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Adotar ou não adotar o lockdown em São Paulo

O governador João Doria e o prefeito Bruno Covas terão de tomar difícil decisão

Foto do author Celso Ming
Por Celso Ming
Atualização:

Até a próxima quarta-feira, o governador de São Paulo, João Doria, e o prefeito do Município de São Paulo, Bruno Covas, terão de decidir se decretam ou não o isolamento radical da população, o lockdown, como procedimento destinado a enfrentar o novo coronavírus.

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Será quarta-feira porque no dia 31 de maio se esgota o prazo dos decretos que impuseram a quarentena e é preciso saber o que vem depois. Epidemiologicamente, esta parece a melhor opção, diante do agravamento da crise e do aumento do risco de colapso do sistema público de saúde. No Estado, até esta sexta-feira, já são mais de 76 mil infectados e 5,7 mil mortes, os leitos de UTI estão com ocupação de 75% no Estado e de 91% na Grande São Paulo.

Antes de mais nada, é preciso saber se o lockdown não viria tarde demais e até que ponto poderia funcionar. E, se não funcionar, saber se os resultados não poderiam ser piores do que se o isolamento simples fosse mantido. Não há resposta conclusiva para essas perguntas.

O governador de São Paulo, João Doria, e o prefeito da capital paulista, Bruno Covas Foto: ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA-31/1/2020

A população não parece motivada a enfrentar o bloqueio de circulação. Cerca de metade das pessoas não vem observando nem sequer a quarentena, em parte porque está cansada do isolamento e, também, porque precisam tratar de arrumar algum sustento.

Nova pergunta: confinar os moradores das periferias em suas casas não produziria efeito mais nocivo, o de infectar mais rapidamente os mais pobres, os que não dispõem de condições mínimas de higiene para se proteger?

Só na Grande São Paulo são 21,5 milhões de habitantes. Por aí se vê que, se for para adotar a saída radical, será preciso engajar todos os prefeitos da região e não apenas o do Município de São Paulo. Qual seria o índice de sucesso de uma operação de lockdown? Elevar de 60% a 70% o confinamento poderia reduzir o número de mortos e o nível de utilização dos leitos de UTI? O que garantiria esse sucesso numa cidade que não conseguiu nem sequer bloquear meia dúzia de avenidas nem manter por apenas uma semana o rodízio de 24 horas nos veículos?

Para exigir a observância do lockdown, seria preciso garantir punições severas para infrações. Que tipo de punição poderia ser usada? Prender os transgressores, quando as autoridades vêm fazendo o contrário e vêm soltando presos para evitar o alastramento da contaminação nos presídios? Ou aplicar multas sobre quem não tem dinheiro nem para se alimentar?

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Além disso, não deixa de ser limite incontornável à eficácia de um isolamento radical o funcionamento de supermercados, feiras livres, farmácias, postos de gasolina, bancas de revistas e oficinas de reparo de veículos. Além disso, o mercado financeiro não pode parar, a Bolsa tem de seguir os mercados internacionais, os bancos precisam permanecer abertos, os portos e os corredores de acesso e de saída de mercadorias não podem fechar.

Ah, sim, as autoridades poderiam optar por um lockdown seletivo. Nesse caso, que critério adotar? Por idade, por localização geográfica? E como administrar a obediência a essa decisão? Por tudo isso se vê que tanto o governador como os prefeitos terão de optar por saídas de enorme gravidade sem clareza do que estão decidindo.

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CONFIRA

Presidente Jair Bolsonaro durante a reunião ministerial do dia22 de abril Foto: STF / Reprodução

» “Quero o povo armado”

Do ponto de vista do interesse público, a revelação de maior gravidade que saiu da gravação da reunião ministerial de 22 de abril foi a disposição do presidente Bolsonaro de armar a população contra prefeitos e governadores: “Eu quero é que o povo se arme! (...) O povo armado jamais será escravizado”. Em última análise, esse é um projeto de criação de milícias, cujo modelo é hoje o do governo bolivariano da Venezuela de Maduro. A ideia revela que o presidente espera confrontação com as polícias estaduais.

» Abin paralela

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Outra novidade é a de que o presidente conta com um serviço paralelo de informações, porque não confia nem nas informações passadas pela Agência Brasileira de Informações (Abin), nem pelos serviços de inteligência das Forças Armadas: “Eles são uma vergonha, uma vergonha, que eu não sou informado”. Da Abin, Bolsonaro se queixou de que é uma instituição com “problemas de infiltração”. A falta de informações é também uma das razões pelas quais o presidente quer controlar a Polícia Federal.

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