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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Ajuste só para os ricos

A economia precisa de tratamento com responsabilidade fiscal, disciplina monetária e regras confiáveis; É um procedimento técnico, que não é nem de esquerda nem de direita

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Atualização:

A primeira reação da militância do PT ao programa de ajuste da economia foi de rejeição, como se fosse receita das elites dirigentes ou, simplesmente, como se fosse política que contraria o programa eleitoral da presidente Dilma.

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Como o ajuste ficou inevitável e, de mais a mais, foi recomendado pelo próprio ex-presidente Lula, o discurso mudou alguma coisa. O ajuste passou a ser rejeitado porque foi aplicado erradamente: concentrado no arrocho das despesas públicas e na alta dos juros, de maneira a favorecer os banqueiros e os ricos e a prejudicar os trabalhadores e os pobres. É o que repetem o presidente do MST, João Pedro Stédile, o ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro e mais seguidores.

Quando se trata de apresentar propostas que produzam o efeito pretendido por esses críticos, o que sai ou são medidas ineficientes ou medidas ainda mais prejudiciais aos trabalhadores e aos pobres do que a atual política.

Congresso do PT.Sem opções Foto: ROMILDO DE JESUS/FUTURA PRESS

Três sugestões desses segmentos são recorrentes: criação de um imposto sobre fortunas, a volta da CPMF (taxação sobre movimentação financeira) e derrubada unilateral dos juros.

O primeiro projeto de regulamentação de um imposto sobre fortunas foi elaborado em 1989, pelo então senador Fernando Henrique Cardoso. Não foi à frente. Não porque tivesse sido vetado pelos ricos, mas porque sua arrecadação seria insignificante e sua administração, muito complicada. Na maioria dos países que o instituíram teve de ser abandonado tanto como instrumento de arrecadação quanto de distribuição de renda.

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O problema da CPMF, de arrecadação facílima por ser automática, é seu caráter cumulativo. Vai amontoando imposto sobre imposto em todas as fases da produção. Ao contrário do que dizem seus defensores, nãoatinge só quem tenha conta bancária. Seu maior impacto é o aumento dos preços dos bens finais de consumo. Portanto, corrói o poder aquisitivo do trabalhador. Também prejudica as exportações porque vai para o preço e tira a competitividade do produto nacional. Além do que, seria uma jabuticaba: nenhuma economia o adota, pelas distorções que acarreta.

A derrubada dos juros, como instrumento de barateamento do crédito e de redução dos custos de produção,é outra bobagem. Entre agosto de 2011 e abril de 2013, o governo Dilma acreditou nessa tese e obrigou o Banco Central a derrubar a Selic. Os juros reais (descontada a inflação) chegaram a pouco mais de 2% ao ano. O resultado foi a disparada da inflação. A administração Mantega ainda tentou segurá-la com mecanismos heterodoxos, como o achatamento dos preços administrados e o represamento do câmbio, que criaram ainda mais distorções, as mesmas que agora estão exigindo alta brutal dos juros e o ajuste colocado em prática pelo ministro Joaquim Levy.

Se prevalecesse agora uma política de redução artificial dos juros, o resultado seria a disparada ainda mais acentuada da inflação que corroeria os salários e empurraria a economia para a desorganização e para o desemprego.

A economia precisa de conserto e, nisso, não há mágica disponível. É tratamento com responsabilidade fiscal, disciplina monetária e regras confiáveis. É um procedimento técnico, que não é nem de esquerda nem de direita, como imobilização para tratar perna quebrada. 

CONFIRA:

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Sem pé nem cabeça Nesta sexta-feira, no congresso do PT, em Salvador, o ministro da Saúde, Arthur Chioro, fez uma proposta esquisita. Ele pediu a volta da CPMF, mas de um jeito que "incida apenas sobre os ricos e não sobre a classe média". É o mesmo que pretender uma transfusão de sangue no doente que irrigue só o braço esquerdo e não o resto do corpo. 

Empresas, não O que o ministro está propondo é que cada titular de conta bancária mantenha atualizado o tamanho do seu patrimônio para que o computador do banco saiba de quem cobrar ou não cobrar o imposto. E, obviamente, para que o imposto não seja repassado para os preços finais de mercadorias e serviços e prejudiquem o consumidor, as contas bancárias das empresas, sejam elas grandes ou pequenas, também não podem ser alcançadas.

Desmentido Também nesta sexta-feira, em São Paulo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, desmentiu categoricamente que o governo esteja pensando na volta da CPMF.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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