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Bancos já pensam em abrir mão de resgate

Regras rígidas assustam instituições que receberam dinheiro do governo

Por Stephen Labaton e WASHINGTON
Atualização:

A lista de exigências está cada vez maior. As instituições financeiras que estão recebendo ajuda financeira do governo terão de adiar as ações de despejo e modificar as condições das hipotecas dos proprietários de imóveis em dificuldades financeiras. Têm de deixar os acionistas se manifestarem por meio de voto sobre os pacotes de remuneração dos executivos. Têm de cortar os dividendos, acabar com os treinamentos de funcionários, além de eliminar as ofertas de emprego para estrangeiros. Como a sociedade fica cada vez mais indignada com o custo crescente do pacote de ajuda para as instituições financeiras, o governo Obama e os legisladores estão adicionando mais e mais restrições. Essas condições são necessárias para evitar que os executivos de Wall Street continuem a receber pródigas bonificações, é o que dizem alguns especialistas. Para outros, porém, essas condições vão além de proteger o contribuinte, e já beiram a engenharia social. Para alguns banqueiros, os requisitos impostos são tão onerosos que eles pretendem devolver o dinheiro. Desse grupo fazem parte bancos de pequeno porte, como o TCF Financial Corporation, em Minneapolis, e também gigantes como Goldman Sachs e Wells Fargo. Eles dizem que planejam retornar o dinheiro o mais rápido possível. Na terça-feira, o Signature Bank, de Nova York, informou que, por causa das novas restrições à remuneração dos executivos, já notificou o Tesouro que vai devolver os US$ 120 milhões recebidos há apenas três meses. Uma das maiores preocupações é que o programa de estímulo permite ao Congresso e à administração estabelecerem novas restrições a qualquer momento. As exigências para os bancos recalcularem as hipotecas e evitarem os despejos são particularmente onerosas, segundo alguns executivos. De acordo com um funcionário do Tesouro, que participou da preparação do novo pacote de ajuda financeira, o governo estaria tentando evitar qualquer prejuízo aos bancos, oferecendo incentivos financeiros para o recálculo das hipotecas. Disse ainda que as restrições são parte de um esforço mais amplo para limpar os balancetes e ajudar a economia. Mas um grupo cada vez maior de especialistas do setor vem alertando que as exigências para que bancos mais fracos implementem as políticas sociais e econômicas do governo, pode exaurir ainda mais o erário público. Segundo esses especialistas, a ajuda financeira, embora útil a curto prazo, pode obrigar os bancos a adotar práticas de empréstimo que podem provocar mais prejuízos ainda, e o governo inevitavelmente vai interferir ainda mais, ditando o modo como os bancos devem operar. "Honestamente, acho que as pessoas no poder que estão promovendo essa política acham que ela vai ser boa para todos, para o setor bancário, os proprietários de imóveis e os demais", disse Douglas J. Elliott, um ex-banqueiro de investimento. "Mas é um terreno escorregadio e pode haver consequências negativas potencialmente graves." Foi o caso das empresas Fannie Mae e Freddie Mac, hoje sob controle do governo. Nos últimos meses, as duas instituições gastaram bilhões comprando uma grande quantidade de hipotecas paras as quais não existe nenhum outro comprador, e permitiram aos proprietários de imóveis refinanciarem seus empréstimos - mesmo não tendo nenhum patrimônio. Essas determinações são ecos da década de 90, quando Fannie e Freddie tentavam equilibrar mandatos conflitantes que, de um lado, exigiam que elas contabilizassem lucros para os acionistas e, de outro, cumprissem com uma missão pública de fazer crescer o número de proprietários de casas. A serviço dos acionistas e do que se afirmava ser o bem público, essas instituições se endividaram muito comprando e mantendo hipotecas nos próprios portfólios de investimento. Pelo fato de ter um mandato público, elas também tinham uma linha de crédito junto ao Tesouro e as suas estratégias comerciais arriscadas eram garantidas pelo governo. Mas quando os compradores de imóveis começaram a faltar com os pagamentos e os preços das casas despencaram, as duas companhias quase faliram e, no ano passado, passaram para a tutela do governo. Para Elliott, alguns bancos que participam do programa de ajuda financeira estão agora na mesma posição conflitante em que se encontraram Fannie Mae e Freddie Mac. No auge da crise das instituições de empréstimos pessoais e poupança, nos anos 80 e 90, o Congresso e as agências reguladoras adotaram regras, conhecidas como "ação corretiva imediata", segundo as quais o governo fecharia imediatamente instituições financeiras frágeis que não conseguissem levantar dinheiro para absorver os prejuízos cada vez maiores. Essas novas regras foram uma resposta à noção de que manter instituições fracas em operação por mais tempo, com base numa antiga prática de se dar sempre um prazo de tolerância, prejudicava os bancos saudáveis que se viam competindo com os subsidiados pelo governo, e isso acabava desestabilizando o sistema bancário. Fechando instituições fragilizadas antes dos prejuízos aumentarem, a ação corretiva imediata também era considerada o recurso mais barato para os contribuintes e para o fundo de seguro de depósitos. Segundo autoridades do governo, alguns bancos com problemas no momento são grandes demais para que o governo passe a controlá-los, o que torna as comparações com a crise das instituições de crédito e poupança menos sugestivas. Além disso, a indignação pública com custo cada vez maior dessa ajuda financeira torna politicamente imperativo que se exerça um maior controle da maneira como o dinheiro está sendo gasto. Mas com os bancos mais frágeis ainda em operação, os mercados continuam despencando e os custos para o contribuinte aumentando, dizem especialistas do setor. "É provável que a política atual provoque, como resultado, bancos ainda mais frágeis", disse L. William Seidman, que trabalhou com os órgãos reguladores na confecção dos planos de ajuda financeira para as instituições de empréstimo pessoal e poupança. Alguns banqueiros de pequenas localidades, cujas instituições são mais fortes do que grandes bancos dos centros financeiros, concordam. C.R.Cloutier, presidente do MidSouth Bank de Lafayette, Louisiana, disse que o seu banco recebeu US$ 20 milhões do fundo de ajuda, porque ele e sua diretoria acreditavam que era um ato patriótico que os ajudaria a oferecer empréstimos durante uma recessão. Mas, diante do que chamou de estigma de participar do programa do governo, e as novas restrições impostas aos bancos ajudados, ele está pensando em devolver a verba recebida, como outras instituições pretendem fazer. "Duas coisas você aprende na atividade bancária", disse Cloutier. "Em primeiro lugar, a concentração é ruim. Temos hoje 64% dos depósitos em 8 instituições. A segunda regra é, seu primeiro prejuízo é a sua maior perda. Pare por aí. Não desperdice água com peixe morto."

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