PUBLICIDADE

Publicidade

Alvos de arbitragem por erros contábeis, ex-presidentes da CVC quebram silêncio

‘Estão acusando quem identificou e comunicou sobre erro contábil na CVC’, dizem os executivos Luiz Eduardo Falco e Luiz Fernando Fogaça; empresa faz cobrança inicial de R$ 67 milhões

Foto do author Fernanda Guimarães
Por Fernanda Guimarães
Atualização:

Um dia antes da assembleia de acionistas da CVC tomar a decisão sobre um processo de arbitragem para buscar ressarcimento por erros contábeis que causaram prejuízos à companhia, os executivos Luiz Fernando Fogaça e Luiz Eduardo Falco, ex-presidentes da companhia de turismo, resolveram pôr o fim ao silêncio. Os executivos agora partiram para o contra-ataque: segundo eles, responsabilizá-los significaria punir as pessoas que identificaram a possibilidade de um problema e que iniciaram as investigações para apurar suspeitas, informando o mercado imediatamente. 

A questão que se arrasta há mais de 18 meses. Os prejuízos estimados com os problemas contábeis na empresa são estimados em R$ 362 milhões. A CVC quer cobrar na arbitragem um valor mínimo de R$ 67 milhões, montante que pode crescer a partir de eventuais bônus e dividendos pagos aos executivos. Atualmente, a CVC vale R$ 4,7 bilhões na B3. Há um ano, durante a primeira onda da pandemia, o negócio chegou a valer menos de R$ 1 bilhão. Em 2019, havia se aproximado da marca de R$ 10 bilhões.

O ex-presidente da CVC, Luiz Eduardo Falco. Foto: Robson Fernandes/Estadão

PUBLICIDADE

Os executivos, em entrevista ao Estadão, disseram se disseram indignados com a “acusação absurda” por parte do novo conselho de administração da CVC, que foi renovado em fevereiro, pouco antes da decisão de propor a arbitragem. Tal composição do colegiado passou a representar a mudança de perfil da empresa, com mais poder a sócios como os fundos Pátria, Opportunity e Equitas. A arbitragem, que ocorrerá na Câmara da B3, é o ambiente definido por estatuto da empresa para esse tipo de discussão.

Em entrevista na noite de segunda-feira, 26, um dia antes da assembleia que ocorreu na manhã de hoje, os executivos descreveram o encontro desta terça-feira, 27, como um jogo de “cartas marcadas”. A assembleia dos acionistas decidiu que a empresa buscará o ressarcimento e entrará com arbitragem contra os executivos.

Segundo Falco, casos semelhantes não são raros em empresas de varejo, visto que os lançamentos de vendas são manuais. "Essa é uma acusação absurda. Em 2013, a CVC era uma empresa familiar e agora é a maior empresa do setor das Américas", afirma. "Eu ainda estou tentando entender a razão de tornar réu quem começou a investigação", afirma Luiz Falco, que segue como acionista da empresa, com cerca de 1% do capital. 

Na proposta enviada pelo conselho, na qual apontaram a necessidade de arbitragem, a empresa informou que a conduta de Fogaça e Falco, além dos executivos Jacques Douglas Varaschim, ex-diretor de tecnologia da informação da CVC, e Leopoldo Saboya, ex-diretor financeiro, “resultaram, contribuíram ou de qualquer forma permitiram a ocorrência das Distorções Contábeis refletidas nas demonstrações financeiras do exercício social encerrado em 31 de dezembro de 2020”.

Outro lado

Publicidade

Os executivos dizem, porém, que não têm tido acesso a informações sobre as investigações. Segundo Fogaça, os executivos buscaram acesso às informações, para entenderem a acusação, mas as documentações oriundas das duas investigações realizadas não foram disponibilizadas quando solicitadas. “Nunca nos foi apresentado que houve suposta intenção de cometer um erro”, diz.

O executivo Luiz Fernando Fogaça. Foto: Robson Fernandes/Estadão - 06/03/2014

A primeira investigação foi conduzida pelo escritório do ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Marcelo Trindade, enquanto Falco estava à frente do conselho de administração da CVC e Fogaça na presidência executiva, e teria apontado existência de erros, mas sem apontar que a administração tenha agido com intenção de se beneficiar. 

A decisão em buscar reparação veio após a contratação do escritório E. Munhoz, do advogado Eduardo Munhoz, famoso no mundo das reestruturações judiciais, tendo tocado processos como o da Odebrecht. Segundo a empresa, a investigação complementar teve o objetivo de “apurar eventual responsabilidade dos ex-administradores da companhia, com o objetivo de analisar a possibilidade de buscar ressarcimento pelos prejuízos sofridos”. 

Falco é ex-TAM e Oi e chegou à CVC em 2013 com a missão de abertura de capital, que ocorreu naquele ano. Já Fogaça, que substituiu Falco na presidência, embarcou na empresa em 2010, primeiramente como diretor financeiro e depois como presidente. O pano de fundo que permeia o imbróglio que é grande parte dos atuais acionistas da empresa está há menos de um ano na empresa – ou seja, chegaram depois dos erros contábeis identificados pela companhia. A CVC foi uma das empresas listadas mais abaladas na pandemia, que afetou em cheio o setor de turismo. Muitos fundos compraram os papéis da companhia ao longo de 2020 com a aposta de recuperação do setor com a chegada da vacina.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Fogaça, que saiu da companhia no começo de 2020, um mês após divulgar um fato relevante sobre as suspeitas de erros contábeis, move uma ação trabalhista contra a CVC, que segue em sigilo. A ação se tornou pública na segunda-feira, 26, por decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Em entrevistas, a nova administração da companhia cita que os executivos manipularam o preço da ação, por uma eventual fraude contábil, acusando-os de trabalhar em benefício próprio, já que o preço da ação mais alto ensejaria em ganhos com planos de benefícios de ações.

Fogaça, no entanto, vê a história sobre outro prisma. “Nós participamos desde o início dessas investigações e não tivemos depois acesso a nenhuma informação sobre o porquê que se decidiu que seríamos as pessoas responsabilizadas. Isso está afetando a imagem de profissionais com mais de 30 anos de uma carreira exitosa”, diz o ex-presidente da CVC.

Publicidade

Acusação de falha

A CVC acusa os executivos de falha no cumprimento de seus cargos, dizendo que os mesmos “não instituíram processos, sistemas e controles internos adequados” e que não “fiscalizaram adequadamente as atividades realizadas em suas respectivas equipes”, além de terem sido “coniventes com as falhas de processos”. Diz, por fim, que os mesmos se “beneficiaram-se do incremento do resultado da Companhia no período em virtude de distorções contábeis”.

Eles apontaram que o erro contábil identificado passou por todo o sistema de governança e controles da companhia, incluindo o conselho. Dizem também que a primeira investigação não identificou nenhum tipo de manipulação ou ação intencional dos administradores. Disseram, ainda, que apesar de existir um erro, o mesmo não afetou a geração de caixa da companhia – ou seja, não interferiu na avaliação do preço da empresa. 

Procurada, CVC não comentou.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.