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Barreiras ao crescimento

 Retomar o crescimento econômico é o maior desafio a ser enfrentado pelo futuro governo a partir de 2015. O governo Dilma fracassou em sua política econômica e o crescimento médio no período 2011/2014 pode ficar em 1,9% ao ano. Esse nível é inferior ao da fase negra da economia brasileira que ocorreu de 1981 a 2003, quando o País amargou crescimento anual médio de 2,0%.

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Por Amir Khair
Atualização:

Vale informar que no período de forte crescimento econômico que perdurou nos primeiros oitenta anos do século XX o País cresceu 5,7% em média por ano. Nesse período, a população crescia em média 2,4% e o crescimento por habitante registrou 3,2% ao ano.

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Na fase negra, o crescimento por habitante foi de 0,2% ao ano e, no período 2004/2010, que contempla forte crescimento mundial no período pré-crise e três anos de influência da crise (2008/2010), esse crescimento por habitante foi de 3,3% ao ano, nível até acima dos anos dourados dos primeiros oitenta anos do século passado. No período do governo Dilma, porém, devido ao menor ritmo de crescimento populacional, estimado em 0,8% ao ano, o crescimento por habitante pode ser de 1,1% ao ano, ainda acima do período negro.

O desafio ao novo governo é voltar ao crescimento de 3,3% ao ano que ocorreu sob o governo Lula a partir de 2004. Para isso, o País precisaria crescer no mínimo 4% ao ano, que é um nível abaixo do que ocorre nos países emergentes, de 5%, mas acima do mundial, de 3%.

Mas como enfrentar esse desafio? Uma corrente entende que está esgotado o modelo de crescimento baseado no consumo e que o carro-chefe do crescimento deve ser o investimento, que deveria alcançar 22% do PIB para dar sustentação ao crescimento.

Creio que a política econômica não pode cair mais uma vez na armadilha da oposição entre consumo e investimento. Essa armadilha consiste em caracterizar como saturado o consumo devido ao excesso de endividamento das famílias e que é necessário reduzir a expansão do consumo para abrir espaço ao investimento. 

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Na realidade, consumo e investimento interagem positivamente. O crescimento do consumo atrai o investimento para atendê-lo e o crescimento do investimento gera maior atividade econômica com reflexo no emprego e na massa salarial, abrindo novas perspectivas de consumo. 

Se não há oposição entre consumo e investimento, e se eles interagem positivamente, o mais lógico é estimular ambos. Para isso, é necessário remover as barreiras que atravancam o desenvolvimento de cada um deles.

Barreiras. As principais barreiras ao consumo são: taxas de juros do sistema financeiro, má distribuição de renda e tributária, alto custo de vida para atividades essenciais, e baixo valor dos programas de renda. Vejamos: segundo a Associação dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa de juros do sistema financeiro foi de 100,31% em abril para financiamentos em doze meses, ou seja, dobra o preço dos bens para quem usa o crediário. Esse é a principal barreira ao consumo. 

Apesar do avanço ocorrido nos últimos anos com o salário mínimo e programas de renda, persiste a histórica má distribuição de renda, que reduz/alija do consumo as camadas populares. A carga tributária, altamente regressiva, pune a baixa renda, pois a onera em 49% dos seus rendimentos. A forte tributação do ICMS eleva em pelo menos um terço os preços dos combustíveis, energia elétrica e comunicações. Outra barreira ao consumo é o alto custo das atividades essenciais, como o transporte coletivo, energia, água e esgoto, comunicações, gastos com saúde, educação, habitação e alimentação, que reduzem a renda disponível para o consumo de bens e outros serviços.

As principais barreiras aos investimentos são: baixo crescimento econômico, Selic elevada, juros para as empresas do sistema financeiro, alta carga tributária, câmbio apreciado, mudanças frequentes de regras, falta de plano estratégico ao País e expectativas desfavoráveis aos negócios. 

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Talvez a principal barreira seja o baixo crescimento econômico, que é causa e consequência do baixo nível de investimentos. O empresário investe quando vê perspectivas para as vendas dos seus produtos e/ou serviços que possam demandar mais do que sua capacidade ociosa. Quando a economia anda de lado, a prudência recomenda não se expor ao risco de não conseguir ampliar o faturamento, tendo ainda de arcar com os investimentos e despesas consequentes. 

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Outra barreira é a alta taxa básica de juros, que oferece rentabilidade sem risco e liquidez imediata. Muitas vezes, vale mais a pena investir em títulos do governo federal do que em empreendimentos sujeitos a chuvas e trovoadas da crescente disputa por mercados. As empresas que necessitam tomar empréstimos junto ao sistema financeiro têm seu fluxo de caixa punido pelos elevados encargos financeiros que advêm das taxas de juros, que, segundo a Anefac, atingiram em abril 49,19% ao ano. 

A pesada carga tributária, especialmente devido ao ICMS, eleva preço dos bens reduzindo a demanda e inibindo a expansão dos investimentos. O câmbio historicamente apreciado desde 2004, apesar da depreciação ocorrida a partir de 2012, ainda se encontra fora de lugar, prejudicando as empresas face à dura concorrência com os produtos estrangeiros. Por outro lado, em resposta à crise iniciada em 2008, os governos dos países desenvolvidos produziram forte desvalorização de suas moedas para ampliar as vendas externas e compensar a parada no mercado interno. O câmbio que pode permitir condições normais de competição é próximo a R$ 3,00/US$, nível que permite maior equilíbrio nas contas externas.

Outra barreira aos investimentos é a constante mudança de regras que promove o governo, gerando insegurança para decisões que visam o longo prazo. A falta de plano estratégico impede a visão de longo prazo essencial ao investimento. A existência do plano faculta ao empresário cotejar seu negócio com o que o governo pretende realizar no médio e longo prazos. 

Todas as barreiras mencionadas acabam por desaguar em expectativas desfavoráveis aos negócios, e isso é o principal indicador contrário a novos riscos com investimentos. Remover essas barreiras é essencial para aproveitar o potencial do mercado interno, condição necessária para enfrentar estrategicamente a dura disputa internacional. Felizmente, tem muita coisa que pode ser mudada e pode ser feita sem grandes dificuldades.

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*Mestre em finanças públicas pela FGV e consultor

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