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BC americano vai mal, o nosso vai bem

Por Alberto Tamer
Atualização:

Juro praticamente zero nos Estados Unidos. O Federal Reserve (Fed, obanco central americano) está nu, segurando tangas esfarrapadas que não encobrem nada.Acabou a munição monetária para animar a economia entorpecida. Ao contrário do nosso Banco Central, que tem muita bala, mas ainda hesita em se despir, só lhe resta agora criar e inundar o mercado com uma enxurrada de dólares e garantir dívidas de retorno duvidoso. Corre o risco de afogar-se lá na frente, quando a economia retomar o rumo e a inflação voltar. Mas esse é um problema que vai surgir no futuro. Não incomoda nem um pouco agora. Primeiro, é preciso não se afogar no mar turbulento.Depois, navegar. DÓLARES E DÓLARES TAMBÉM E é isso o que o Federal Reserve já vem fazendo: mais de US$ 1 trilhão, desde setembro. E sabe que terá de dobrar. É o gesto heróico do dinheiro fácil para situações dramáticas. O último tiro que, mesmo assim, corre o risco de errar, pois o alvo está nublado. Vai inflacionar? Por enquanto, não. Agora, é evitar a depressão. A inflaçao está recuando, menos 1,7% agora, com a desacelaração da demanda e a queda das commodities agrícolas e o petróleo.Grandes lojas de departamentos tradicionais estão oferecendo 50% de desconto para compras acima de US$ 250. Ou seja, a metade do preço e nem assim as vendas reagiram na véspera das festas de fim de ano. O consumidor está cauteloso, teme perder o emprego ou ver reduzido o seu salário. O que ele ganha com a queda dos preços não afasta a insegurança no trabalho. Afinal, milhares já estão sendo despedidos e tentando encontrar um novo emprego. Pela primeira vez que se tem memória, o índice de poupança dos americanos, que era zero, está registrando alguns pontos acima de traço. O JOGO DO ESPERA Está todo mundo esperando Barack Obama - o presidente eleito dos Estados Unidos -, que espera Henry Paulson - o secretário americano do Tesouro-, que espera Obama... que sonha em tirar férias nas praias do Havaí. O resultado é soma zero. E ninguém faz nada. Todo mundo espera o dia 20 de janeiro, tão próximo, mas ainda tão distante. E, enquanto isso, a economia americana afunda à espera de um Obama, aflito e desencantado com o fim do governo de George W. Bush. O Congresso tem um novo pacote pronto de US$ 600 bilhões, mas Bush nem quer falar dele.Também deve estar sonhando com as maravilhosas praias havaianas. BRASIL ATÉ ESNOBA Aqui, mesmo num cenário mais ameno, o governo já está adotando as medidas que os Estados Unidos e a Europa adiam, mesmo estando em recessão. O governo já aprovou medidas que reduzem os impostos dos bens de consumo, dos bens duráveis e não-duráveis, injetam vultosas quantias de recursos nos bancos para levá-los a financiar as empresas e a emprestar mais. Além disso, o BNDES, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal entraram ativamente no mercado, municiados por recursos do Estado. Uma boa parte das exportações estão sendo financiadas pelas instituições do governo. Nós nos antecipamos a eles, prevendo o que já está vindo. Por que essa diferença de reação? Primeiro, deve-se à agilidade do BC de prever e preparar-se para absorver os efeitos da falta de crédito externo. Henrique Meirelles e seus técnicos mostraram grande competência e maturidade. Segundo, foi mais fácil para o BC e o governo brasileiro reagirem porque não tínhamos os terríveis desafios dos bancos europeus e americanos. Direta (EUA) e indiretamente (Europa), eles sofreram os efeitos da imprudência e ganância, do subprime imobiliário. Aqui, se houver, quando muito, pode ser subprime no financiamento de carros e motos. Não há como comparar. Outro fator positivo, já conhecido do leitor desta coluna, crescíamos ainda, com os demais emergentes, enquanto eles afundavam. Demoraram para agir por incompetência (zona do euro) ou imprudência das autoridades monetárias. Isso foi agravado pelo vendaval destruidor da desvalorização dos ativos imobiliários, que ainda persiste. MAS CUIDADO A nossa situação mais favorável tem bases frágeis, um mercado interno suscetível e forte retração, principalmente, em caso de desemprego. Eles têm vários pilares de sustentação, nós apenas um. Eles têm economias maduras de US$ 28 trilhões somados, 50% do PIB, e um mercado interno e externo bem formado. Nós, com US$ 1,3 trilhão, representamos apenas 2,3%. Mais ainda, daquele valor, mais de 60% são representados pelo mercado interno. Dependemos pouco do comércio exterior. No entanto, o que é às vezes apontado com uma vantagem, menos dependência externa, torna-se uma desvantagem considerado o relativamente baixo poder aquisitivo dos brasileiros e a fragilidade de um mercado interno ainda incipiente. Ele está sendo sustentado mais pelo crédito do que pela renda. Essa é a nossa fragilidade em relação aos outros. Os Estados Unidos podem renascer com um empurrão fiscal porque partem de uma base sólida. Nós vamos precisar muito mais empurrões, de um governo que tem recursos limitados. Estamos até bem em relação a eles, mas não tanto em relação a nós mesmos e aos nossos desafios. *E- mail: at@attglobal.net

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