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ANÁLISE: Uma mudança estratégica forçada

Indicadores e projeções apontam o período de 2015 a 2030 como sendo marcado por uma crise do sistema capitalista atual

Por Paulo Vicente dos Santos Alves
Atualização:

Mudanças no cenário global – tais como o Brexit e a eleição de Donald Trump em 2016 – pegaram muitos analistas de surpresa. Há indicadores e projeções que apontam o período de 2015 a 2030 como sendo marcado por uma crise do sistema capitalista atual, que forçará o investimento em novas tecnologias. É o panorama para a criação do embrião de um novo ciclo de tecnologia e uma nova forma de capitalismo.

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Trump se encaixa como uma luva neste modelo de ciclos econômicos. Ao mesmo tempo em que planeja retomar a indústria dos EUA, o novo presidente americano aumenta as barreiras protecionistas e investe em novas tecnologias para criar um diferencial de competitividade e produtividade em favor dos EUA.

Para atingir esse objetivo, o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) do governo dos EUA em 2017 deve estar na casa de US$ 150 bilhões, sendo US$ 70 bilhões consumidos apenas pelo Departamento de Defesa (DoD).

Para reforçar a estratégia de aumento de produtividade proposta por Trump, faz sentido aumentar barreiras alfandegárias, tarifárias e de imigração. Cria-se, assim, um incentivo para que as empresas envolvidas deixem suas linhas fabris na Ásia se depreciarem ao longo dos anos, enquanto remontam sua estrutura nos EUA.

Nas Américas, México e Brasil devem ser os mais afetados. O México sofre pelas barreiras diretas impostas pelo país vizinho, além de uma economia marcada pela baixa produtividade e pouca tecnologia.

Já o Brasil tende a ser menos afetado. A maioria das exportações brasileiras não é de produtos acabados, mas sim de matéria-prima. Contudo, a combalida indústria nacional sofrerá mais um golpe, que só pode ser remediado no médio prazo com tecnologia para contrapor a produtividade e mudanças estruturais nas políticas de energia e mão de obra para reduzir custos e aumentar produtividade.

O custo de energia no Brasil pode ser reduzido com investimento e regulação mais livre para energia solar, que promete não só ser a mais barata em dez anos, como ser grande empregadora ao substituir as expectativas frustradas do pré-sal e de grandes hidrelétricas na Amazônia.

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O custo de mão de obra também pode ser reduzido com investimentos em robotização e inteligência artificial. Historicamente, o processo de destruição criativa gera mais empregos do que destrói, mas sempre gera empregos mais qualificados, e mais bem pagos. Isso implica numa remodelação do ensino brasileiro, não necessariamente mais dinheiro, mas dinheiro mais bem gasto.

O resultado final é que Donald Trump e outras mudanças estruturais na globalização talvez estejam fazendo um favor ao Brasil, o forçando para fora da zona de conforto e obrigando pensar de maneira mais estratégica do que tática.

* Doutor em administração pela FGV, e professor da Fundação Dom Cabral

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