16 de setembro de 2021 | 19h43
Atualizado 17 de setembro de 2021 | 09h56
BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro decidiu aumentar a alíquota de IOF sobre operações de crédito para empresas e pessoas físicas, o que na prática encarece os empréstimos, entre 20 de setembro a 31 de dezembro de 2021. O primeiro comunicado do governo não informava quanto aumentaria o imposto. Duas horas depois, o Ministério da Economia, no entanto, confirmou, depois, as novas alíquotas diárias que serão cobradas:
O comunicado do governo afirma que a arrecadação adicional, calculada em R$ 2,14 bilhões, ajudará a bancar a ampliação do Bolsa Família, rebatizada de Auxílio Brasil. A receita obtida com o aumento do IOF servirá neste ano como compensação para o aumento de R$ 1,62 bilhão previsto para este ano com o novo programa. Oficialmente, não houve anúncio de quanto passará a ser o valor médio do benefício, mas o presidente Jair Bolsonaro já prometeu R$ 300 (hoje, é de R$ 190).
A versão turbinada do programa tem que entrar em vigor ainda este ano -- provavelmente em novembro, com o fim do auxílio emergencial -- por causa das restrições impostas pela lei eleitoral. Com queda de popularidade, Bolsonaro vai tentar a reeleição no ano que vem.
A compensação é uma exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A regra prevê que uma medida de aumento permanente de despesa (como a ampliação do novo Bolsa Família) precisa vir acompanhada de uma fonte de custeio, isto é, uma receita capaz de financiar o gasto.
“A referida medida irá gerar um aumento de arrecadação estimado em R$ 2,14 bilhões. Esse valor permitirá a ampliação do valor destinado ao programa social Auxílio Brasil, cujo novo valor entrará em vigor ainda no ano de 2021. A medida irá beneficiar diretamente cerca de 17 milhões de famílias e é destinada a mitigar parte dos efeitos econômicos danosos causados pela pandemia”, diz o comunicado. Hoje, o Bolsa Família atende a 14 milhões de famílias.
Para 2022, o governo conta com medidas da reforma do Imposto de Renda (IR) para compensar o aumento de despesas do ano que vem em diante. A proposta já foi aprovada pela Câmara dos Deputados, mas ainda não foi votada pelo Senado. Há ainda outro problema para 2022: a ausência de espaço no teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação. Para abrir caminho ao Auxílio Brasil, o governo precisa resolver o impasse do "meteoro" de R$ 89,1 bilhões em dívidas judiciais (precatórios), uma vez que essas despesas hoje ocupam a folga que estava reservada à ampliação do programa social.
Segundo o governo, a alteração do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) também permitirá o aumento da cota de importação de bens destinados à ciência e tecnologia. Essa medida, de acordo com a Secretaria-Geral, viabilizará a continuidade de diversas pesquisas científicas e tecnológicas em curso no País.
“A medida viabilizará, em especial, os projetos de pesquisa, desenvolvimento e produção de vacinas para coronavírus em andamento na Fiocruz e no instituto Butantã, os quais, hoje, são os maiores beneficiários deste regime fiscal”, afirma a nota.
O aumento do IOF também permitirá zerar a alíquota de PIS/Cofins que incide hoje sobre a importação de milho. O governo espera que isso tenha “efeitos positivos sobre o custo da alimentação”. O milho é um insumo importante na cadeia de produção de alimento, servindo como ração para animais e também na produção de outros itens da indústria. A inflação de alimentos, por sua vez, está pressionada e contribui para levar o IPCA à alta de 9,68% registrada em 12 meses até agosto.
Por se tratar de decreto, as mudanças do IOF entram em vigor de imediato e não dependem de aprovação do Congresso Nacional. Já o efetivo aumento do Auxílio Brasil dependerá de medida legislativa própria. A alteração da cota de importação dos bens de ciência e tecnologia e na alíquota sobre a importação do milho serão implementadas diretamente pelos órgãos do Ministério da Economia.
O IOF é um dos mais abrangentes impostos federais. Previsto na Constituição, o IOF contempla sob um mesmo guarda-chuva impostos relacionados a áreas como câmbio, crédito e seguros, por exemplo.
O imposto incide também sobre as operações de títulos e valores imobiliários, sendo que ele apenas pode ser cobrado no caso de transação entre duas empresas ou entre uma empresa e uma pessoa física. Caso contrário, não é necessário que a alíquota seja recolhida.
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16 de setembro de 2021 | 22h21
Num cenário de alta de juros e encarecimento do crédito, o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para bancar o novo Bolsa Família (nos últimos meses do ano), não é bom sinal.
Os financiamentos para empresas e pessoas físicas, que já estavam pressionados com a subida da taxa básica de juros, a Selic, pelo Banco Central, vão ficar mais caros entre 20 de setembro e 31 de dezembro deste ano num momento de esfriamento da atividade econômica e com endividamento recorde da população.
Do lado fiscal, porém, a decisão de aumentar o imposto representa um forte indício de que a equipe econômica conseguiu barrar a pressão pela renovação do auxílio emergencial por meio de crédito extraordinário para o combate do impacto da pandemia da covid-19.
Os técnicos da área econômica avaliavam que o uso de crédito extraordinário, usado para casos de imprevisibilidade e urgência e que ficam fora do limite do teto de gastos, não poderia ser mais justificado a essa altura da pandemia e com as vacinações em curso.
Outro ponto importante é que a medida foi um sinal de que haverá compensação para o novo programa em 2021 e também em 2022, sem burla da regra da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que exige uma medida de aumento permanente de despesa (como a ampliação do novo Bolsa Família) precisa estar acompanhada de uma fonte de custeio desse novo gasto.
Essa exigência é um dos mais importantes regramentos da política fiscal brasileira e volta e meia há movimentação política ou para acabar com ela ou driblá-la.
O governo deve agora enfrentar o questionamento sobre o uso do IOF, um tributo que tem função regulatória. Tributaristas questionam o seu uso para aumentar a arrecadação. É justamente por ter essa função regulatória que a legislação abre uma exceção e diz que ele pode ser aumentado sem aprovação de uma lei.
Essa é a segunda alta de imposto para bancar medidas de interesse do presidente Jair Bolsonaro, que tenta a reeleição no ano que vem. O governo já tinha aumentado temporariamente a tributação dos bancos para custear a desoneração do diesel.
Ao anunciar o aumento do imposto, o Palácio do Planalto afirmou que vai permitir a ampliação do novo programa. Mas a solução para o seu Orçamento em 2022 – de R$ 60 bilhões – está longe de estar resolvida com a indefinição para o pagamento da fatura de R$ 89,1 bilhões com precatórios.
*É REPÓRTER ESPECIAL DE ECONOMIA EM BRASÍLIA
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