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Cientista político e economista

Opinião|Biden e o Brasil

As questões econômicas entram em jogo conforme ambos os países buscam repensar estratégias anteriores

Atualização:

Os Estados Unidos e o Brasil estão no processo de definição de uma nova parceria. Antes da presidência de Biden, Bolsonaro sempre podia confiar no indisfarçável rastro de Trump e seguir seus sinais. Foi o que ele fez em relação à resposta à pandemia, acreditando até o fim que a simples hidroxicloroquina resolveria o problema. Mas não resolveu.

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Em seguida, ele fracassou em obter medicamentos de eficácia comprovada, principalmente como resposta aos esforços de Doria, bem como de outros governadores, no sentido de encontrar uma solução para o problema. Ele também recusou a oportunidade de comprar alternativas como a vacina da Pfizer, usada com grande sucesso nos EUA e em outros países, bem como outras alternativas da China. Com isso, um sistema de saúde funcional entrou em colapso sob a pressão da pandemia, e o Brasil já perdeu 500 mil vidas, e possivelmente muitas mais. É triste ver que o número de mortos no país se aproxima daquele registrado nos EUA.

Mas, agora, após uma eleição contra Joe Biden que Donald Trump buscou continuamente anular, permitindo a continuidade do seu governo, esse mundo certamente mudou. O Brasil não avançou muito no ajuste que precisa fazer. O ex-chanceler Ernesto Araújo foi obrigado a deixar o cargo, mas pouco mudou além disso. A desistência do Brasil em respeitar seu compromisso anterior de limitar o desmatamento da Amazônia continua. A aparente disposição de Bolsonaro de controlar a situação, manifestada no encontro internacional de Biden em abril, foi seguida por decisões orçamentárias que limitam os gastos do governo nessa área. E o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, é investigado por seu envolvimento na exportação ilegal de madeira ilegal da região. 

Antes da presidência de Biden, Bolsonaro sempre podia confiar no indisfarçável rastro de Trump e seguir seus sinais. Foto: EFE

Agora entra em cena outra questão: a disponibilidade de vacinas de alta qualidade vindas dos EUA para combater o coronavírus. Dias atrás, o secretário de Estado Antony Blinken telefonou para o chanceler Carlos França. Além de parabenizar o Brasil pela eleição para um novo mandato no Conselho de Segurança da ONU, dois outros assuntos foram debatidos.

A reunião marcada para Glasgow em novembro para debater o Tratado do Clima esteve na pauta, e se espera uma participação brasileira muito mais ativa. Também se falou de uma grande remessa de vacinas americanas. As doações que chegarão via OMS são insuficientes para causar um impacto. De alguma forma, as questões internacionais estão começando a retornar a fontes mais tradicionais dentro do Itamaraty e de alguns outros ministérios, onde um público interno mais sofisticado reconhece a necessidade de corrigir o rumo equivocado seguido até o momento por Bolsonaro.

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As questões econômicas entram em jogo conforme ambos os países buscam repensar estratégias anteriores. Brasil e EUA são entidades federais onde Estados e cidades desempenham um grande papel. No caso dos EUA, a busca agora é por uma maior responsabilidade federal na administração. É uma imitação da era Roosevelt, na época da Grande Depressão dos anos 1930, ou da construção do sistema de rodovias promovida por Eisenhower.

Por outro lado, os impostos caíram muito durante o governo Trump, e o déficit federal aumentou significativamente com o impacto da pandemia em 2020. No Brasil, em contraste, o governo total parece estar em contínua expansão, mas com uma burocracia ineficiente. Parece haver uma incapacidade de limitar os subsídios e de assumir responsabilidades adicionais de maneira eficaz. Os déficits ocorrem com regularidade no nível estadual, e o governo central precisou de repetidos mecanismos de controle para evitar uma inflação interna excessiva decorrente dos gastos fiscais. 

A política em ambos os países é um determinante definitivo. Mas a divergência nas escolhas é considerável. Nos EUA, apenas dois partidos conseguiram sobreviver. No Brasil, o número de partidos políticos é talvez o maior do mundo. A diversidade individual e de interesses é grande, e a ascensão depende em muitos casos da origem familiar. É difícil alcançar uma reforma eleitoral. Novas leis limitaram a possibilidade de medidas legais contra os eleitos. Novas regras eleitorais buscam limitar votos negativos. O Brasil merece mais. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL  *ECONOMISTA E CIENTISTA POLÍTICO, PROFESSOR EMÉRITO NAS UNIVERSIDADES DE COLUMBIA E DA CALIFÓRNIA EM BERKELEY

Opinião por Albert Fishlow
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