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Ações do BB ainda têm risco político

O governo vai vender nos próximos meses um lote relevante de ações do Banco do Brasil. A instituição tem hoje uma gestão mais profissional. Mesmo assim analistas ainda temem risco político do investimento.

Por Agencia Estado
Atualização:

O governo vai vender um lote grande de ações do Banco do Brasil entre os meses de setembro e outubro deste ano, em operação semelhante às das vendas de papéis da Vale do Rio Doce e da Petrobrás. Os analistas do mercado estão divididos em relação à recomendação do investimento. O risco de uso político do banco, como aconteceu no passado, deixa alguns analistas cautelosos. Outros preferem confiar que o banco vai manter uma gestão profissional e incrementar seu potencial de rentabilidade. As regras de venda destas ações do Banco do Brasil ainda não estão definidas. O governo deve lançar um edital com estas definições no começo de agosto. A idéia é vender todas as ações que ainda estão com o governo além do limite de 51%, necessários para manter o controle do banco. Segundo informações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), além da venda direta ao público, também serão ofertados fundos de investimento para os trabalhadores que quiserem destinar parte dos recursos de seu Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para a compra de ações. Risco de uso político é maior obstáculo O maior obstáculo para a recomendação de compra das ações do Banco do Brasil é o risco de uso político da instituição. Por ser uma instituição controlada pelo governo federal, situação que vai ser mantida mesmo depois desta nova oferta de ações, o banco fica sujeito a fazer operações que não tenham como objetivo o lucro da instituição. Na avaliação de Júlio Ziegelmann, da BankBoston Asset Management, o banco vai continuar sendo um instrumento de política do governo. "A instituição tem adotado medidas que reduziram os prejuízos do acionista, mas isso ainda não garante que seu objetivo seja o de garantir o maior ganho ao investidor. Prefiro investir em empresas que tenham como principal objetivo maximizar o ganho do acionista", diz. Na avaliação de Ziegelmann, mesmo quem planeja usar seu FGTS deve pensar com cuidado. Neste caso, lembra, a decisão é mais difícil porque a rentabilidade do FGTS é muito baixa (variação da Taxa Referencial mais juros de 3% ao ano). "Mesmo assim, não recomendaria ações do BB. Acredito que no futuro haverá outras colocações de ações para quem tenha recursos no FGTS de empresas que tenham outros fundamentos", completa. Este é o principal risco lembrado pelos analistas. Um segundo risco, bem mais difícil de medir, é a relação do banco com o fundo de pensão de seus funcionários (Previ). Um dos analistas ouvidos pela Agência Estado lembra que alguns investidores temem que o banco seja prejudicado no futuro pela necessidade de capitalizar o Previ. Este argumento, no entanto, lembra o analista, é mais especulativo do que concreto, uma vez que não existem números indicando esta necessidade no momento. BES Securities valoriza marca e base de clientes Alguns analistas, no entanto, mesmo reconhecendo o risco de uso político do banco, estão recomendando a compra das ações nesta futura colocação do governo federal. Naturalmente, esta recomendação pode mudar até a data efetiva da venda, uma vez que os preços destas ações já reagiram e o ganho potencial do investimento dependerá do preço de venda da ação. A marca do banco e sua base de clientes estão entre os principais fatores positivos, explica Horácio Piedra Júnior, analista do BES Securities do Brasil. Ele acredita que está prevalecendo na instituição uma gestão profissional, e que os abusos políticos do passado não devem se repetir. "O BB é líder no varejo e tem uma base importante de clientes junto aos funcionários públicos, que é um grupo de menor risco para crédito, em função de terem estabilidade no emprego e pagamento certo", diz Piedra Júnior. Ele ressalta que o banco paga dividendo médio da ordem de 35% do lucro, acima do mínimo de 25% exigido por lei. Para o analista, outros pontos pesam favoravelmente à recomendação das ações do BB, como a fatia de negócios bancários que a instituição controla, o fato de ter a maior área de gestão de recursos de terceiros, de seus ganhos com tarifas serem representativos em relação às receitas totais, e de sua área de informática ter passado por importante modernização. Ações ainda estão baratas, segundo Unibanco Conrado Vegner, analista do setor bancário do Unibanco, ressalta que hoje as operações de crédito do BB são aprovadas por um comitê, e não mais por uma pessoa. "Isso reduz o risco de uso político do banco", diz. Ele também avalia como sendo positivo o fato de o banco estar trocando todas as suas ações preferenciais, sem direito a voto, por papéis ordinários, com direito a voto. "Esta troca vai mudar a forma de atuação do banco, dando maior poder efetivo para os acionistas minoritários, uma vez que todos passarão a ter direito a voto." Segundo Vegner, as ações do BB ainda estão relativamente mais baratas que as de bancos privados justamente pelo risco de uso político da instituição. Um indicador que confirma esta avaliação é a relação do preço da ação em comparação com seu valor patrimonial. Os papéis do BB estão custando em torno de 90% do valor patrimonial, enquanto os do Bradesco custam 170% e os do Itaú, 215%. Ele lembra que o BB passou por uma importante reestruturação de seu processo de gestão em junho do ano passado, e que desde então sua rentabilidade melhorou. Crédito agrícola ainda preocupa A presença do BB na área de crédito agrícola ainda é uma preocupação, reconhecem os analistas, porque as taxas de juros neste segmento são menores que as obtidas nas operações com empresas e pessoas físicas. O governo eliminou parte do problema ao compensar o banco parcialmente pela diferença de juros cobrados nas operações de crédito agrícola. Mesmo assim, o juro recebido pelo BB nestas operações ainda é menor do que o recebido na média de outras operações, o que prejudica sua rentabilidade média. Piedra Júnior lembra que os empréstimos do banco para o setor agrícola estão equacionados desde o ano passado, quando o governo trocou esta dívida por títulos públicos. Por conta disso o BB está recebendo uma taxa de juro superior ao cobrado dos produtores, reduzindo suas perdas. "Ainda é um juro menor do que o que poderia ser recebido em outras operações, mas em compensação o banco mantém uma rede de relacionamento com clientes, incluindo os que são fornecedores ou compradores destes clientes do setor rural, o que também é um bom negócio." Papéis já subiram desde o ano passado A reestruturação da gestão do Banco do Brasil no ano passado e o anúncio da troca das ações preferenciais por ordinárias já provocaram reação nos preços das ações da instituição. Segundo levantamento da consultoria Economática, as ações do BB subiram no ano passado 84,1% (ordinárias) e 77,5% (preferenciais), num ano de perdas para a Bolsa de Valores de São Paulo (queda de 11% do Ibovespa) e outros papéis de bancos como Itaú, Bradesco e Unibanco. Neste ano, até o dia 15 de julho, as ações do BB estão caindo 0,8% (ordinárias) e 7% (preferenciais), mas ainda assim estão perdendo menos do que o Ibovespa, que caiu 21,7%. Comparando num prazo mais longo, no entanto, no acumulado desde 1995 até 15 de julho, os dados da Economática mostram que as ações do BB perderam 16,5% (ordinárias) e 20,1% (preferenciais), num período em que a bolsa paulista teve um ganho de 144,2%, e outros bancos tiveram rentabilidade expressiva. Oscilação dos preços das ações (%) Ações e Ibovespa 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 até 15/07/02 de 1995 até 15Jul./02 Banespa ON -56,2 28,6 519,0 66,4 40,3 15,5 56,4 1,1 1385,4 Banespa PN -58,7 0,0 810,0 70,5 28,0 -5,7 61,6 1,5 1169,2 Itaubanco ON 26,8 55,0 30,1 27,0 175,7 28,3 -2,4 -10,6 902,4 Unibanco ON 51,4 51,3 3,2 -33,9 291,9 67,1 -1,8 -10,9 796,1 Itaubanco PN 17,0 71,1 41,8 3,3 174,0 22,9 -1,9 -7,7 793,9 Bradesco PN 25,0 36,2 60,7 -33,2 137,7 38,4 -6,0 -10,8 404,1 Bradesco ON 22,3 45,0 72,6 -38,0 103,8 45,1 -4,9 -9,8 382,4 Unibanco PN 43,6 85,7 40,4 -43,8 112,0 21,2 -5,9 -17,5 319,5 Ibovespa -1,3 63,8 44,8 -33,5 151,9 -10,7 -11,0 -21,7 144,2 Brasil ON -31,3 -7,8 -23,4 -0,1 27,6 -26,1 84,1 -0,8 -16,5 Brasil PN -34,1 -18,2 -7,4 0,4 40,9 -31,4 77,5 -7,0 -20,1 Fonte: Economática Rentabilidade do BB ainda é menor que a de outros bancos O resultado histórico do banco foi prejudicado, quando a análise é de longo prazo, por conta de prejuízos causados na passado pela gestão política da instituição, mesmo quando a operação indicava risco de perdas, lembram os analistas. Estas perdas foram tantas que em 1996 o governo precisou colocar R$ 8 bilhões de dinheiro novo no BB, para recapitalizar a instituição. Os números da pesquisa Economática indicam como isso afetou o BB no passado. Na tabela abaixo, de rentabilidade sobre patrimônio, podemos verificar que as perdas nos anos de 95 e 96 ultrapassaram o próprio valor do patrimônio. E desde então a rentabilidade, embora positiva, continua sistematicamente abaixo de instituições como Itaú e Bradesco. Rentabilidade sobre patrimônio líquido (ROE %) Dez/95 Dez/96 dez/97 dez/98 dez/99 dez/00 dez/01 mar/02 Banespa -3,0 52,2 51,9 3,8 0,5 -102,5 36,4 43,0 Bradesco 11,2 15,1 14,9 16,0 16,3 21,5 22,2 21,9 Brasil -122,7 -134,6 9,6 13,1 11,6 12,2 12,4 14,2 Itaubanco 11,1 15,4 17,2 18,9 31,6 27,7 31,5 28,9 Unibanco 7,9 13,2 16,4 15,6 14,8 13,4 16,0 15,6 Fonte: Economática

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