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ANÁLISE-Plano do Brasil para pré-sal pode sofrer atrasos

Por FERNANDO EXMAN E NATUZA NERY
Atualização:

O plano brasileiro para manter controle sobre as grandes jazidas de petróleo do pré-sal enfrentará obstáculos no Congresso e isso pode atrasar as ambições do país de se tornar um player global no setor, afirmaram especialistas nesta quinta-feira. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer mudar as regras do setor para a exploração do pré-sal, visando dar ao Estado mais recursos para investir no bem-estar social e na educação, reduzindo o poder da companhia estatal Petrobras. "Agora estamos em uma pequena polêmica. Achamos petróleo no pré-sal. Tem gente que acha que o petróleo é da Petrobras, que o petróleo é da União. E a Petrobras é da União, embora tenha acionistas estrangeiros minoritários", disse Lula nesta quinta-feira em evento no Pará. O petróleo, segundo Lula, pertence aos brasileiros e não a "meia dúzia de companhias", disse nesta semana. O presidente da vizinha Venezuela, Hugo Chávez, tem usado os recursos do petróleo para financiar projetos sociais. Mas no Brasil o plano poderia enfrenar uma longa batalha no Congresso e de acionistas da Petrobras . "O debate no Congresso não será fácil, pois é um debate de trilhões (de dólares)", afirmou à Reuters Ideli Salvatti, líder do PT no Senado. A Petrobras chocou o mundo do petróleo em novembro passado, quando anunciou a descoberta do megacampo Tupi, na bacia de Santos, com reservas estimadas entre 5 bilhões e 8 bilhões de barris de óleo equivalente, a segunda maior descoberta em 20 anos. Outras reservas no pré-sal que devem existir na área devem levar o Brasil a saltar da 17a para a 10a posição entre os maiores produtores de petróleo do mundo, e o governo já disse que planeja se juntar à Opep. Sob a orientação de Lula, fontes do governo afirmam que uma nova companhia estatal controlaria a exploração e a produção dos campos do pré-sal, tirando algum poder da agência reguladora do setor, a ANP. Atualmente, as companhias de petróleo pagam royalties e taxas ao governo pelo petróleo extraído. "A idéia da nova companhia estatal e de contratos de produção compartilhada são diretrizes do presidente, mas nada foi decidido ainda", disse o porta-voz do Ministério das Minas e Energia à Reuters. Com mais controle sobre o petróleo, o governo quer exportar mais derivados do que o petróleo bruto. "Agora, o que nós vamos fazer com esse petróleo? Vender pura e simplesmente? Não. Deus deu um sinal para nós. Mais uma chance para o Brasil. Mais uma chance. Deus não nos deu isso para que nós continuemos fazendo burrice", disse Lula no Pará. CAIXA DE PANDORA Mesmo quem apóia o governo diz que ele pode estar abrindo uma caixa de Pandora ao renegociar um tesouro depois de encontrá-lo. Em reformas envolvendo emendas constitucionais, a oposição pode conseguir bloquear a proposta, disse Salvatti. "Se o governo tiver um pouco de bom senso, vai evitar ao máximo mexer na Constituição", disse a senadora. O governo pretende respeitar os direitos contratuais das companhias que já estão prospectando nos novos campos de petróleo. "Vinte e cinco por cento do pré-sal já foi leiloado, e nós não vamos tocar nisso", disse uma importante autoridade próxima a Lula. Mas se os testes sísmicos confirmarem que toda a bacia é um imenso campo interligado, o governo terá que unir contratos antigos e novos sob a nova legislação, disseram especialistas. Acionistas da Petrobras, que incluem grandes fundos de investimentos estrangeiros, já ameaçaram adotar medidas judiciais contra o governo caso sofram perdas. O governo pretende ter uma proposta pronta depois das eleições municipais de outubro e apresentá-la ao Congresso no início de 2009, antes do início da campanha para as eleições presidenciais de 2010. Mas isso pode se mostrar um prognóstico otimista. "Não quero falar em resistências, mas esclarecimento, debate e discussão à exaustão", disse José Agripino, líder do oposicionista Democratas (DEM) no Senado à Reuters, acrescentando que a aprovação em 2009 seria difícil. O governo quer ainda discutir a redistribuição das receitas do petróleo para Estados e municípios envolvidos na produção. Essa é uma tarefa ainda mais assustadora, dizem especialistas, porque todo mundo irá querer um pedaço do bolo. "Será um prazo muito apertado antes das eleições de 2010 e do fim do governo Lula", disse Erasto Almeida, analista da consultoria Eurasia Group em Nova York. Almeida disse que o governo pode acabar aumentando os impostos sobre o petróleo em vez de alterar a estrutura legal. Em cinco anos, o governo foi incapaz de aprovar uma importante reforma tributária no Congresso porque governadores e parlamentares dos Estados que vislumbraram uma queda na arrecadação boicotaram a votação. São parceiros da Petrobras em descobertas do pré-sal a Galp, a ExxonMobil, a Amerada Hess, o BG Group, a Repsol e a Shell (Reportagem adicional de Stuart Grudgings no Rio de Janeiro e de Peter Murphy no Pará)

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