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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Arrecadação maior do que a da reforma

Jair Bolsonaro quer arrecadar mais de R$ 1 trilhão com projeto que implica reavaliação do mercado de patrimônio declarado no Imposto de Renda

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Atualização:

O presidente Jair Bolsonaro deixou escapar mais uma ideia estapafúrdia. Quer arrecadar mais de R$ 1 trilhão, mais do que o ministro Paulo Guedes pretende arrancar com a reforma da Previdência em dez anos, com um esquema que implique reavaliação a mercado do patrimônio declarado no Imposto de Renda.

O capitão ainda procurou mostrar prudência a respeito do assunto, porque pediu que a Receita Federal estudasse o tema “com muito cuidado”. Mas não escondeu o entusiasmo: “Com certeza, será aprovado por unanimidade nas duas Casas do Congresso”...

Presidente Jair Bolsonaro no Planalto Foto: ADRIANO MACHADO/REUTERS

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Embora queira aumentar arrecadação, explica ele com estranha inocência (ou desconhecimento), não se trata de aumento de imposto, apenas de antecipação. Faltam pormenores sobre a proposta. Não se sabe quem teria assoprado essa esquisitice ao presidente. Uma das confusões consiste em pretender que valorização de patrimônio equivalha a aumento de renda e, portanto, constitua fato gerador de imposto.

Nessa toada, o proprietário acabaria por ter de vender seu pedaço de terra de um dia para outro para antecipar o recolhimento de um imposto futuro que, nesse caso, não iria acontecer porque a propriedade teria sido vendida antes de o futuro chegar. E se o imóvel não for vendido, como descontar a antecipação cobrada desse jeito?

Mesmo considerando a viabilidade da proposta e ainda se tratando de um imóvel, que critério usar para definir o valor atualizado de mercado? Será preciso recorrer a avaliadores profissionais? E as dívidas serão atualizáveis e dedutíveis do patrimônio positivo?

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Imagine-se agora que se trate de semoventes, bois, cavalos, cabras. Outra vez, que critério de avaliação adotar? O do boi gordo ou o do boi magro? Quem vai fiscalizar a procedência da avaliação transmitida à declaração?

A proposta é alcançar tanto pessoas físicas como empresas. Agora, imagine-se o que seria uma empresa ter de reavaliar seus ativos (incluindo-se aí os intangíveis, como marcas, pontos de venda, etc.) e, uma vez sendo isso possível, em seguida desovar milhares de reais do seu caixa para alimentar a voracidade do Fisco. O impacto sobre o capital de giro e sobre o emprego só poderia ser desastroso. Consequência previsível seria a fuga da indústria ou a desistência de investir no Brasil pelo capital estrangeiro.

O impacto não seria apenas no setor privado, mas também no setor público. É só pensar o que aconteceria com as finanças da Eletrobrás (e com suas usinas hidrelétricas) e da Petrobrás (com suas refinarias, reservatórios, oleodutos e tudo o mais).

Outra ideia velha de guerra, que nada tem a ver com essa maluquice, é instituir um imposto sobre patrimônio, e não nova aplicação do Imposto de Renda. Ainda na condição de senador, Fernando Henrique Cardoso chegou a encaminhar projeto de lei nesse sentido, que não foi adiante por sua inviabilidade técnica e política. Entre outras razões que tornariam esse imposto inviável, uma seria a inevitável debandada de capitais financeiros para onde não existissem garfadas desse tipo.

Talvez ainda mais esquisita do que a formulação da proposta tenha sido a repentina acolhida dos ouvidos presidenciais a essa coisa confusa.

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CONFIRA

» Baixa forte do petróleo

O mercado do petróleo enfrentou nesta quinta-feira uma forte onda vendedora. Ao longo do dia, a queda das cotações do tipo Brent ultrapassou os 5,0%, nível mais baixo desde março. O fechamento registrou queda de 4,1%. A principal razão desse tombo não foi a propalada intenção de alguns produtores da Opep de liberar mais produção, mas foi o aumento das tensões nas negociações comerciais entre Estados Unidos e China. Esse fator pesou mais do que a relativa distensão na crise entre os EUA e o Irã.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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