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'Abrir a importação vai ser um tiro no pé', diz produtor de arroz

Para Marcelo Vitorino, governo tem de se preparar, 'porque ninguém mais vai produzir arroz' se ele começar a ser importado de outros países ou mesmo se Brasil aumentar o imposto sobre o produto

Foto do author José Maria Tomazela
Por José Maria Tomazela
Atualização:

SOROCABA - O rizicultor Marcelo Vitorino, do município de Turvo, interior de Santa Catarina, acha que o governo vai dar “um tiro no pé” se abrir a importação ou aumentar o imposto sobre o arroz brasileiro. 

Nas últimas semanas, o preço do pacote de cinco quilos subiu de R$ 15 para R$ 45 nos supermercados. “Está caro? Sim, mas o preço vinha defasado há dez anos e essa alta não dura muito. Se tira a alíquota de importação e aumenta imposto aqui dentro, o governo terá de se preparar para comprar arroz fora sempre, porque no Brasil ninguém mais vai produzir”, disse. 

'O governo vai descobrir que não tem arroz lá fora e o preço acabará subindo mais aqui', diz o rizicultor Francisco Ruzene. Foto: José F. Ruzene/Arquivo Pessoal

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Marcelo e seu irmão e sócio, Adelor Vitorino, são de uma família tradicional de produtores de arroz em Turvo, no extremo sul catarinense. No município, conhecido como “a capital do arroz”, eles cultivam 250 hectares do grão para abastecer o mercado e, também, fornecer semente para outros produtores. Na última safra, a produção foi de 170 sacas por hectare. Nesta quinta-feira, na região, a saca de 50 quilos de arroz em casca estava a R$ 115 para o agricultor. Depois de beneficiada, a saca rende até 35 quilos de arroz limpo.

Para ele, o problema do preço alto está no supermercado. “É só fazer as contas: o comerciante pega o arroz limpo a R$ 3,28 aqui e coloca na gôndola por R$ 9 o quilo. Acho que o governo deveria ir na prateleira, ver quanto o mercado está ganhando. O abuso está ali”, afirmou. Marcelo acredita que o período de preço alto será curto. “Na safra, entre março e abril, vendemos arroz a R$ 48 a saca, quando o preço ideal seria R$ 90. Como o plantio foi feito mais cedo este ano, em janeiro já vamos ter colheita. Em outras regiões, como no Paraná e no Centro-Oeste, já tem arrozal de 40 dias.”

Sem escassez

O produtor não vê risco de faltar arroz. “Muitos agricultores ainda têm produto para colocar no mercado, mas estão esperando o melhor momento para vender. São arrozeiros familiares que conhecem o negócio e sabem que é uma chance em dez anos para fazer uma reserva e trocar o maquinário que está defasado. Aliás, máquinas e insumos também subiram muito, mas disso ninguém fala.” Para o rizicultor paulista José Francisco Ruzene, o pico no preço do arroz também pode ser explicado pelo aumento nas exportações.

“No auge da safra no sul, em março, teve fila de navio no Porto de Rio Grande (RS) recolhendo arroz dos produtores para suprir a falta do produto lá fora, pois houve aumento de consumo puxado pela pandemia. Eles pagavam de R$ 3 a R$ 4 a mais por saca do que o preço local e ficavam esperando o navio encher.”

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Agricultor tradicional, com 150 hectares de arrozais próprios em Guaratinguetá, no Vale do Paraíba, Ruzene acredita que retirar a alíquota de importação será pior. “O governo vai descobrir que não tem arroz lá fora e o preço acabará subindo mais aqui. Além disso, o arroz que o País pode importar não é para o nosso paladar, não se compara ao nosso agulhinha.”

Tributos

Ele criticou a proposta de aumentar a carga fiscal sobre a produção agropecuária, incluída no projeto de reforma tributária que está no Congresso. “O governo precisa dar atenção para alguns segmentos das cadeias produtivas que estão ficando para trás. O produtor de arroz não conseguiu financiar a produção este ano. Ele está com o nome sujo, já sujou o nome da mãe, do filho e do irmão, então o banco não libera crédito. Muito produtor de arroz já migrou para o milho, a soja ou para o gado.”

O próprio Ruzene, que também produz arroz especiais com foco em nichos específicos de consumo, busca alternativas para manter a produção. Como prevê que o preço deve continuar em bom patamar no próximo ano, ele pretende ampliar o cultivo do agulhinha nas várzeas do Rio Paraíba do Sul. Preocupado com a situação dessa lavoura no País, Ruzene tem projeto para plantar uma área de 4 mil hectares de arrozais em Angola, país africano. “Ainda não avançamos como queríamos por causa da pandemia, mas já fizemos um campo experimental com bons resultados”, disse.