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Após 18 anos, União Europeia apresenta nesta semana oferta decisiva ao Mercosul

Parte da resistência de setores brasileiros em fechar o entendimento já foi diluída diante do impacto do comércio com a China

Por Jamil Chade
Atualização:

GENEBRA – Depois de 18 anos, a negociação entre o Mercosul e a UE entrará numa fase decisiva e inédita. Ainda nesta semana, o bloco europeu apresentará sua oferta do que está disposto a abrir em seu mercado para as exportações dos países do Cone Sul. A expectativa do Mercosul é de que, pela primeira vez, etanol e carnes estejam no pacote, o que tem gerado fortes críticas por parte do lobby protecionista europeu. 

A ordem era a de aguardar a eleição na Alemanha para saber e a maior economia do bloco continuaria a ser governada por Angela Merkel. Foto: Daniel Roland/AFP

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O processo de negociação começou em 1999. Mas em 2004, processo entrou em um longo período de impasse. O governo brasileiro recusou um acordo com os europeus diante do acesso aos produtos agrícolas considerados como insuficientes. Agora, a meta de ambos os lados é a de fechar um acordo inicial até dezembro. 

Uma primeira troca de ofertas foi realizada em maio, com o Mercosul indicando a abertura de setores industriais, enquanto a Europa apresentou sua proposta inicial. Mas o pacote oferecido naquele momento não incluía produtos considerados como fundamentais para os exportadores do Cone Sul. 

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A ordem era a de aguardar a eleição na Alemanha para saber e a maior economia do bloco continuaria a ser governada por Angela Merkel. Com a vitória da chanceler, que apoia um acordo, Bruxelas recebeu o sinal verde para preparar o documento final que será entregue ao Brasil até sexta-feira, 29. Na semana que vem, em Brasília, negociadores de ambos os lados se reunirão para avaliar o pacote e considerar se a oferta é suficiente para fechar um entendimento. 

Lobby. Tanto em Brasília como nas capitais europeias, a entrada do processo em uma fase final está mobilizando setores produtivos. No Brasil, o setor de máquinas e equipamentos no País teme uma abertura que poderá afetar o segmento que já sofre com dois anos de recessão ou baixo crescimento. 

Mas alguns setores que recusavam um acordo há quase duas décadas acabaram mudando de posição e hoje estão dispostos a fechar um entendimento. No caso do setor de eletrônicos, o temor da indústria brasileira era de que uma abertura para a concorrência europeia poderia os afetar no início do século. Desde então, mesmo fechado para a Europa, o setor sofreu um profundo abalo com a chegada da China ao mercado. 

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Hoje, ironicamente, o segmento vê o acordo com a Europa como uma oportunidade para ter acesso a novos mercados. 

Carnes. Do lado europeu, a pressão é para que Bruxelas não inclua uma abertura no setor de carnes, sensível para diversos países. O Mercosul, porém, já deixou claro que sem carnes e etanol, não haveria um acordo. 

Aos diplomatas brasileiros, os europeus já confessaram que a proposta vai conter os dois itens. Mas ainda negociam internamente qual será a cota oferecida ao bloco sul-americano. 

Nas últimas semanas, o lobby protecionista europeu tem feito pressão em diversas capitais para tentar evitar uma abertura. Na Irlanda, o setor alertou que o acordo representaria prejuízos de 2,5 bilhões de euros. 

O comissário de Agricultura da UE, Phil Hogan, chegou a prometer a produtores locais que, mesmo com uma abertura em cotas, Bruxelas colocaria exigências sanitárias sobre os produtos do Mercosul que poderiam frear um fluxo maior de bens. 

No setor do leite, entidades de produtores lideradas pelo irlandês, John Comer, também insistem na necessidade de frear um acordo com o Mercosul. 

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A poderosa entidade que reúne todas as federações agrícolas do Velho Continente também reagiu. “Um acordo comercial com o Mercosul teria um impacto severo para a agricultura da Europa, especialmente o setor de carnes”, disse o presidente das Cooperativas Agrícolas da Europa, (COPA/COGECA), Jean-Pierre Fleury. Segundo ele, o consumo de carne na Europa já caiu em 20% nos últimos dez anos e o impacto do Brexit é uma incógnita para o setor. 

“Temos padrões de qualidade e de segurança alimentar que esses países (do Mercosul) não tem”, disse. “Registramos os movimentos individuais de animais do dia que nascem até a morte, enquanto no Mercosul apenas 10% do tempo de vida de um animal é de fato acompanhado”, afirmou. 

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“Lamentamos o fato de que a Comissão Europeia tenha planos de incluir carnes em uma oferta de abertura comercial com o Mercosul”, declarou o secretário-geral da entidade, Pekka Pesonen. Segundo ele, um novo estudo do impacto do acordo com a Europa apontaria para consequências “catastróficas” de um entendimento com o Mercosul que inclua carnes. Para ele, cotas precisam ser estabelecidas. “Não podemos mais aceitar usar esse setor da agricultura da Europa como moeda de barganha para outras áreas” disse. 

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