BERLIM - A chanceler alemã, Angela Merkel, expressou pela primeira vez nesta sexta-feira, 21, "sérias dúvidas" sobre o futuro do acordo comercial entre a União Europeia e os países do Mercosul, dada a ameaça ecológica que paira sobre a Amazônia no Brasil. “Temos sérias dúvidas de que o acordo possa ser aplicado conforme o planejado", disse o porta-voz da chanceler, Steffen Seibert.
A União Europeia (UE) e os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) assinaram o acordo de livre-comércio no ano passado. Mas, para ser definitivamente validado, ele precisa ser ratificado por todos os parlamentos nacionais.
O parlamento austríaco e, recentemente, os holandeses rejeitaram o pacto em sua forma atual. Outros países, como Bélgica, França, Irlanda e Luxemburgo foram críticos. Até agora, a Alemanha apareceu como um dos grandes promotores desse acordo.
As declarações de seu governo nesta sexta-feira aumentam as críticas na Europa, já que o texto é alvo de ataques de ambientalistas, que temem que isso vá afetar o meio ambiente. No foco das preocupações está a maior abertura dos mercados europeus à carne sul-americana, já que a pecuária é responsável por 80% do desmatamento na Amazônia, segundo a associação WWF.
Para responder a essas preocupações, um capítulo foi integrado ao texto final do acordo que tratava, em particular, da "conservação da floresta".
Mas a chanceler alemã agora expressa "forte preocupação" com o "contínuo desmatamento" e os "incêndios", que se multiplicaram nas últimas semanas na Amazônia. "Estamos céticos", disse seu porta-voz. "Nesse contexto", Berlin tem "sérias dúvidas sobre a implementação do acordo conforme planejado" e, especialmente, dessa cláusula. “A Amazônia afeta o mundo todo”, acrescentou.
É a primeira vez que a Angela Merkel expressa críticas a esse pacto. A multiplicação dos incêndios na maior floresta tropical do mundo chocou a comunidade internacional. O presidente francês Emmanuel Macron já havia ameaçado não ratificar o acordo se o governo de Jair Bolsonaro não tomasse as medidas necessárias para proteger a Amazônia. No entanto, os incêndios cresceram 28% em julho deste ano, em relação ao mesmo mês de 2019.
A crítica da Alemanha ocorre no dia seguinte a um encontro entre a chanceler e os responsáveis pelo movimento Fridays for Future, especialmente com sua líder, a jovem sueca Greta Thunberg, na capital alemã.
“Angela Merkel aprovou nossas críticas ao acordo com o Mercosul e não pretende assiná-lo”, disse no Twitter Luisa Neubauer, importante figura do movimento na Alemanha, que participou do encontro.
O acordo foi inicialmente apoiado pela Alemanha e sua poderosa indústria de exportação, especialmente a indústria automobilística, que o viu como uma porta para novas oportunidades.
A Organização das Câmaras de Comércio e Indústria (DIHK) reagiu às afirmações do chanceler, defendendo um acordo "que poderia dar o impulso de que a economia necessita urgentemente, durante a atual crise", causada pela pandemia do coronavírus.
Mas as preocupações ambientais, amplamente compartilhadas pela opinião pública alemã, estão ganhando peso no país, onde milhares de jovens ativistas costumam se manifestar.