também sairá do Norte, da comunidade da Reserva de Maracatiara, em Machadinho D’Oeste (RO), que hoje enfrenta o êxodo dos seringueiros por falta de preços e assistência.

 

"A nossa intenção é propiciar uma geração de renda e permitir que a população rural possa sobreviver dos seringais e assim preservar as matas", diz um dos sócios da Ecológica, Jaime Marques Rodrigues. Segundo ele, além de comprar látex do Norte, a empresa também comprará de São Paulo, Estado responsável por 60% da produção nacional de látex.

 

Para chegar ao couro vegetal, a Ecológica precisou de sete anos até conseguir encontrar a fórmula para que o tecido vegetal pudesse ser fabricado em linha de produção e ter um padrão de qualidade para ser colocado no mercado sem traumas.

 

Há décadas seringueiros, técnicos e pesquisadores tentavam chegar a este avanço tecnológico, mas nunca conseguiram ultrapassar a maneira artesanal como as comunidades de Rondônia e do Acre transformam até hoje o látex em couro vegetal, com fornos, cuja fumaça prejudica a saúde, e estufas ainda insuficientes para atender à demanda industrial.

 

Na década de 1990, alguns empreendedores chegaram a comercializar, no exterior, bolsas de couro vegetal, mas elas se estragaram rapidamente e eles tiveram de devolver dinheiro aos consumidores europeus. "As bolsas soltavam líquidos, devido à falta de estabilidade molecular da borracha. Sempre em movimento, essas moléculas apresentam transformação. Somente depois de cinco anos de muitos estudos e testes em institutos de pesquisas e universidades conseguimos chegar à estabilização e a um produto com o padrão de qualidade exigido pelos institutos oficiais que regulamentam o mercado", conta Rodrigues.

 

CAUSA COMUM

 

A luta da Ecológica para transformar o látex em tecido começou com uma causa em comum e com o sonho do seringueiro Antônio Higino Ferreira, hoje com 84 anos, um dos pioneiros no cultivo de seringueira em São Paulo. "Na década de 1980, meu pai contou que alguém fazia isso no Norte do País, que seria o sonho dele e a nossa saída para tornar viável a extração. Naquela época, porém, não tínhamos recursos para ir atrás da tecnologia", conta outro sócio da empresa e filho de Antônio, Tony Regis Ferreira, 29 anos. Ele herdou do pai 30 hectares de seringais em Magda.

 

Analista de sistemas, Tony viajou em 2002 a Manaus para prestar serviços na CCE, mas ao chegar ao portão da fábrica, lembrou do sonho do pai e decidiu ir atrás das comunidades de seringueiros. Largou o emprego e por 60 dias viajou de barco, visitando comunidades no Amazonas e no Acre, mas foi em Machadinho D’Oeste, a 324 quilômetros de Porto Velho (RO), que contatou um seringueiro que sabia instalar um forno e fabricar couro vegetal. Levou, então, o seringueiro para Magda e iniciou a produção.

 

"Os seringueiros do Norte tinham o mesmo problema do meu pai: faltavam recursos para fazer da extração de látex uma atividade rentável. Tanto lá no Norte, como aqui em São Paulo, os seringueiros não conseguem, até hoje, preço decente para o látex e vivem nas mãos das usinas de transformação", diz Tony. "A saída seria agregar valor." Mas foi somente em 2005, ao encontrar o advogado Jaime Rodrigues - do qual se tornou sócio - que Tony conseguiu fazer com que a Ecológica obtivesse financiamentos de um investidor particular para criar equipamentos específicos (como calandras, gravadores de estampas, fornos elétricos e reatores) e instalar a indústria.

 

A partir daí, a empresa iniciou estudos e testes até encontrar a forma ideal para colocar o produto no mercado. "Transportamos o modo artesanal para a indústria, mas foram precisos investimentos de R$ 5 milhões; R$ 3,5 milhões de 2006 para cá", diz Rodrigues. O faturamento bruto é de R$ 2 milhões, mas não há expectativa de retorno. "Ainda estamos no prejuízo, mas é só começo", acrescenta.

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