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Apesar de você

Foto do author Celso Ming
Por Celso Ming
Atualização:

Depois de tanta decepção com o setor produtivo, especialmente com a indústria, o ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro Filho (foto), orgulhosamente apresentou ontem "a maior safra agrícola de todos os tempos".Não era o que se esperava até há dois meses. As dez previsões, tanto do IBGE como da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), feitas até agora apontavam quebra de safra em relação à do ano anterior. No primeiro trimestre deste ano, o PIB agrícola sofreu queda de 8,5% sobre o primeiro trimestre deste ano. Agora, a lavoura nacional comparece para, uma vez mais, salvar o PIB nacional não só em produção física, mas também em valor (e renda). Os principais grãos acusam escalada de preços nos mercados internacionais de commodities.O jogo virou. A produção de grãos deste ano, anunciada ontem pelo ministro, é de 165,9 milhões de toneladas (veja no Confira), 1,9% acima da safra anterior, "mas pode chegar aos 170 milhões de toneladas", diz Mendes Ribeiro.O ministro informou, ainda, que levou os novos números à presidente Dilma, "que ficou enormemente feliz", porque, afinal, esse importante segmento do setor produtivo não está decepcionando.As administrações do PT mantêm em relação à agropecuária uma visão carregada de ambiguidades até agora não resolvidas. O partido chegou ao governo com a visão enviesada de que esse é um setor dominado pelo agronegócio (visto como predador), pela bancada ruralista do Congresso (sempre retrógrada), pelos usineiros exploradores dos boias-frias, pelos fundiários avessos à reforma agrária e às reivindicações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST).Os líderes do MST, que contam com uma boa retaguarda dos governos desde 2003, não se cansaram de denunciar os responsáveis pelo que chamam de destruição da agricultura familiar, à medida que grandes empresas se empenham em espalhar monoculturas de laranja, soja, cana-de-açúcar e florestas de árvores exóticas, como de eucalipto e pinus. Essa visão ideológica foi complementada pelo diagnóstico distorcido de alguns economistas, para os quais esse modelo agrícola tende a reconduzir o Brasil à produção de bens primários, que incorporam baixo índice de tecnologia e não se preocupam com agregar valor. Mais do que isso, entendem que o setor pretende reduzir o Brasil a um fazendão e gerar a doença holandesa que contribui para uma superoferta de dólares, que manteria o real excessivamente valorizado, e para a desindustrialização.Em contrapartida, embora sigam contaminados por pontos de vista desse tipo, os governos do PT vêm sendo obrigados a reconhecer enormes avanços tecnológicos da agricultura brasileira moderna, a imprescindível fonte de receitas em moeda estrangeira proporcionada pelas exportações de grãos, e a importância estratégica da bioenergia, sobretudo programas do biodiesel e da produção de etanol, e o enriquecimento do interior do País.Mas não dá para falar que a agricultura venha contando com apoio firme do governo, tal qual dado a determinados setores da indústria, premiados com isenção tributária e créditos favorecidos do BNDES. Além disso, a atual política populista de achatamento de preços concorre para desestimular a produção de cana-de-açúcar. A agropecuária brasileira continua escrevendo uma história de sucessos, apesar do jogo contra.

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