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A terceira fase da crise

Por José Roberto M. de Barros
Atualização:

O mundo está entrando na terceira fase da crise econômica, sem que as primeiras duas etapas tenham sido minimamente encaminhadas. Explico-me: a primeira etapa é a da crise dos bancos, que, como se sabe, mudou de patamar e generalizou-se após a quebra do banco Lehman Brothers. Hoje, poucos são os países em que o sistema bancário não apresenta problemas: dos relevantes na economia mundial, apenas Japão, China, Canadá, Brasil e, talvez, Índia. Por outro lado, nos Estados Unidos, na Inglaterra, na Islândia, na Rússia e em praticamente todos os países bálticos e da Europa Oriental a crise bancária é generalizada. No remanescente das nações relevantes, os problemas, mesmo não generalizados, são muito relevantes. Na verdade, ainda hoje aparecem novas dificuldades, como o envolvimento de bancos italianos, austríacos e suecos na debacle da Europa Oriental. Como principal consequência dessa situação, o sistema mundial de crédito permanece desde setembro de 2008 essencialmente paralisado, sem maiores perspectivas de destravar, uma vez que as soluções para a crise ainda hoje são embrionárias, como se vê no caso americano. A segunda fase da crise é consequência da parada súbita no crédito, que vem afetando pesadamente a atividade econômica. A demanda de consumo, exportações e investimento caiu em alta velocidade, implicando aparecimento de estoques não planejados, queima de produtos a preços de liquidação e desemprego. Setores que já apresentavam desequilíbrios fundamentais derretem de forma drástica, como são os casos dos setores automotivo e de etanol de milho americanos. A escassez de crédito derruba inclusive empresas mais sólidas, impondo grandes consolidações em muitas indústrias mundo afora. O resultado é que o mundo desenvolvido e boa parte do emergente vivem uma recessão cuja profundidade ainda não compreendemos. A última projeção do Fundo Monetário Internacional, de 0,5% de crescimento no PIB mundial, parece a essa altura muito otimista. Numa situação dessa natureza, países que já apresentavam maus fundamentos e crescimento econômico muito lento ou desequilibrado têm seu futuro posto em dúvida. No mundo rico, Japão e Itália são bons exemplos. Na América Latina, México, Venezuela e Argentina são os casos mais importantes. A terceira fase da crise decorre da falta de soluções à vista para as finanças e o crescimento. De fato, grande parte dos bancos centrais já reduziu os juros para próximo de zero e iniciou uma forte expansão monetária ("quantitative easing"), elevando a liquidez do sistema, que, entretanto, não vira crédito. Ao mesmo tempo, grandes programas fiscais estão em andamento, projetando robusta expansão da dívida pública. A estatização de bancos, como no caso inglês, troca o risco do sistema financeiro pelo risco do Tesouro, levando a uma desconfiança em relação à sustentabilidade da moeda e à queda da libra. As mesmas dúvidas a respeito do futuro rondam o dólar americano, até agora beneficiado pela busca da segurança. A procura de ouro se elevou e movimentos como os da China, negociando investimentos em produtores de minérios e petróleo na Austrália e no Brasil, sugerem alguma troca de reservas monetárias por ativos reais. Certamente, a última coisa de que precisávamos a esta altura é insegurança quanto ao valor relativo da moeda mais importante do mundo. A crise externa vai nos impor custos ainda mais altos do que os até agora percebidos. De um lado, as exportações de manufaturados sofrerão muito com a recessão e com o protecionismo de países como a Argentina, a Venezuela, etc. Por outro lado, a paralisia financeira externa vai continuar a congestionar o mercado de crédito em reais. Finalmente, os planos de investimento continuarão a ser adiados em grande proporção. É com base nesse quadro que a MB Associados estima em 1%, no máximo, o crescimento brasileiro para este ano. *José Roberto Mendonça de Barros é economista da MB Associados. E-mail: jrmb@uol.com.br O colunista Celso Ming está em férias.

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