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Ata do Copom se esforça para convencer que alta de meio ponto porcentual foi acertada

Analistas ouvidos pela Agência Estado dizem que ata não convence ao tentar justificar a alta da taxa Selic menor do que a esperada

Foto do author Francisco Carlos de Assis
Por Francisco Carlos de Assis (Broadcast), Flavio Leonel e da Agência Estado
Atualização:

A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, divulgada nesta quinta-feira, 28, parece reunir esforços para convencer os analistas do mercado de que elevar a taxa básica de juros em 0,50 ponto porcentual na semana passada foi a decisão mais acertada. Essa é a leitura que o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves fez do documento, segundo relatório distribuído hoje para clientes do banco. "A ata pode ser lida como um esforço de convencer os participantes do sistema de que a decisão de elevar a Selic em 0,50 ponto porcentual foi a mais acertada dentre as alternativas que se colocavam. Afinal, as expectativas dos analistas sugeriam total falta de coordenação em um sistema que busca a convergência", ironiza o economista.

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Para isso, avalia Lima Gonçalves, um dos caminhos usados foi assumir riscos na avaliação dos dados correntes e considerar dados na margem como sendo mais robustos do que usualmente a autoridade monetária faz. "Assim, boa parte da desaceleração do IPCA no período recente poderia ser vista como pontual, assim como pontual foi a piora no primeiro trimestre do ano. Escolher os núcleos na margem, e não em doze meses, como indicador privilegiado é outro exemplo. Eleger as vendas de varejo no conceito amplo (que inclui automóveis) e não no restrito (que subiu), um terceiro. E assim por diante", critica Lima Gonçalves. "Não há mais ambiguidade na influência do cenário internacional sobre o comportamento da inflação doméstica, o que há é um viés desinflacionário, apesar de países que se recuperam mais rápido manterem políticas fiscais e monetárias de contração. Agora o peso do G-3 é maior do que o comportamento dos 'comparáveis'", provoca o economista.

Lima Gonçalves acrescenta ainda, em seu relatório, que "as projeções de inflação nos cenários de mercado e de referência apontam melhora, na margem, para 2010 e 2011, mesmo quando resultados ficam acima do centro da meta. No cenário de mercado, 2011 está em torno do centro da meta e o primeiro semestre de 2012 foi incluído com projeção abaixo do centro da meta. Note-se que, em outros carnavais, a referência a dois anos adiante se fazia na ata da reunião de dezembro, e não em julho, e ao fim do ano e não o primeiro semestre."

O Copom, segundo o economista, vê uma reversão na deterioração do cenário prospectivo entre junho e julho. Ilustra tal melhora, continua ele, com a "redução significativa na dispersão das expectativas para a inflação plena; bem como nas próprias expectativas para a inflação de preços livres - o componente mais sensível e que mais rapidamente responde às ações de política monetária." "Aqui não fica absolutamente claro se os preços livres já estariam respondendo - sem muita defasagem - à política monetária ou se a alta dos compulsórios é política monetária ou se a política monetária pode ser aliviada pela queda antecipada de tais preços", contesta Lima Gonçalves.

Para ele, cabe perguntar o que aconteceu com a dispersão das expectativas para a taxa Selic e para o IPCA depois da reunião passada e da ata de hoje. De fato, conclui o economista, o Copom ainda vê riscos, ainda que decrescentes e restritos ao ambiente doméstico quando escreve na ata que "os derivados da expansão da demanda doméstica, em contexto de virtual esgotamento da margem de ociosidade na utilização dos fatores de produção. A propósito, evidências do estreitamento do mercado de fatores vêm dos ganhos reais de salários em alguns segmentos e de maiores pressões de preços ao produtor no passado recente."

Mas, para ele, prevalece a postura menos conservadora, confirmada na ata pelo trecho "(...) os fatores de sustentação desses riscos mostram desaceleração na margem. Note-se ainda, que há sinais de que a economia tem se deslocado para uma trajetória mais condizente com o equilíbrio de longo prazo, onde os efeitos desses desenvolvimentos sobre o balanço de riscos para inflação tendem a arrefecer."

Para o economista-chefe do Banco Fator, a ata não convence a respeito do estágio da desaceleração e do timing do ciclo de alta da Selic. "Dá a sensação de que alguém errou em algum momento, sem que fique muito claro do que se trata. Por outro lado, afinal, dirão que brigar por 0,25 ponto porcentual é bobagem, detalhe", diz o economista.

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Mas 0,25 ponto porcentual, segundo ele, é a diferença entre o ciclo de alta ter sido encerrado, uma vez que a expectativa de desaceleração não se reverterá tão cedo, e haver ainda alguma alta da Selic. "Uma coisa é a economia desacelerar, outra o IPCA convergir para o centro da meta no prazo relevante para a política monetária", critica Lima Gonçalves, para quem a inclusão do horizonte do primeiro semestre de 2012 é preocupante. "Trata-se apenas de uma referência para indicar para onde leva o cenário de mercado? Para atingir o cenário de mercado, porém, ainda falta uma alta de 1,00 ponto porcentual na Selic e uma improvável manutenção da mesma por muitos, muitos mesmo, meses", avalia.

Ainda de acordo com Lima Gonçalves, o Copom parece que querer convencer os analistas a fazerem uma revisão em suas projeções ou aceita um IPCA acima do centro da meta em 2011. "A inclusão do termo "eventualmente" no trecho a seguir não deve ter sido à toa", diz o economista, ao se referir à frase da ata que diz que "houve consenso entre os membros do Comitê sobre a necessidade de eventualmente se adequar o ritmo do ajuste da taxa básica de juros à evolução do cenário inflacionário prospectivo, bem como ao correspondente balanço de riscos."

Assim, afirma o chefe do Departamento Econômico do Banco Fator, a chance de o Copom elevar a Selic em 0,25 ponto porcentual em setembro e parar por aí aumenta muito. "Mas, se, na margem, o IPCA voltar a subir, o Copom deve tratar o processo de redução de riscos inflacionários como objeto de uma "sintonia fina" na política monetária. "Na nossa projeção, manter a Selic em 10,75% até o fim de 2011 elevaria o IPCA a 4,80%. Achamos que o Copom vai correr o risco. O mais provável é uma alta simbólica de 0,25 ponto em setembro, embora não faça diferença material quanto às projeções", avalia.

Fim do ciclo de ajustes deve estar próximo

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O economista-chefe do Banco Safra de Investimento, Cristiano Oliveira, afirmou, depois de ler a ata da reunião de julho do Comitê de Política Monetária (Copom), que o encerramento do ciclo de ajustes para cima que o Banco Central vem adotando para a taxa básica de juros desde abril está muito próximo. Em relatório específico sobre o tema divulgado a clientes e à imprensa, ele destacou que setembro é o mês provável para o fim do ciclo, mais precisamente com um ajuste de 0,25 ponto porcentual na Selic.

Se confirmada a estimativa do economista, haveria, portanto, um segundo movimento de desaceleração no ritmo de alta dos juros, já que, em julho, para surpresa dele e da maioria dos analistas do mercado financeiro, o Copom elevou a Selic em 0,50 ponto porcentual. Na ocasião, a aposta majoritária era que fosse dado o terceiro aumento consecutivo de 0,75 ponto porcentual desde o encontro do comitê em abril.

"A ata não sinaliza que o ciclo de aperto monetário acabou, mas sinaliza que está muito próximo do fim", disse Oliveira. "Dado o fluxo de indicadores (atividade e inflação) e notícias até a próxima reunião do comitê em 1.º de setembro, julgamos que o cenário mais provável é de nova redução do ritmo de alta para 25 bps (basis points), conjuntamente com a sinalização do final de ciclo", salientou.

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Para o economista-chefe do Safra, a maior parte do documento divulgado nesta quinta-feira pelo Banco Central adotou um tom mais leve, ou "dovish", por conta de um "viés desinflacionário", que justifica a mudança no ritmo de elevação nos juros feita em julho. Além deste detalhe e em sintonia com outros analistas ouvidos pela Agência Estado, ele chamou a atenção para o texto indicar a convergência da inflação às metas em 2012, em vez da referência mais tradicional adotada pelo BC, que é o ano seguinte.

Mesmo com o tom mais "dovish" citado, Cristiano Oliveira ressaltou que, especificamente no parágrafo 20, o BC adotou uma postura um pouco mais dura, ou "hawkish". Tudo porque, neste trecho, a autoridade monetária ainda relembrou a preocupação com a evolução do hiato do produto no País. "Apesar da desaceleração na margem, o nível ainda é, em nossa visão, desfavorável para o cenário prospectivo para a inflação", opinou.

Quanto ao ano de 2011, o economista-chefe do Banco Safra de Investimento trabalha com a estimativa de possibilidade de retomada de um ciclo de alta para a Selic. Segundo ele, o BC deverá levar os juros para um intervalo de 12,25% a 12,50% ao ano, ao longo do primeiro semestre do próximo ano.

 

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