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Alca é mais que livre comércio, diz Amorim

Por Agencia Estado
Atualização:

"Nem subserviência, nem confrontação, mas negociação." Este é o recado do chanceler Celso Amorim, cujo papel de principal negociador do País em relação à Alca foi reafirmado ontem pelo ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Alvo de ataques na imprensa (sua atuação supostamente arrogante nas negociações da Alca foi matéria de capa da última edição da revista Veja), Amorim falou na noite passada ao programa Conta Corrente, da Globo News. Na oportunidade, entre outras afirmações, declarou que a Alca é mais do que um acordo de livre comércio e que o Brasil, por suas dimensões e necessidades específicas, não pode ser comparado a outros parceiros latino-americanos nas negociações para a implantação do Acordo de Livre Comércio das Américas. Deixou claro que não interessa ao País boicotar ou retardar o acordo, mas que alguns pontos da agenda negocial devem ser discutidos no âmbito da Organização Mundial de Comércio. O que está em jogo Para Amorim, o que está em jogo na discussão da Alca é muito mais do que livre comércio, pois inclui também temas como a propriedade intelectual, a questão dos remédios genéricos, as normas de investimento que podem entrar em conflito com a Constituição brasileira na disputa entre investidor privado e Estado, a legislação ambiental sobre determinadas atividades econômicas. "Enfim, está em questão uma série de coisas e o nome ´livre comércio´ parece se referir apenas a tarifas e barreiras não-tarifárias, que aliás não está ocorrendo no nível em que gostaríamos no caso dos produtos agrícolas." Neste particular, segundo o chanceler, as ofertas que têm sido feitas pelos Estados Unidos são muito modestas, o mesmo ocorrendo em relação aos subsídios. Sem atropelos O ministro do Exterior insistiu que o governo brasileiro não pode ser atropelado por prazos na negociação da Alca. "Agora, obviamente, nós temos interesse em levar adiante essa negociação da Alca o mais rápido possível, mas sem prejuízo de substância e sem assumirmos compromissos que não sabemos exatamente o que significam." O que interessa Para Celso Amorim, a negociação deve ser concentrada naquilo que tradicionalmente foi entendido como livre comércio de bens, e talvez até em relação a serviços e investimentos, mas dentro de regras da OMC ou de regras consensuais, semelhantes às propostas que o País vem fazendo à União Européia. E explicou: "Nós temos alguns temas que são de particular interesse para o Brasil. Obviamente, a eliminação de subsídios agrícolas é um, o disciplinamento de medidas antidumping é outro... E nos foi anunciado pelos Estados Unidos, já há algum tempo, agora de maneira formal, que esses temas não seriam tratados na Alca, mas que só tratariam deles na OMC, por motivos vários, alguns até compreensíveis, embora decepcionantes para nós. Por outro lado, na área de acesso a produtos agrícolas, a oferta que nós recebemos até hoje se limita a cotas tarifárias. Não se diz sequer que a tarifa do produto chegará a zero, em determinado momento no futuro." Receios naturais Todas essas questões, conforme disse o chanceler, criam uma limitação para o âmbito da Alca e que deixam o Brasil com receios naturais. "O que (os EUA) quer de nós, e de outros (países), envolve medidas que dizem respeito à própria organização social (brasileira)." Para ele, essa é uma explicação para o fracasso da última reunião da OMC, em Cancún. "Quando as pessoas falam que Cancún parou por causa da agricultura, isso não é verdade. Na agricultura, nós estávamos negociando. Eu não sei aonde iríamos chegar, mas estávamos negociando. Cancún não teve resultado porque as demandas que lá foram feitas sobre investimentos, política de concorrências, compras governamentais e facilitação de comércio não foram aceitas por muitos outros países em desenvolvimento." Sem ideologismos Celso Amorim insistiu na necessidade de cautela do País quanto à Alca. "Nós, brasileiros, deveríamos olhar com muito cuidado (as questões referidas), pois isso tem impacto na própria capacidade que o Brasil tenha de eleger o seu modelo de desenvolvimento." E explicou: "Eu vou dar um exemplo apenas, prático, para não parecer que estamos falando de coisas teóricas, ideológicas: a política de compras governamentais que tem sido seguida pela Petrobras, no que diz respeito a plataformas de perfuração em alto mar, que privilegia empresas nacionais, dependendo do tipo de negociação que tiver na Alca, se tornaria impossível. Outro exemplo: política de genéricos, no caso de doenças como a Aids, se tornaria impossível, se for estendido o período das patentes, que faz parte da proposta norte-americana."

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