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Banco só poderá oferecer consignado depois de seis meses de aposentadoria

Novas regras para oferta de empréstimo para aposentados do INSS tentam reduzir reclamações e fraudes

Por Douglas Gavras 
Atualização:

Quando toca o telefone da aposentada Maria de Fátima Lima, de 63 anos, a família já desconfia: deve ser oferta de crédito consignado. Ela, que nunca tomou um empréstimo, recebe dez ligações por dia de bancos e financeiras. 

“Já pedi várias vezes para me tirarem da lista dos serviços de telemarketing. Da última vez, a atendente disse que eu deveria aceitar o crédito, mesmo sem estar endividada ou doente, porque nunca se sabe o dia de amanhã. Fiquei tão revoltada, que falei para ela ir agourar outra pessoa.”

O advogado Aloisio Medeiros teve documentos falsificados por alguém que tentou fazer um consignado em seu nome Foto: Gabriela Bilo/Estadão

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Nesse mercado, o assédio ao consumidor é bem comum. Em muitos casos, os aposentados começam a receber telefonemas, mensagens de texto e correspondências antes mesmo de o INSS informar que a aposentadoria foi aprovada.

Justamente por ser uma opção de empréstimo de baixo risco, a oferta do produto é farta e, muitas vezes, incômoda. A partir deste ano, no entanto, os bancos, financeiras e correspondentes que oferecem crédito consignado aos aposentados vão precisar esperar seis meses após o início do recebimento do benefício para vender o serviço.

As reclamações constantes dos aposentados fizeram o INSS publicar em dezembro uma instrução normativa determinando que as empresas só poderão oferecer crédito antes do prazo de seis meses se o segurado for pessoalmente ao banco onde tem conta para pedir o desbloqueio. Ainda assim, o consumidor precisa esperar ao menos 90 dias após o recebimento do primeiro benefício para fazer um consignado. 

As novas regras foram publicadas em dezembro, mas começam a valer 90 dias depois. A instituição que descumprir a norma vai ser notificada e pode ter o contrato rescindido.

Para o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), este é um problema antigo, que o INSS tenta resolver. A presidente da entidade, Adriane Bramante, aponta que muitos segurados, por falta de informação, aceitam o contrato sem saber que se trata de um empréstimo.

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Já o diretor da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), Alex Sander Gonçalves, pondera que o prazo de seis meses até o início da oferta de consignado pode ser ruim para o consumidor. “O cliente, muitas vezes, espera a aposentadoria para conseguir um crédito mais barato.”

A demora na recuperação da economia e o crédito escasso fizeram a busca por esse tipo de operação explodir. Entre janeiro e novembro do ano passado, o volume de consignados do INSS concedidos foi 18,6% maior que no mesmo período de 2017. É que para aposentados e pensionistas, os juros não ultrapassam 2,08% ao mês, ou 28,02% ao ano.

Para se ter uma ideia do quanto o consignado é atrativo, entre as principais linhas de crédito livre para pessoas físicas, os juros do cheque especial eram de 305,7% ao ano em novembro. 

Fraudes

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Na avaliação de especialistas, o prazo de seis meses para que as empresas comecem a ofertar o crédito consignado também pode ajudar a reduzir o número de fraudes, já que os recém-aposentados costumam ser alvos mais fáceis das quadrilhas. Entre o início de 2016 e o primeiro semestre do ano passado, a ouvidoria do INSS recebeu 97 mil reclamações de consignados.

O aposentado Aloisio Medeiros, de 65 anos, foi uma das vítimas. Ele teve os documentos falsificados por um homem que tentou fazer um empréstimo em seu nome. “A minha sorte é que o gerente do banco desconfiou. Até hoje não sei como tinham todos os meus dados.”

Uma reportagem publicada pelo Estado há dois anos mostrava que há um mercado paralelo de vendas de planilhas com informações pessoais – como CPF, telefone, número do benefício e motivo da aposentadoria. Em um site de venda de eletrônicos, os dados de cada aposentado saíam por menos de R$ 0,10. 

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Gonçalves, da ABBC, diz que as empresas são orientadas a não usar bases de dados para contatar aposentados.

A Febraban, que representa os bancos maiores, afirma que as empresas trabalham para garantir o sigilo de dados. “No caso de fraude, colaboramos com autoridades policiais e Procons, para coibir eventuais irregularidades.”

A Previdência, por sua vez, informa em seu site que recebe denúncias pelo telefone 135 e que não fornece dados pessoais dos segurados a terceiros. O INSS também lembra que o aposentado pode, a qualquer momento, bloquear o benefício para que não sejam feitos empréstimos em seu nome. Basta ir a uma agência da Previdência Social e solicitar o serviço.

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