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Agrocrise

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Por Celso Ming
Atualização:

A crise já chegou à agricultura do Brasil. E chegou de forma muito rápida. A safra passada contou 144 milhões de toneladas de grãos, crescimento de 9% sobre a anterior e muita comemoração. Em agosto, os analistas ainda contavam com forte expansão da safra cujo plantio está em andamento. Mas, em pouco mais de três meses, as previsões se inverteram. Os primeiros levantamentos da safra 2008/2009 mostram a retração. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) aponta queda da produção física entre 1,4% e 2,9%. O IBGE prevê uma retração ainda maior, de 3,3%. "De agosto para cá, os preços médios dos produtos agrícolas desabaram entre 15% e 20%, o que empobreceu o produtor", relata Fábio Silveira, diretor da RC Consultores. Assim como saíram das aplicações em petróleo e em metais, os investidores também deixaram as commodities agrícolas. Além disso, o sumiço do crédito lá fora e aqui dentro afastou as tradings, companhias voltadas para o comércio exterior que até então financiavam a maior parte da produção brasileira de grãos, como aponta o analista José Carlos Hausknecht, da MB Associados. (Algumas estimativas dão conta de que o financiamento provido pelas fontes oficiais não chega a 25% do total.) O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem garantido que o governo melhorará os preços mínimos para esta safra. Mas não é uma política de fácil implementação. "Nem sempre o crédito disponível chega ao fim da linha porque muitos produtores ainda não se livraram do seu cadastro ruim e carregam dívidas das safras passadas", lembra Hausknecht. Ele explica que há um limite de crédito oficial para cada tipo de cultura e também por agricultor, exigência que não se repetia no crédito provido pelas tradings. "O governo aumentou o crédito, mas não flexibilizou as regras." O resultado desse quadro é imediato. "Com problema no crédito de custeio, que vai para a cobertura das despesas correntes, o produtor tende ou a reduzir a área plantada ou a cortar as aplicações de fertilizantes", lembra Antônio Márcio Buainain, professor do Instituto de Economia da Unicamp. Há quem pondere que a boa safra anterior e os excelentes preços obtidos até meados deste ano tenham capitalizado o agricultor brasileiro. Buainain não compartilha desse diagnóstico. Para ele, boa parte da renda foi gasta no pagamento de dívidas e na compra de insumos a preços muito altos, como os que vigoraram há alguns meses quando o dólar estava a R$ 1,60. "Uma única safra boa, como ocorreu agora, melhora as expectativas do produtor, mas não sua capacidade real de investimento", observa Buainain. Apesar da crise, as perspectivas gerais para as commodities agrícolas são inequivocamente melhores do que para as demais: "A demanda por alimentos, especialmente na Ásia, continua forte e os estoques estão baixos", adverte André Debastiani, analista da Agroconsult. Para ele, não se deve descartar uma recuperação dos preços ainda no segundo semestre de 2009. Mas, na hora do aperto, não é qualquer produtor que consegue manter o sangue frio e levar isso em conta.

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