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O Futuro dos Negócios

Opinião|Ar assassino

O alerta vermelho está soando: é imprescindível limpar a matriz energética global

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Atualização:

Uma das inevitabilidades de nosso futuro envolve a demanda crescente da sociedade por energia. No relatório International Energy Outlook 2019, produzido pela Agência de Informação de Energia dos EUA (US Energy Information Administration, EIA), as projeções apontam para um crescimento no consumo mundial de energia de quase 50% entre 2018 e 2050. A maior parte desse crescimento será originada por países em fase de desenvolvimento, especialmente na Ásia, mas vale notar que na maior parte dos países do mundo – independente do seu estágio de desenvolvimento – o consumo de energia continuará a ser dominado pelo setor industrial, seguido pelos setores de transporte, residencial e comercial. Ainda de acordo com a EIA, estes setores devem experimentar um crescimento total em ritmos distintos nas próximas três décadas: cerca de 30% para indústria, 40% para transportes e 65% para o setor de construção (considerando tanto residencial quanto comercial).  

Parque eólico no litoral do Rio Grande do Norte. Foto: JF Diorio/Estadão - 2/9/2017

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Uma das características mais relevantes do perfil da demanda energética para o futuro dos negócios é a necessidade de gerarmos mais eletricidade – quase 80% mais até 2050. Este aumento é devido principalmente a dois fatores: o setor residencial (com maior demanda por eletrodomésticos e equipamentos pessoais) e o setor de transportes (com a eletrificação de ferrovias e das frotas de ônibus, carros de passeio e caminhões de todos os portes, conforme vimos aqui). 

Para que o mundo seja capaz de suportar esse aumento, será necessário que a energia utilizada na geração de eletricidade seja mais limpa e mais barata que a eletricidade obtida a partir dos combustíveis fósseis. Após a divulgação, em 9 de agosto, do relatório do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change, ou Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, estruturado pelas Nações Unidas para discutir cientificamente o assunto), o secretário-geral da ONU António Guterres disse que o relatório é"um alerta vermelho para a humanidade. Os alarmes são ensurdecedores e as provas são irrefutáveis".

Segundo o relatório BP Statistical Review of World Energy, elaborado pela multinacional do setor de óleo e gás British Petroleum (fundada em 1909 e com receitas estimadas em cerca de US$ 185 bilhões em 2020), quase 85% da energia consumida no mundo em 2019 foi gerada por combustíveis fósseis: petróleo (33%), carvão (27%) e gás natural (24%). As fontes renováveis ficaram com aproximadamente 15%: hidroelétrica (6%), nuclear (4%), eólica (2%), solar (1%) e biocombustíveis (1%).

Este perfil de geração de energia não é nem seguro nem sustentável, conforme dados de múltiplas fontes que foram consolidados pelo site Our World in Data. No aspecto da segurança, mortes causadas por acidentes e poluição causadas pelo carvão são impressionantes 1.230 vezes maiores que aquelas causadas por energia solar, enquanto há 263 vezes mais vítimas devido ao petróleo em comparação com a energia nuclear. Quando falamos de sustentabilidade – um tema cuja relevância segue em crescimento para empresas e indivíduos no mundo todo – os combustíveis fósseis são responsáveis por mais de 90% das emissões de gases causadores do efeito estufa quando comparados com fontes renováveis.

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Em um estudo de 2019 assinado por uma equipe liderada pelo químico atmosférico holandês Johannes Lelieveld e publicado no Proceedings of the National Academy of Sciences (desde 1915, a publicação oficial da Academia de Ciências dos EUA), foram estimadas que 3,6 milhões de pessoas ao redor do mundo morrem anualmente devido à poluição causada por combustíveis fósseis. Para efeito de comparação, de acordo com o Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME, ou Instituto para Avaliação e Mensuração de Saúde da Universidade de Washington), isso é mais que seis vezes o total de mortes causadas por homicídios, guerras e terrorismo em 2017, por exemplo. 

Por que, então, seguimos com uma matriz energética dominada por fontes não-renováveis? Até recentemente, a explicação econômica era a que fazia mais sentido: o custo da eletricidade gerada por combustíveis fósseis era menor que o custo gerado por fontes renováveis. Como isso mudou nas últimas décadas, e quais as oportunidades de negócios que essas mudanças apresentam serão os temas da nossa próxima coluna. Até lá.

*Fundador da GRIDS Capital e autor do livro "Futuro Presente - o mundo movido à tecnologia", vencedor do Prêmio Jabuti 2020 na categoria Ciências. É Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial

Opinião por Guy Perelmuter
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