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Com cenário externo, BC deve reduzir juros em 0,5 ponto e deixar a porta aberta para novos cortes

Atual economista-chefe do UBS Brasil, Volpon diz que o BC erra ao optar por comunicar diariamente qual instrumento e em que volume vai atuar no câmbio

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Por Eduardo Rodrigues
Atualização:

BRASÍLIA - Ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, o economista Tony Volpon criticou a análise do cenário global feita pelo Comitê de Política Monetária (Copom) que praticamente deu por encerrado o ciclo de corte na taxa básica de juros.

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Atual economista-chefe do UBS Brasil, Volpon defende um novo corte na Selic deste mês - dias 17 e 18 -, com possibilidade para outra queda diante do cenário internacional.

Para ele, a autoridade monetária deveria mostrar ao mercado qual o arsenal que tem para controlar o dólar, tanto em vendas de reservas como em operações de swap (que equivalem à venda no mercado futuro). Diz que o BC erra ao optar por comunicar diariamente qual instrumento e em que volume vai atuar no câmbio, sem mostrar ao mercado qual o volume total que tem disponível.

Após o carnaval, o BC negociou US$ 7,5 bilhões em operações de swap cambial novo, mudou a estratégia para a venda à vista de US$ 5,5 bilhões em leilões no começo desta semana, e retomou a oferta de swaps com US$ 1 bilhão nesta quarta-feira.

Tony Volpon, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central Foto: Amanda Perobelli/Estadão - 27/7/2017

Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

O mercado já dá como certo um novo corte na taxa Selic na reunião do Copom da próxima semana. O BC deve sinalizar no comunicado alguma posição para a reunião seguinte (5 e 6 de maio), ou deixar a porta aberta é o mais prudente?

O BC tem que votar com prudência e cuidado. A situação mudou radicalmente desde o último Copom (4 e 5 de fevereiro). A ata da reunião passada chegou a dizer que o cenário externo era positivo para as economias emergentes, mesmo depois do início da epidemia na China. Achei estranho e disse publicamente. Acho que o BC deve cortar a Selic em 0,50 p.p. na próxima reunião. E como, obviamente, a situação ainda é muito fluida, o Copom não deve sinalizar nada para a reunião seguinte. O BC deve deixar a porta aberta para cortes de juros adicionais no futuro, caso seja necessário. Acredito que deve haver um novo corte de 0,25 p.p. na reunião de maio, com a Selic chegando a 3,5% ao ano, que é a nossa projeção. Mas a situação ainda é muito fluida e pode mudar.

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Como o espaço fiscal para conceder estímulos à economia é inexistente, a política monetária e cambial ganharam mais força no enfrentamento da crise?

Infelizmente temos tido déficits primários desde 2014, com alguma melhora nesses últimos anos, mas ainda com déficits. Por não ter completado o ajuste fiscal, não temos espaço relevante para gastos novos. Isso dito, acho que deveria haver uma dotação emergencial para a área de saúde, o que é já é permitido dentro da regra do teto de gastos (que impede que gastos subam em ritmo superior à inflação). O Brasil deveria estar se preparando para a possibilidade de um surto epidêmico como estamos vendo em países como a Itália.

Há um debate sobre mudanças no teto de gastos, o que demandaria uma nova emenda à Constituição...

Há um debate sobre o teto de gastos até com algumas pessoas advogando o abandono da regra. Pessoalmente tenho algumas restrições a mecanismos da regra do teto de gastos e como ela foi desenhada, mas ao mesmo tempo reconheço que ela tem funcionado como uma âncora fiscal sobre as expectativas dos agentes, o que permitiu a queda dos juros que o BC tem praticado desde 2016. Não devemos de forma alguma tocar na regra do teto agora. Acredito que devemos mexer no teto apenas em uma situação mais calma, tanto do ponto de vista dos mercados, quanto do ajuste fiscal. Idealmente, só devemos mexer na regra do teto quando já estivermos com superávits fiscais. Qualquer tentativa de mexer na regra agora daria uma sinalização muito ruim para os mercados e poderia constranger o BC a fazer o que ele deve fazer, que são cortes adicionais na Selic.

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O ministro da Economia, Paulo Guedes, diz estar sereno diante dos problemas mundiais e defende que o andamento das reformas seria suficiente para aplacar os efeitos da crise no Brasil. O senhor concorda com isso?

De fato, essa é uma crise externa, decorrente do surto de coronavírus, da queda do preço do petróleo e da possibilidade de recessão global. Seria muito importante que governo e o Congresso - o Estado, falando mais amplamente - conseguissem colocar notícias boas na mesa para contrapor as más notícias que vêm do exterior. Perdeu-se um pouco o ímpeto das reformas nesse início do ano em função da discussão sobre o orçamento impositivo e os efeitos políticos que isso gerou, como os protestos marcados para domingo (15). Perdeu-se o fio da meada das reformas em função disso, mas espero que na próxima semana possamos voltar a colocar as reformas como pautas prioritárias. A PEC Emergencial (que permite, entre outras coisas, o corte de salários de servidores públicos) deve ser a prioridade porque, junto com a reforma da Previdência, é o que dá sustentabilidade para que a regra do teto de gastos sobreviva nos próximos anos, pelo menos até a próxima eleição presidencial. Isso dará um espaço adicional para o BC continuar cortando juros.

O BC já deveria ter anunciado um programa mais amplo de venda de reservas para conter a volatilidade no câmbio, ou essa cautela da autoridade monetária é a estratégia mais adequada no momento?

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Sou favorável à ideia de um programa, porque ele teria efeito sobre as expectativas. O programa é bom porque coloca uma quantia de dólares em um prazo definido. Você sempre pode dizer que isso é uma intenção e não uma promessa. É uma intenção, a depender da demanda do mercado. Anunciando isso antecipadamente, você tem um efeito de credibilidade sobre as expectativas que acalma os ânimos especulativos. Ninguém está comprando dólar hoje porque acha que está barato, mas sim para a proteção de alguma posição patrimonial. O BC tem a capacidade de prover essa proteção e o anúncio do programa acalmaria as pessoas sobre a necessidade de correr atrás disso agora. Por isso, na atual situação, sou favorável a um programa e não a esses movimentos pontuais que o BC tem feito.

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