Análise: PIB tem alta recorde, mas não é para comemorar

Crescimento de 7,7% na atividade econômica no terceiro trimestre veio abaixo do previsto e não recupera perdas acumuladas no ano

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Por Alexandre Calais
2 min de leitura

Pode soar estranho dizer que um crescimento de 7,7% na atividade econômica em um trimestre decepcionou. Mas estamos em 2020, ano de coisas muito, muito estranhas. Portanto, mesmo com uma alta recorde do PIB no terceiro trimestre, o primeiro sentimento é de decepção. Isso porque é um crescimento que não consegue sequer recuperar o que foi perdido apenas no segundo trimestre, quando houve uma queda de 9,6%. A previsão do mercado, de acordo com o Projeções Broadcast, era de uma alta de 8,8%, número que também já seria inferior ao do recuo no segundo trimestre. 

Esse tem sido um ano disfuncional, com dados que apontam caminhos completamente opostos, o quetorna as projeções para os rumos da economia um exercício de futurologia bastante complicado. Alguns analistas estão otimistas e projetam uma recuperação forte da economia no ano que vem, com alta de até 4,5%. Para outros, o cenário é de uma economia, na prática, estagnada em 2021.

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Empresas estão preocupadas com o impacto do desemprego alto no consumo das famílias. Foto: Tiago Queiroz/Estadão - 25/11/2020

O que complica todas essas previsões é o alto grau de incerteza em diversas frentes que podem ter um impacto significativo na atividade econômica. O primeiro, e talvez o maior deles, ainda é a covid-19. A pandemia vai arrefecer ou teremos um quadro de continuidade - ou, pior, de avanço da doença? Haverá uma vacina disponível para o Brasil? Quando? São perguntas ainda completamente sem respostas. Qual será o impacto, em 2021, dessa onda que derrubou a economia brasileira este ano?

Existe um efeito expectativa nos mercados financeiros para o qual também não há uma resposta clara. As reformas estruturais da economia vão avançar no Congresso? Haverá um movimento no sentido de controlar a trajetória do endividamento público? O teto de gastos será respeitado? Veremos alguma manobra contábil para a criação do programa pensado para substituir o Bolsa Família?

Na parte mais prática, está claro que não será um ano fácil. Com toda a ajuda fornecida pelo governo este ano a empresas e pessoas físicas, foi evitada uma catástrofe maior. No início da pandemia, chegou-se a prever uma queda do PIB de cerca de 10%. Agora, as projeções estão em uma queda em torno de 4,5%. Mas essa ajuda vai acabar, e alguns sinais de que as coisas podem piorar já aparecem.

O pior deles talvez seja o desemprego. Mês após mês o IBGE mostra um aumento no número de desocupados. São pessoas que, num primeiro momento, por causa da pandemia, desistiram de procurar uma vaga, mas que, com o passar do tempo e a necessidade batendo à porta, não tiveram alternativa. O auxílio emergencial, que também conseguiu manter muita gente em casa, foi reduzido de R$ 600 para R$ 300 e deve acabar totalmente neste mês. Desemprego alto se reflete diretamente na queda do consumo, e as empresas já se mostram muito preocupadas com isso.

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Por isso tudo, o aumento do PIB no terceiro trimestre, mesmo sendo recorde, não é um dado exatamente a ser comemorado. Pode parecer esquisito, mas, lembre-se, estamos em 2020.

*Editor de Economia

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