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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|A reforma da Previdência toma forma

O resultado geral da reforma até aqui é promissor, com algumas desidratações esperadas e outras não

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Atualização:

Com algumas desidratações esperadas e outras não, o projeto de reforma da Previdência avançou nesta quinta-feira e foi apresentado pelo relator da Comissão Especial da Câmara, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP). Aqui vão avaliações gerais. 

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Se o projeto for aprovado como está, pelos cálculos do relator, a economia a ser obtida em dez anos será de R$ 913,4 bilhões em dez anos. Para quem esperava uma queda maior em relação aos objetivos iniciais do ministro da Economia, Paulo Guedes, esses R$ 913,4 bilhões não constituem estrago relevante.

A novidade mais importante é a de que, apesar do apoio fragmentado e mal administrado pelo governo, o consenso mínimo a favor da aprovação do projeto parece obtido. Muita lenha ainda pode ser queimada nas fases seguintes, mas fica reforçada a convicção de que a reforma acabará saindo com alguma substância. A lenga-lenga de que a Previdência não é problema e que tudo não passa de jogo dos neoliberais, que alguns partidos da oposição vinham martelando, já não cola. Há suficiente percepção no eleitorado brasileiro de que o atual sistema de aposentadorias corre sério risco de desabamento. Ninguém pense que esse risco desaparecerá com a reforma porque esse passo, se for realmente dado, será apenas o primeiro da longa caminhada necessária para saneamento do sistema.

A adoção do regime de capitalização para os que vierem a ingressar no mercado de trabalho a partir de data a ser estabelecida ficou de fora do projeto. Este é o sistema em que o trabalhador não contribui mais para o INSS, mas para uma conta pessoal cujos recursos são aplicados no mercado financeiro. A aposentadoria dependeria do saldo que houvesse nessa conta. O sistema não enfrentaria mais déficit. A proposta original da adoção do sistema de capitalização apresentou lacunas. A principal é a de que em nenhum momento foi feita estimativa sobre o custo da transição. Aí é preciso uma explicação. A partir do início de vigência do sistema de capitalização, a contribuição do trabalhador não irá para o caixa comum e, com ele, para o pagamento dos benefícios dos que já estiverem aposentados. Portanto, será necessário prever e prover recursos que faltarem para essas despesas, o que pode não ser pouca coisa.

Outra lacuna é a falta de informação sobre a contribuição do empregador. O maior problema aí é o de que a relação de emprego tal como conhecida hoje é um animal em extinção. É muito provável que, daqui a poucos anos, mais de 50% da força de trabalho no Brasil corresponderá a ocupações desempenhadas por conta própria. Nessas condições, a contribuição do empregador ficará reduzida. Falta saber, também, o que acontecerá com aqueles que chegarem à idade de aposentadoria sem poupança significativa na sua conta, algo provável numa economia de baixa renda, como a do Brasil. Para atender a essa situação, a ideia é levar o Tesouro a bancar uma aposentadoria mínima, solução a que chegou recentemente o Chile. Mas, outra vez, faltam estimativas sobre quanto custaria isso.

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Mas não se pode ignorar a proposta do sistema de capitalização. O sistema atual, de repartição, perdeu prazo de validade e, mais cedo ou mais tarde, terá de ser abandonado. 

E há a situação dos Estados e municípios. A maioria dos governadores e prefeitos das grandes cidades está fazendo força para que o projeto inclua a reforma do sistema de aposentadorias dos servidores estaduais e municipais. Essa conta já é da hora da morte para muitos governadores e prefeitos, que não conseguem pagar em dia a aposentadoria dos seus servidores. E, do ponto de vista eleitoral, nada mais devastador para a reputação de um administrador público do que atrasos desse tipo.

Apresentação do relatório sobre a reforma da Previdência na Comissão Especial na Câmara Foto: Gabriela Biló/Estadão

No entanto, nem governadores nem prefeitos querem enfrentar o custo político das reformas em suas jurisdições porque teriam de lidar com corporações com alta capacidade de mobilização, contrárias à perda de parcela de seus benefícios. Entre elas estão professores, servidores das Polícias Civil e Militar e membros do Ministério Público.

Deputados federais e senadores, por sua vez, não querem assumir os custos políticos dessas reformas apenas para dar, de graça, conforto eleitoral para governadores e prefeitos. A matéria ficou de ser apresentada nas discussões nos plenários do Congresso na forma de emenda, à espera de que governadores e prefeitos saiam do bem-bom e se mobilizem eles próprios para convencer suas bancadas a fazer o que tem de ser feito.

Resumo do filme: o resultado geral da reforma até aqui é promissor.

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Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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