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''Ásia é o principal desafio do setor automotivo''

Rogelio Golfarb: diretor de Assuntos Corporativos para a Ford América do Sul; A crise que derrubou a maioria dos mercados oferece vantagem ainda maior ao produto asiático de baixo custo

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Mesmo com resultados melhores em relação a outros países, onde as vendas de carros despencaram, o Brasil "não está bombando" no mercado automobilístico, diz Rogelio Golfarb, diretor de Assuntos Corporativos para a Ford América do Sul e ex-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Para ele, os fabricantes devem se preparar para uma forte concorrência dos países asiáticos, principalmente a China, que mandará para cá seus excedentes de produção de carros prontos e principalmente de componentes para que os carros sejam apenas montados localmente. Manter investimentos para estar preparada para o pós crise é a alternativa, mas várias empresas estão adiando projetos. Qual o principal desafio do setor automobilístico neste momento de crise internacional e aparente calmaria no Brasil? O grande desafio do setor automotivo brasileiro nesta crise e no pós-crise será enfrentar a invasão dos produtos asiáticos. Sejam eles pura importação de produtos montados, ou a utilização de plataformas comuns aqui e na Ásia, que vão permitir o uso de peças asiáticas importadas num patamar de preço muito mais baixo. A crise derrubou todo mundo, mas deu vantagem competitiva aos países da Ásia, em especial a China, pois há uma busca maior por produtos de baixo custo. Como a indústria local vai enfrentar essa concorrência? Ela só pode ser combatida ou minimizada com a manutenção dos investimentos que trazem produtos competitivos, melhor produtividade, criatividade, inovação, lançamento de veículos em segmentos hoje ainda não atendidos. Neste momento é uma questão vital manter a capacidade de investimento porque o tsunami asiático está chegando e vai se acelerar com esse processo da crise, que trouxe um grande incentivo às vendas de produtos chineses, coreanos, asiáticos de maneira geral. Vamos enfrentar uma competição ainda muito mais dura. O setor suspendeu ou cancelou investimentos anunciados? Não tenho informação clara de quem fez ou não fez. Mas, com a redução da produção por causa da queda das exportações, e das margens de lucro pela necessidade de aumentos significativos dos descontos nas vendas e a própria restrição de crédito às empresas - que ainda não voltou ao normal -, é de se esperar que tenha havido sem dúvida uma redução de investimentos. Também é claro que a maior parte das empresas está fazendo o possível para manter os investimentos porque sabe que a competitividade é o melhor seguro para o futuro. Sem o corte do IPI, em vigor desde meados de dezembro, a situação do mercado seria diferente? Com certeza alguns investimentos foram de alguma maneira reduzidos, mas com a crise estariam muito mais reduzidos se não tivéssemos preservado o mercado interno. Se tivéssemos no Brasil uma queda nas proporções que estamos vendo no resto do mundo, da ordem de 30%, 35% das vendas, com certeza não estaríamos investindo o que ainda estamos investindo. O corte do IPI salvou o mercado brasileiro? Ajudou muito, mas há outros aspectos que vão além do mercado brasileiro. Um deles é a relação dentro do próprio Mercosul. A Argentina exporta para o Brasil por volta de 47% de sua produção. Ao preservar nosso mercado interno, preservamos também a produção da Argentina e sem dúvida nenhuma o mercado interno do Mercosul de uma maneira geral. A redução do IPI foi fundamental na manutenção das relações dentro do Mercosul, até porque o setor automotivo é a principal coluna do bloco. O governo já anunciou que vai prorrogar o corte por mais três meses, depois a alíquota voltará gradativamente. O senhor defende que a alíquota do IPI não volte mais aos patamares anteriores? Na nossa visão, o momento mais propício (para o fim da redução) seria no ano que vem porque a redução da taxa Selic ainda não se traduziu em redução da taxa de juros na ponta do financiamento automotivo nem no estímulo à economia. Este impacto vai chegar em seis a oito meses. Portanto, o ideal seria que a retirada total da redução do IPI ocorresse no momento em que a Selic começar a trazer um resultado real, ou seja, a redução na ponta dos juros fazendo o papel da redução do IPI. A indústria automobilística é uma das poucas que está se sobressaindo nesse momento, inclusive se comparada com outros mercados mundiais. As vendas internas, por conta da redução do IPI e dos descontos que as empresas estão oferecendo, estão nos mesmos níveis de 2008. Mas a produção teve uma queda de 14,5% até maio. As vendas internas de caminhões caíram 30% e as exportações, 67%. No geral, incluindo todos os segmentos, a exportação caiu quase 50%. É claro que estamos melhores do que outros países. No México, por exemplo, as vendas caíram 29%, nos Estados Unidos 36%, na Europa 14%, e na Argentina 34%. Mas não significa que estamos bombando pois certamente não vamos manter o ritmo atual de vendas. Como está a situação da Ford no mercado brasileiro? A Ford tem uma característica conservadora e costuma ser cautelosa na expansão de sua capacidade. Por causa disso, chegamos a perder mercado, mas essa estratégia mostrou-se propícia no momento da crise. Quando o volume de produção caiu, conseguimos atender o mercado e até aumentamos nossa participação de 9,5% para os atuais 11%. Do ponto de vista financeiro, não tivemos impacto tão grande, o que nos permitiu manter os investimentos.

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