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Alta da Selic surpreende os analistas

O Copom elevou a taxa de 16,75% para 18,25% ao ano com viés de baixa por causa das pressões inflacionárias e alta forte e persistente do dólar. Analistas comentam a decisão, que surpreendeu até os mais pessimistas e reflete as incertezas na conjuntura econômica.

Por Agencia Estado
Atualização:

O Comitê de Política Monetária (Copom), em sua reunião mensal, decidiu elevar a taxa básica de juros (Selic) em 1,5 ponto porcentual, com viés de baixa, ou seja, autorização para o presidente do Banco Central reduzir os juros quando julgar adequado. Com isso, os juros passaram de 16,75% para 18,25% ao ano. A próxima reunião do Comitê está marcada para os dias 17 e 18 de julho. O mercado esperava uma alta de 0,5 ponto porcentual, com opiniões mais pessimistas apontando para 1 ponto porcentual. Segundo o Comitê, a alta da inflação e os elevados níveis do dólar foram as razões para a decisão. A ata da reunião deve ser divulgada na quinta-feira da próxima semana. Os analistas revelam uma certa ansiedade em relação ao comportamento do mercado amanhã. É possível que a elevação muito acima da expectativa seja coordenada com uma forte venda de dólares ou títulos cambiais para derrubar as cotações da moeda norte-americana. Se as declarações dos últimos dias de membros da equipe econômica estiverem corretas e os atuais patamares de negociação tiverem fundamentação meramente especulativa, a operação teria grandes chances de sucesso. Segundo o estrategista da BankBoston Asset Management, Márcio Verri, a simples elevação dos juros não será suficiente para fazer caírem as cotações do dólar. Para Verri, a decisão do Copom em colocar um viés de baixa na taxa Selic sinaliza que a taxa chegou ao seu patamar mais alto. Contudo, o economista-chefe da ABN Amro Asset Management, Hugo Penteado, diz que uma intervenção no câmbio, aliada à alta dos juros, seria bastante surpreendente e a definição do viés de baixa não parece ter muito sentido. A justificativa mais plausível para tanto, segundo ele, é que o viés foi adotado para reduzir os juros no caso de uma reversão da percepção de risco da Argentina. Segundo Penteado, "agentes do mercado acreditam que a Argentina acabará desvalorizando o peso, o que teria conseqüências extremamente graves. O pacote anunciado no final de semana foi interpretado por eles como uma confirmação disso. Mas nós não prevemos desvalorização e acreditamos que a percepção de risco do país possa até ser revertida no curto prazo." Nesse caso, a Selic poderia se reduzida, mas só nesse caso, para ele, pois os demais fatores de risco do cenário - crise energética e desaceleração econômica no mundo desenvolvido - são elementos de longo prazo. Mas há discordâncias quanto à questão da paridade do peso com o dólar. O estrategista-sênior para mercados emergentes do BNP Paribas, Ricardo Amorim, o pacote indica claramente que o governo em Buenos Aires está preparado para uma ampliação dos mecanismos de desvalorização. Inflação preocupa Os analistas concordam que a pressão de alta sobre os índices de inflação é muito preocupante, principalmente porque as elevadas cotações do dólar pressionam o preço dos produtos e insumos importados, assim como os produtos nacionais exportáveis. Muitos já consideram que o limite máximo da meta para a inflação anual, de 6% pelo Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA), corre o risco de não ser cumprido. Mas, mesmo com a forte elevação da Selic, a situação do câmbio continua indefinida. Como o dólar é um dos principais fatores de pressão inflacionária e o efeito da alta dos juros sobre as cotações da moeda norte-americana são incertos, ainda é cedo para especular sobre o cumprimento da meta. A reação do mercado de câmbio nos próximos dias agora é o mais importante. "A meta estabelecida com o Fundo Monetário Internacional (FMI), de 4% pelo Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA), já está fora de cogitação. Ainda não é possível saber se ficaremos dentro do intervalo máximo, de até 6% ou se ultrapassaremos este limite" explica Odair Abate, economista-chefe do Lloyds TSB. Eduardo Castro, diretor de renda fixa do ABN Amro Asset Management, também conta com a possibilidade de que a meta de inflação não seja cumprida. Para José Cunha, estrategista do Deutsche Bank, esta possibilidade é muito preocupante, já que este seria o primeiro acordo cumprido em sua íntegra com o FMI. "Para a imagem do País, não ficar dentro da meta de inflação é um fator negativo. As perspectivas de investimento direto podem ficar ainda piores, pois há uma perda de confiança por parte dos investidores estrangeiros", avalia. Os dois índices de inflação divulgados hoje confirmavam a temida alta da inflação. No início desta manhã saiu o Índice de Preço do Consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) referente à segunda quadrissemana de junho. O resultado, de 0,66%, é quase o dobro da inflação apurada na primeira quadrissemana, que foi de 0,35%. A taxa ficou dentro do esperado pelos especialistas - entre 0,50% a 0,70%. Já a segunda prévia do Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM) referente ao mês de junho, divulgado no final da tarde, ficou em 0,60%. "Neste caso, o número é ainda mais preocupante já que as apostas mais pessimistas do mercado apontavam para um número máximo de 0,35%, o que significa que a pressão sobre a inflação pode ser maior do que estamos imaginando", avalia Odair Abate, economista-chefe do Lloyds TSB. Dólar pressiona inflação: perspectivas negativas Na última reunião do Copom, em 22 e 23 de maio, quando a taxa Selic passou de 16,25% para 16,75% ao ano, o dólar oficial fechou cotado a R$ 2,3417. A moeda norte-americana vem mantendo forte tendência de alta e, segundo Cunha, "não há mais parâmetro de avaliação para a moeda norte-americana". Hoje, o dólar oficial fechou cotado a R$ 2,4748. Levando-se em conta o fluxo de dólares para o mercado interno, com perspectivas de redução em função da queda nos investimentos diretos e saldo deficitário - importações maiores que exportações - para a balança comercial, a tendência para a moeda norte-americana é manter-se em alta. No início do ano, a maioria dos analistas estimava que o volume de investimentos diretos para o Brasil seria de US$ 26 bilhões. De acordo com o Banco Central (BC), esta estimativa já caiu para US$ 20 bilhões em função do problema de escassez de energia. Mas já há analistas prevendo que chegarão no máximo em US$ 18 bilhões, como a Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transacionais e Globalização Econômica). No caso da balança comercial, no acumulado deste ano, até maio, o saldo negativo é de US$ 547 milhões. Neste mesmo período do ano passado, a balança comercial tinha um saldo positivo, com exportações maiores que importações, de US$ 528 milhões. Com o desaquecimento da economia norte-americana, as perspectivas são de que o saldo da balança continue negativo.

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