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''Belo Monte virou uma estatal''

Consultor, que é a favor da construção da hidrelétrica, acha que o leilão deveria ficar[br]para o próximo governo

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Por Fernando Dantas
Atualização:

ENTREVISTASAdriano Pires,presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura

QUEM É

É diretor-fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). É economista com mestrado em Planejamento Estratégico pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e doutor em Economia Industrial pela Universidade Paris XIII, França. É consultor de energia e negócios.

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O consultor Adriano Pires, presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), é a favor da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, mas contra a forma como o projeto está sendo tocado. Para Pires, o governo está estatizando Belo Monte, o que trará perdas para a sociedade. Ele defende o adiamento do leilão para o próximo governo. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O sr. é a favor da construção de Belo Monte?

Sim, vale a pena ser feito. É um projeto importante para o sistema elétrico brasileiro. O Brasil vai precisar de muita energia, se a gente pensa que o País vai crescer 6% ao ano. Vamos precisar de energia de preferência não muito cara e que emita pouco carbono.

O sr. é a favor de Belo Monte, mas contra a forma como o governo está tocando o projeto. Por quê?

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O governo, ao estipular a tarifa-teto de 83 megawatts-hora e os R$ 19 bilhões de investimento, transformou Belo Monte numa peça de campanha da ministra Dilma (Rousseff). Todo mundo sabe, no setor, que com essa tarifa e esse nível de investimento não se constrói Belo Monte. Tanto é verdade, que já houve a desistência de um consórcio liderado pela Odebrecht e pela Camargo Corrêa, que são duas das empreiteiras que mais conhecem o sistema de hidrelétricas no Brasil e o risco de uma obra como essa. Elas desistiriam porque não havia viabilidade econômica diante desses preços que o governo colocou.

Mas como o governo vai conseguir fazer Belo Monte?

Belo Monte está virando uma estatal. Basta olhar o pacote de bondades que o governo está fazendo. No consórcio em que o líder privado é a Andrade Gutierrez, a Eletrobrás tem 49% do total. No outro consórcio, que foi criado sexta-feira passada, às pressas, por um grupo de empresas que têm muito pouca tradição e conhecimento para fazer uma obra desse tamanho, a líder do consórcio é a Chesf, que também é Eletrobrás, com 49,95%. Se olhar o BNDES, ele vai financiar 70% do custo da obra, que são R$ 13,5 bilhões. É o maior financiamento da história do BNDES para projeto de infraestrutura. A Sudam também já anunciou que vai isentar durante dez ou 15 anos Belo Monte de pagar Imposto de Renda. E o governo já disse que, quando houver o consórcio vencedor, alguns fundos de pensão estatais vão entrar para viabilizar a obra.

E qual a implicação disso que o sr. chama de estatização?

Se pegar tudo isso, essa tarifa de 83 MW hora não é de verdade. Se internalizar na tarifa esse pacote de bondades do governo, isso vai para R$ 90 a R$ 100 reais o MW hora.

Quais são as consequências desse modelo?

Primeiro, o governo não precisaria entrar com tanta força num projeto desse tipo. Se ele desse um preço realista da energia, haveria uma participação muito maior das empresas privadas, e o risco da obra seria muito mais delas. Há setores bem mais carentes desses recursos do que o de energia elétrica, tais como saúde, educação, etc. Um segundo ponto é que a gente sabe que o governo não sabe gastar direito. Assim, não vai custar os R$ 19 bilhões, talvez nem os R$ 30 bilhões que o empresariado privado menciona. Pode custar muito mais.

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O que o sr. acha que deveria ser feito nesse ponto? E como vê a questão ambiental?

Belo Monte, em termos ambientais, foi toda revista, com redução da área de alagamento, e dando como contrapartida R$ 2 bilhões para atender as pessoas naquela região por possíveis danos ambientais. Comparando os benefícios de Belo Monte para o Brasil com o custo ambiental, acho que o governo, nessa questão, está agindo de maneira correta. Mas, dado todo o grau de complexidade, o correto seria deixar a licitação para o próximo governo.

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