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Aos 25, ''''McPaper'''' atinge a maturidade

''''USA Today'''' conseguiu alcançar respeito e ser lucrativo

Por Richard Pérez-Peña
Atualização:

No meio do ano, uma série de longas reportagens investigativas procurou elucidar por que os soldados americanos no Iraque, em sua maioria, não têm veículos que poderiam protegê-los de explosivos, embora esses veículos estejam disponíveis há anos e os militares iraquianos os utilizem. A série foi publicada pelo USA Today - sim, USA Today, o jornal que foi pioneiro das cores vivas e dos artigos minúsculos, preferiu o otimismo à seriedade e encheu suas páginas de gráficos frívolos. Mas nenhum leitor atento ficaria surpreso ao ver reportagens áridas ao lado da ostentação. O USA Today, que completou 25 anos no sábado, ainda se destaca por oferecer uma leitura mais leve e rápida que a da maioria dos concorrentes. E, como temiam muitos jornalistas, o jornal, já apelidado pejorativamente de ''''McPaper'''', deixou uma marca nos jornais americanos em geral, levando muitos diários sisudos a publicar artigos menores, adotar as cores, dedicar mais espaço aos esportes e usar mais fotos e gráficos. Mas, ao mesmo tempo, o USA Today tornou-se gradualmente mais parecido com outros jornais - mais substancial, mais sério, mais propenso a dar espaço amplo a pelo menos alguns grandes assuntos. O jornal deixou de ser um intruso caricatural e se tornou uma parte respeitável da grande imprensa. ''''Ainda há uma boa distância entre o USA Today e os outros grandes jornais em termos de aparência e leitura, mas não tanto quanto antes'''', disse Allen H. Neuharth, ex-presidente da Gannett que criou o jornal. O USA Today, que causou prejuízos de cerca de US$ 1 bilhão nos primeiros dez anos, é hoje uma fonte de lucro, com circulação de 2,3 milhões de exemplares em dias úteis - a maior dos EUA. No entanto, como em todo o setor, ele enfrenta o desafio da fuga de leitores e anunciantes para a internet em busca de notícias e informação. Em alguns aspectos, o USA Today parece estar à altura do desafio. O jornal foi criado para aproveitar um fato novo - o de que a sociedade americana se tornava mais móvel - muito antes do surgimento da internet, dos telefones celulares e das conexões Wi-Fi. Foi projetado para atrair quem viaja a negócios - metade dos exemplares é distribuída em hotéis - e quem se mudou de uma região para outra dos EUA. O jornal oferece, a ambos os grupos, um produto sólido, fácil de ler, com algumas notícias da terra natal do leitor e uma perspectiva nacional das notícias não encontrada na maioria dos diários locais. O jornal também apresentou recursos voltados especialmente a esses grupos, como o mapa do tempo, colorido e ocupando uma página - imitado quase imediatamente pelos concorrentes -, a cobertura esportiva abrangente e a reportagem agressiva sobre o setor aéreo. O estilo gráfico do jornal, seu público relativamente jovem e seu costume de encorajar a participação do leitor anteciparam alguns aspectos da internet, embora ainda não saibamos se seu status de inovador popular continuará no futuro online. APOSTA Há 25 anos, Neuharth apostou a carreira - e possivelmente o futuro da Gannett - em sua visão de um jornal nacional, criado a partir do zero, apesar do ceticismo generalizado e da necessidade de sangrar recursos de outros jornais da rede a fim de lançá-lo. Durante anos, os funcionários foram na maioria jovens ''''emprestados'''' de outros jornais do grupo - que continuaram pagando seus salários. Eles eram inexperientes, mas estavam dispostos a aceitar as limitações do USA Today e o menosprezo de colegas e fontes. ''''Nenhum de nós tinha o pedigree de Washington. Só tivemos sorte de estar lá'''', contou Bill Nichols, um dos ''''emprestados'''' originais. Ele começou a trabalhar no USA Today aos 25 anos e cobriu a Casa Branca e o Departamento de Estado. Saiu neste ano para virar editor do Politico, website e jornal dedicado à política. A diferença entre o USA Today e o resto do setor foi evidente desde o primeiro dia, 15 de setembro de 1982. Naquela data, a maioria dos grandes jornais trouxe reportagens de primeira página sobre o assassinato de Bashir Gemayel, presidente eleito do Líbano. No USA Today, o assassinato recebeu uma breve menção num quadro de resumo de notícias na capa e um pequeno artigo na parte interna. Na metade superior da página estava a foto de um acidente aéreo na Espanha. Obedecendo à ordem de Neuharth de que o jornal se concentrasse nas boas notícias, a manchete dizia: ''''Milagre: 327 sobrevivem, 55 morrem.'''' Outra morte dominava a página - a da princesa Grace, de Mônaco, num acidente de carro. Ela apareceu em várias outras capas naquele dia, mas com menos destaque. ''''Meu Deus, como os jornalistas e críticos da grande mídia atacaram aquela página. Parecia que tínhamos matado alguém'''', disse Anne Goodfriend, editora e mais tarde colunista do USA Today desde a fundação até 2001. ''''Mas isso realmente ajudou a criar um clima de ''''nós contra o mundo''''.'''' Quinze anos depois, quando outra princesa morreu num acidente de automóvel, estava subentendido que quase todos os jornais abririam suas edições com Diana. A primeira reação dos profissionais da área foi dura. Ben Bradlee, o reverenciado editor do Washington Post, foi citado afirmando: ''''Se o USA Today é um bom jornal, estou na profissão errada.'''' Neuharth e sua equipe aceitaram a zombaria. O fundador respondeu que ele e Bradlee concordavam em pelo menos um ponto - ''''que ele está na profissão errada''''. Na redação, funcionários adotaram o rótulo de ''''McPaper''''. O USA Today logo conquistou um grande público - mais de 800 mil leitores em um ano. Mas o jornal precisava oferecer um público ainda maior aos anunciantes para ser lucrativo. A maioria dos jornais depende intensamente dos anúncios de domingo, mas o USA Today nunca saiu nos fins de semana. O jornal não tem um mercado local para apelar a anunciantes locais. Para estar presente em quase todo o país, ele é impresso em 35 localidades, muito mais que os outros jornais nacionais, The Wall Street Journal e The New York Times. Muitos anunciantes dão mais valor aos leitores com assinaturas individuais, que respondem por mais de 60% da circulação no Journal e no Times, mas por menos de 14% no USA Today. A Gannett não divulga números separados sobre cada jornal, mas revelou que o primeiro ano do USA Today no azul foi 1993, quando a circulação alcançou 1,6 milhão. Executivos da companhia dizem que o jornal continua a gerar lucros sólidos, embora não tenha as margens de 20% de muitos de seus jornais menores. Ao longo dos anos 80 e 90, à medida que sua equipe ganhou experiência e aumentou, o jornal ficou mais sério. Washington e as grandes corporações começaram a vê-lo como uma força a ser enfrentada. Em muitos aspectos, no entanto, o USA Today continua diferente dos concorrentes. ''''A maioria de nossos leitores não nos lê todo dia. Assim, não há expectativa de cobertura em série'''', disse Ken Paulson, editor desde 2004. ''''Podemos escolher nossos pontos e não temos de cobrir uma notícia em todos os seus estágios.'''' De fato, Paulson determinou explicitamente que sua equipe abandone um dos hábitos que, segundo ele, invadiram a redação na última década - o de também cobrir os grandes assuntos que saem na concorrência. ''''Queremos publicar histórias que ninguém mais tem e que dominamos'''', afirmou ele. Mas o ressentimento coletivo ainda está presente. ''''Nunca ganhamos um Prêmio Pulitzer, o que na verdade não importa'''', disse Paulson. ''''Mas seria bom nos livrarmos desse porém.''''

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